Legolas tomou a
dianteira, liderando o agora numeroso grupo até o subterrâneo. Atravessaram as
catacumbas até chegarem ao corredor onde tinham travado o combate conta Flint. No
caminho, foram abrindo todas as portas que encontraram. Eram oito salas ao
longo do corredor, todas pequenas de não mais que nove metros quadrados,
algumas cheias de entulho, outras recheadas de tesouros que os heróis deixaram
para recolher mais tarde, pois havia inimigos por perto que deveriam enfrentar.
Na primeira das portas uma armadilha mágica quase congelou o corpo de Orion com
um sopro frio e todos suspeitavam que mais armadilhas os aguardavam nas demais
saletas, mas havia algo mais urgente a resolver. Anix encontrara o inimigo e o
atraia para uma armadilha. A poucos metros do pelotão, o golem que os ameaçara
na noite anterior perseguia o mago a passos vagarosos e pesados.
Legolas reagiu
rapidamente e usou seus poderes para congelar o chão do corredor. Anix reforçou
a armadilha jogando óleo sobre o gelo e, temendo que os vampiros também
pudessem estar por perto, pediu a Nailo que usasse suas espadas para iluminar o
ambiente como a luz do sol. Das mãos do gigante rochoso emanava uma aura negra
de morte que deixava todos apreensivos. Anix engoliu em seco, seria um combate
difícil. Golens eram conhecidos por serem seres animados por magia extremamente
resistentes a danos físicos e invulneráveis à maioria das magias. Se não
tomassem muito cuidado, teriam sérios problemas. Mas sua tensão se desfez ao
ver que seus amigos recém-chegados pareciam ter um plano.
_ Soldados! Formação de ataque! – gritou Yczar com
autoridade. Os cavaleiros ajuntaram-se à frente do grupo, espadas e escudos
preparados, formando um grande quadrado. Bateram as espadas nos escudos em uníssono
e deram um brado de guerra que quase estremeceu a câmara.
_ Ah hu! – gritaram os guerreiros. E começaram a
avançar na direção do inimigo.
Ainda assim, mesmo após
ver aquela demonstração de confiança por parte daqueles combatentes ainda
inexperientes (comparado ao seu grupo, claro), Anix temia. Foi quando outra
surpresa o deixou totalmente tranquilo.
_ Um golem de pedra?! Interessante! – sorriu Guiltespin,
cofiando a barba. – Sorte nossa eu ser
especialista em magias de terra. Vou dar um jeito nesse bicho!
E o anão avançou,
passando à frente dos soldados e parando diante do enorme oponente. Moveu seus
dedos com graça e leveza surpreendentes para alguém de sua raça, murmurou palavras
mágicas em plena concentração e estendeu a mão direita para frente, apontando-a
para o golem. Um raio amarronzado surgiu em sua palma e foi de encontro ao
corpo de pedra da criatura. O corpanzil de pedra pareceu perder a forma, como
se se dissolvesse e escorresse. A criatura tornou-se lenta e desajeitada e seus
pés, agora lamacentos, escorregaram sobre a placa de gelo e o golem foi ao chão.
Rapidamente os
soldados cercaram o inimigo tombado, atacando-o pelos flancos com suas espadas.
Orion passou sobre todos com Galanodel e saltou sobre o peito da criatura,
cravando Soul Eater em seu ventre amolecido. A espada gritava de alegria por
novamente estar tirando vidas. Legolas, Nailo, Squall, Yczar, Batloc, Mex e
todos os outros avançaram e começaram a atacar com tudo que tinham.
_ Ele está lento e sua carapaça não é mais tão rígida. Agora
vou desfazer suas proteções de vez – E novamente Guiltespin usou sua mágica no inimigo.
O corpo da criatura assumiu um aspecto grotesco, uma mistura de lama e pele,
como se fosse feito de carne e osso. – Agora
ele está desprotegido, mesmo a magia pode feri-lo – gritou o anão, por fim.
Todos atacaram em
massa. O pesado corpo da criatura foi perfurado, cortado, queimado e congelado
inúmeras vezes. Anix voou por cima do inimigo com sua vassoura e desferiu o
ataque final. Seu olho maligno se abriu num brilho negro e disparou um raio de
sombras. O golem se desfez no ar, totalmente desintegrado, e nada restou dele.
Gritos ecoaram pelas catacumbas, os soldados comemoravam sua primeira vitória
naquele lugar maligno.
