agosto 03, 2009

Capítulo 356 – A aparição do inimigo

Os heróis prosseguiram em sua jornada, explorando cada porta ainda por abrir. Atrás de cada uma delas encontravam armadilhas preparadas pelos seguidores de Zulil e do misterioso Gulthias. Eram dardos venenosos disparados contra seus corpos, espadas e machados afiados que despencavam sobre suas cabeças, tentando arranca-las de seus corpos. Legolas usava os animais de sua pequena bolsa mágica para abrirem as portas e acionarem as armadilhas que eles não conseguiam detectar. Mesmo que viessem a morrer, os animais mágicos apenas retornariam para a bolsa, onde aguardariam até serem convocados novamente. Enquanto investigavam as salas restantes, Anix resmungava, maldizendo o tempo que perdiam ali e desejoso por explorar logo os andares inferiores da torre. Foi somente Nailo quem conseguiu conter a ansiedade do mago que já iniciava uma discussão acalorada com os companheiros.

_ Temos que continuar olhando estas salas, até que não reste lugar inexplorado neste andar. Não podemos nos arriscar a deixar inimigos atrás de nós e, além disso, pode ser que encontremos alguma pista ou recurso que nos ajude a derrotar nossos inimigos mais facilmente – disse Nailo.

Em meio às armadilhas, tal qual Nailo dissera, os aventureiros encontraram alguns pequenos tesouros. Uma espada belamente ornada com jóias foi encontrada sob os escombros de uma das salas, enquanto que uma adaga mágica foi achada em outro cômodo abandonado. Inscrições rúnicas no metal prateado revelaram, com a ajuda da magia de Squall, o poder da adaga. Perfuradora Pálida era seu nome e, como constatou o feiticeiro, a arma poderia ser a ruína dos fantasmas que espreitavam na torre.

_ Ótimo achado! – comemorou o dragão azul. – Ficarei com esta adaga eu mesmo.

_ De jeito nenhum – retrucou Nailo. – Eu guardarei a adaga, para usarmos quando for necessário. Com que direito você exige a posse desta arma, dragão?

_ Ora, elfo. Estou vos ajudando nesta missão e portanto espero ser recompensado por isto. Exijo minha parte nos espólios que encontrarmos aqui nesse mausoléu, e esta adaga me parece um bom começo – redargüiu Mexkialroy.

_ Bem, dividiremos tesouros mais tarde, Mex. Agora temos coisas mais importantes para nos preocupar. Por hora guardarei a adaga comigo, em minha mochila mágica. Aqui ela não pesará e posso pegá-la facilmente quando necessário. Estará segura comigo e assim você poderá usar todos os seus membros para lutar e se mover, ao invés de carregar coisas – disse Nailo.

_ Está certo. Guarde-a por hora então, elfo!

A solução de Nailo serviu para contentar o dragão por algum tempo. O grupo continuou vagando, desta vez pelo corredor onde haviam enfrentado o golem de pedra. Enquanto caminhavam, Legolas iniciou nova conversa com o dragão.

_ Mex, você consegue se transformar em humano, ou em elfo? – perguntou o arqueiro.

_ E por que eu faria tal coisa, elfo? Por que assumiria uma forma inferior? – resmungou Mexkialroy.

_ Há! Pelo visto você não consegue, não é mesmo? Só perguntei por curiosidade mesmo. Ouvi dizer que Belugha e Schar possuem este poder e gostaria de saber se isso era comum na sua raça, mas parece que não – zombou o elfo.

Mexkialroy fez menção de responder às provocações do arqueiro, mas se deteve ao ouvir um estranho ruído. Um pio de coruja ecoava pelos corredores vindo do fosso de entrada, chamando a atenção de todos.

_ Galanodel! – gritou Orion, espantado. O humano correu avidamente em direção à fonte do som, seguido prontamente pelos companheiros. Em segundos estavam sob a entrada, onde a coruja gigante os aguardava.

_ O que aconteceu? – perguntou Orion.

_ Vim avisá-los! O sol se pôs! A noite chegou! – respondeu a ave.

Era a hora mágica para os seres da noite. Vampiros e lobisomens poderiam andar livremente pelo mundo, espalhando terror e chacina. O aviso era mais que bem vindo, pois a partir daquele instante, os heróis deveriam ser mais cautelosos. No entanto, Nailo desconfiou das intenções da coruja e, temendo estar diante de uma ilusão ou de uma mente dominada, fez uma série de perguntas para testar as intenções da coruja. Por fim, satisfeito com as respostas, Nailo subiu para o topo da torre, onde constatou com seus próprios olhos a chegada do crepúsculo.

_ Vamos continuar, mas com mais cautela – disse ele. – O tempo agora está a favor de nossos inimigos.