Guiltespin, Batloc e
Yczar ainda estavam impressionados com as capacidades de seus antigos amigos. Agora
Squall era um dragão, Legolas controlava o frio, Anix tinha um terceiro olho do
qual brotavam poderes assombrosos. Yczar não deixava de se espantar e se
preocupar ao mesmo tempo, pois sabia que o poder era capaz de corromper e que
os poderes de seus amigos não pareciam ser benignos.
Anix reuniu os clérigos
do grupo, Lucano, Kátia e Toran, o jovem cavaleiro que viera com Yczar. Juntos
vasculharam o corredor em busca dos vampiros, mas não encontraram sinal algum
dos inimigos. Com tudo aparentemente calmo, o grupo decidiu explorar as salas
por onde tinham passado, na esperança de nelas encontrarem pistas ou tesouros
que os ajudassem a vencer Gulthias e seus asseclas.
_ Pessoal, é perda de tempo ficarmos todos aqui – disse Nailo. O
ranger parecia impaciente. – Enquanto vocês
ficam aqui, eu vou voltar na direção do fosso e explorar o lado sul do
complexo. Não esqueçam das palavras de Flint, “sem as quatro chaves o coração não
se abrirá”. Não sei o que ele quis dizer ainda, mas sei que precisaremos destas
tais chaves para vencer nossos inimigos. Encontrá-las deve ser nossa prioridade
agora. Irei com Lucano, Luskan, Kátia, Rafael e Carion, assim, divididos em
dois grupos, pouparemos tempo. E se encontrar algo perigoso, virei buscar vocês
– e sem dar chance para questionamentos, Nailo se virou e partiu com seus
acompanhantes.
Compreendendo as
intenções de Nailo, os demais se apressaram na busca pelas tais chaves. Não
sabiam como seriam estas chaves, mas tinham certeza de que as reconheceriam
quando as vissem, afinal era certo que Flint as teria escondido em algum lugar
cercado de armadilhas, o que as identificaria.
Na primeira das
saletas havia apenas entulho e alguns poucos tesouros abandonados. Orion recolheu
e guardou em sua mochila o que encontrou: um colar de ouro, uma pulseira também
de ouro e uma única luva de couro, inexplicavelmente conservado em meio àquela
sujeira toda, na certa havia magia envolvendo-a.
Legolas invadia a
sala seguinte enquanto Orion recolhia os primeiros espólios. Ao mesmo tempo, os
cavaleiros montavam guarda nos extremos do corredor à espera de qualquer
ameaça. Anix ia mais à frente, abrindo uma porta no final do corredor, após
este virar para a direita. A porta aberta pelo mago se abria para um imenso
abismo.
O arqueiro entrou na
saleta e foi atingido por uma explosão. Uma esfera gélida explodiu sobre seu
corpo, espalhando um frio cortante por todo o cômodo. Legolas apenas sorriu,
seu treinamento com Glorin mostrava seus efeitos. Para ele aquilo não passava
de uma brisa refrescante, enquanto que para outros aquilo poderia ter
representado a morte. Perdida no chão, rodeada e semi-soterrada por escombros, havia
uma bela aljava de couro negro, adornada com fios dourados que formavam belos mosaicos
em suas bordas. Dentro da aljava havia dez flechas feitas de pura prata. Sem
hesitar, o elfo abandonou sua antiga aljava, colocando suas flechas na recente
aquisição. A flechas de prata, sabia ele, seriam muito úteis contra as
criaturas que ainda enfrentariam. Mas Legolas nem teve tempo de avaliar seu prêmio
detalhadamente, pois os gritos de alerta dos soldados chamaram-no à ação.
Anix olhara dentro do
abismo, usando seu olho amaldiçoado, e vira um obelisco de rocha no meio dele,
sobre o qual havia um baú. O mago montou em sua vassoura e voou rumo à arca,
mas foi detido no meio do caminho. Uma criatura de forma vagamente humanoide,
composta apenas de sombras e escuridão, surgiu diante de Anix. O que parecia
ser o membro superior daquela sombra projetou-se contra o peito do mago,
penetrando-o. Anix sentiu seu sangue gelar e o coração parar por um instante. Todos
os seus movimentos cessaram, e mesmo respirar tornara-se uma tarefa árdua para
ele. Lentamente Anix começou a cair rumo à escuridão, já que a vassoura mágica
agora estava desgovernada. Anix estava completamente paralisado.
Vendo o perigo, os
soldados que davam cobertura ao mago soaram o alerta, chamando a todos. O
socorro chegou veloz como um raio. Legolas, carregado por Mexkialroy,
atravessou a porta disparando suas flechas prateadas contra o vulto. As setas
desapareceram no corpo de trevas do inimigo, fazendo-o se contorcer como se
sentisse os ferimentos.