A exploração prosseguiu cada vez mais rápida à medida que a quantidade de armadilhas diminuía. As salas restantes, todas ocupadas apenas por escombros, pareciam abandonadas pelos ocupantes da torre fosse para uso como cômodo, fosse para abrigar armadilhas mortais. Depois de algum tempo, restava apenas uma porta no corredor onde os heróis tinham enfrentado o terrível golem. A barreira era feita de pedra, tal qual as outras, e também ostentava o símbolo dracônico entalhado sob sua aldrava. Parecia úmida e mais fria que as demais partes da construção, era como se uma aura sombria emanasse de sua estrutura.

_ Vamos logo, esta é a última sala deste andar. Vamos ver o que há atrás dela logo de uma vez – disse Orion, impaciente. Suas mãos são empurravam a porta de pedra quando foi detido por Anix.

_ Espere, Orion! – rugiu o mago. – A mente deve ser mais rápida que as mãos. Esta porta está estranha. Nailo, dê uma checada, por favor!

O ranger olhou ao redor da porta atentamente. Ao contrário do que esperava Anix, não localizou qualquer armadilha. Mas a estranha umidade que tomava conta da rocha denunciava a existência de algum perigo. Após a análise cuidadosa de Nailo, Orion pode finalmente abrir a porta. A sala além dela ficava na borda da torre, por isso a parede diante do humano tinha formato curvo. Era estreita, não mais que metro e meio de largura, mas se estendia por toda a torre em seu comprimento. Dentro não havia móveis ou sequer escombros. Apenas um líquido negro e viscoso borbulhava de forma intrigante por todo o chão.

Sob protestos dos companheiros, Orion decidiu entrar na sala e investigá-la. Foi surpreendido ao descobrir que de alguma forma estranha o líquido estava vivo. A gosma negra subia pelas pernas do humano, tornando seu andar difícil. Orion também sentia dor, como se a gosma fosse ácida, mas, como sua armadura e roupas permaneciam intactas, descartou essa hipótese. O líquido feria seu corpo, mas de alguma forma que ele não compreendia. Com muito esforço, o guerreiro abandonou o cômodo já quase sem fôlego e vida.

Lucano curou o corpo de Orion com sua magia, enquanto seus amigos faziam testes com o líquido. A gosma, quando retirada de seu recinto, murchava e secava até se esfarelar e desaparecer por completo. Se tocada por uma espada ou outro objeto, o agarrava e puxava, tentando envolvê-lo como fizera com Orion.

_ Acho que sei o que é esta coisa. É algum tipo de líquido necromântico. Suas características lembram as dos mortos-vivos. Vou tentar destruí-la com o poder de Glórienn – disse Lucano. O clérigo se postou diante da entrada com seu medalhão sagrado erguido. Evocou o nome de sua deusa por duas vezes e viu o líquido recuar e se agitar até se transformar em pó e desaparecer no ar.

_ Ótimo! Agora podemos dormir aqui – disse Nailo. – Vamos fazer uma barricada nesta sala e descansar aqui.

_ Não acho uma boa idéia, Nailo – discordou Lucano. – Pode ser que aquela gosma se refaça, e não quero estar perto daqui se isso acontecer.

_ Lucano tem razão – replicou Anix. – De qualquer forma não é bom permanecermos aqui enquanto dormirmos. Podemos ser atacados durante o sono. É melhor voltarmos para a caverna encontrada por Mex.

_ Nada disso. Se fizermos isso, os vampiros voltarão a ocupar este andar e teremos que refazer todo o trabalho que já fizemos – redargüiu Nailo. - Devemos ocupar este local e impedir que os nossos inimigos o façam, ou então jamais chegaremos ao final desta torre infernal.

Uma acalorada discussão teve início neste momento, para decidirem qual seria a melhor forma de descansarem seus corpos e recuperarem suas energias sem ficarem à mercê dos inimigos. Ao final do debate, o grupo estava dividido. Anix deixou a torre, dizendo que dormiria na caverna, enquanto Nailo se deitou dentro de uma pequena sala no corredor central para dormir. Os demais trataram de se ajeitar pelos como puderam, revezando-se em turnos de guarda para vigiar as ações dos inimigos e de seus companheiros.

_ Não precisam se preocupar – disse Nailo. – Podem dormir sossegados. Daqui até aquela marca na parede eu coloquei uma magia. Qualquer um que entrar nesta área disparará um alarme e eu acordarei todos. Não há como não notarmos a chegada dos inimigos.