Orion chegou logo em
seguida, em pé nas costas de Galanodel, e golpeou o monstro com Soul Eater. Parte
da sombra se desfez no ar, enquanto o resto da criatura despencava rumo ao
fundo do abismo. A criatura, no entanto, recuperou-se rápido do ataque e voltou
em velocidade espantosa para junto dos combatentes. Legolas e Orion conseguiram
atingi-la novamente e o poder da espada negra outra vez fez com que o inimigo
fosse lançado para longe.
Vendo que não teria
chance no combate corpo a corpo, o vulto apelou para a mágica. Seus braços se
moveram em circulo, criando uma nuvem cinzenta e fétida que cercou a todos. Elfos,
humano, dragão e coruja tossiram e convulsionaram aos respirar os gases
venenosos e profanos da sombra. Orion e Legolas continuaram a atacar o inimigo
incessantemente, fazendo-o perder pedaços de seu corpo como se os heróis
rasgassem um pedaço de tecido negro. Por fim, Mexkialroy, já irritado com
aquele ser, cuspiu um relâmpago certeiro, enviando o monstro de volta a seu
plano de origem.
Orion e Legolas foram
ao auxílio de Anix que, momentos depois da morte do inimigo, recobrou os
movimentos e voou rumo ao pedestal no centro da imensa caverna. O elfo recolheu
o baú e o abriu. Dentro dele havia uma máscara de marfim, esculpida na forma de
um crânio humano e também uma peça de metal dourado, achatada como uma lâmina,
mas sem corte, e de formato sinuoso e cheio de recortes que lembravam vagamente
a forma de uma asa de dragão. Anix viu que a máscara era mágica e rapidamente a
colocou em seu rosto. Já o outro objeto não possuía poder algum, mas Anix o
guardou mesmo assim e retornou para junto de seus amigos.
_ Anix, o que é isto em seu rosto? – perguntou Orion.
_ Uma nova arma contra nossos inimigos – respondeu o mago com
um sorriso cheio de sarcasmo.
_ Anix, livre-se disto – pediu Yczar. – Sinto uma aura maligna nesta máscara. Aliás,
em toda esta caverna.
_ Tudo e todos neste lugar são maus! – respondeu o mago,
secamente, seguido de uma gargalhada. Yczar ficou espantado e preocupado e usou
seu dom de paladino para sentir o coração de Anix. Não havia maldade no elfo,
mas algo sombrio se apossava dele pouco a pouco. Seria o beholder, ou seria a
influência da torre vencendo a bondade que Anix esbanjara no passado? Yczar
temia ambas as respostas.
_ Eu consegui ver
o fundo do abismo quando fui buscar o baú. Está cheio de criaturas, parece um
exército de zumbis. Se tínhamos dúvidas de que Zulil está por aqui, agora não
temos mais – disse
Anix. - Ah! Encontrei outra coisa no baú,
parece ser inútil, não parece ser uma jóia de valor, mas guardei assim mesmo,
talvez seja uma das chaves que o halfling mencionou.
Anix mostrou o objeto
aos companheiros e todos concordaram que deveria ser guardado. Guiltespin analisava
a peça enquanto conversava com Anix. Depois examinou a máscara e descreveu para
o mago sua função. Segundo ele, o objeto atacava sob o comando de seu usuário,
voando até o alvo e tirando-lhe a vida. Anix sorriu ao ouvir isso, deixando o
paladino ainda mais preocupado. Uma nova discussão ia começar, quando os dois
foram interrompidos.
_ Deixem de conversa fiada! Temos um exército para
exterminar
– ralhou Mexkialroy. – Parem de ficar ai
falando e vamos agir – o dragão azul lançou-se na caverna e voou abismo
abaixo. Orion seguiu-o com Galanodel e Squall foi em seguida, com Legolas em
suas costas.
Do alto, Guiltespin,
Yczar e Batloc observavam o combate. Fogo, gelo e relâmpagos iluminavam o fundo
da caverna, enquanto uma horda de mais de uma centena de zumbis era dizimada. Um
ano atrás o grupo todo sofrera uma noite inteira para apenas resistir a uma hoste
igual àquela. Agora, apenas quatro deles eram suficientes para dar cabo de
todas aquelas criaturas com facilidade. Pasmo, o anão se virou para o paladino.
_ É, Yczar! Parece que nossos amigos ficaram mais fortes
que nós
– comentou Guiltespin.
Um pouco mais
afastado da porta, ainda meio maravilhado com sua máscara, Anix sorriu,
presunçoso.
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