Os heróis decidiram confiar no amigo e prepararam-se para dormir. Lucano conversou mentalmente com Dililiümi, para evitar iniciar uma nova disputa entre seus amigos, e pediu à espada mágica que vigiasse por eles. Fincou a arma no chão próximo a ele e se deitou. Protegido pela magia de Nailo, Orion decidiu dormir perto da escada, onde poderia apanhar rapidamente qualquer inimigo que surgisse. Squall e Mexkialroy ficaram perambulando pelos corredores, dentro da área protegida pela mágica de Nailo, enquanto Legolas, antes de ir dormir, foi para o topo da torre afim de saber como estava Anix.

No lugar do mago, e de uma farta porção do tesouro reunido no alto do pináculo, encontrou apenas um bilhete no qual Anix dizia: Fui para Malpetrim, volto logo.

Malpetrim, o local onde a jornada se iniciara, onde meros viajantes tornaram-se grandes amigos e onde o traidor Zulil havia sido visto pela primeira vez. Legolas se lembrou de todos os amigos que não estavam ali com ele naquele momento, especialmente um que deveria estar ao menos próximo: Sairf. Sentado no que restara da pilha de tesouro, Legolas pôs-se a escrever uma carta.

“Sairf

Amigo, estamos em Galrasia. Sim, a ilha. Espero que você esteja bem ai com sua sereia, pois aqui não está nada bem. Nós nos casamos todos, Eu com Liodriel, Anix com Enola e Nailo com Darin, mas falhamos como maridos. Você deve se lembrar de Zulil, aquele elfo que conhecemos em Malpetrim, que andava com um outro elfo e um halfling. Pois é, ele é um servo de Tenebra. O desgraçado nos enganou, traiu e matou todas as nossas esposas e nosso bom amigo Sam.

Agora estamos numa torre em Galrasia, caçando o desgraçado para vingar a morte de nossas mulheres e amigo. E não sei porque diabos lembrei de você e tive medo que de você também pudesse estar passando por alguma dificuldade, assim como nós.

Escreva-me contando se você está bem.

Seu parceiro,

Legolas Greenleaf – the ice heart

Mal sabia ele que suas suspeitas e temores não eram sem motivo, pois, Sairf também vivia sua aventura e enfrentava perigos terríveis. O arqueiro enrolou a carta e a colocou dentro de um pequeno frasco de poção vazio, assegurando-se de tapá-la bem. Arrancou de seu pescoço o medalhão de madeira que ganhara do povo de Cold Valley e assisti-o transformar-se em um belo pássaro. Entregou a garrafa com a mensagem à ave e sussurrou em seu ouvido mágico a quem a carta deveria ser entregue. Como que guiado por feitiçaria, o pássaro alçou vôo e foi em busca do destinatário da mensagem: Sarif. Certo de que em breve seu amigo receberia a carta, Legolas foi dormir.

O alarme mágico disparou na mente de Nailo, emitindo um aviso estridente que somente ele era capaz de ouvir. O Guardião levantou de armas em punho e alertou seus amigos. Alguém subia as escadas e vinha em direção a eles. Todos correram para o corredor onde os restos mortais do golem de pedra ainda permaneciam empilhados. Da sala da escada uma horda de zumbis surgia cambaleante.

Já transformado em dragão, Squall despejou seu hálito de fogo nos inimigos. Seu medo antigo medo tornava-se menos importante quando tinha aquela aparência. Os corpos mortos foram tomados pelas chamas e transformados em cinzas. A batalha parecia ganha. Mas, um novo inimigo surgiu. Parecia também um zumbi, mas seu corpo era visivelmente constituído por partes dos corpos de outras criaturas. Era também um golem, uma criatura anti-natural, desta vez, porém, feito de carne. Todos o atacaram furiosamente até fazer o inimigo sobrenatural tombar. Apenas Orion fora ferido e superficialmente. Entretanto, durante o tempo perdido na luta contra o golem, os heróis não puderam evitar a chegada de novos inimigos. Um enorme ser de aparência bestial, que se assemelhava a um gorila de quatro braços invadiu o corredor. A criatura avançou ameaçadoramente contra Squall, soltando rugidos apavorantes que faziam estremecer as paredes. Mesmo em forma de dragão, o feiticeiro chegou a temer o ataque da criatura. Mas, subitamente, o monstro se deteve.

_ Mestre! Mestre! – repetia o gorila, enquanto encarava a marca na testa de Squall, a mesma marca que decorava as portas da torre. Finalmente o Vermelho percebeu que poderia tirar vantagem daquele símbolo.

Mas, antes que o discípulo de dragão pudesse se aproveitar da situação, foi surpreendido pela chegada de outro adversário.

_ Malditos profanadores! Destruíram remendos! Hão de pagar com suas vidas! Seu girallon imprestável, trate de destruí-los enquanto eu aviso ao mestre Gulthias! – sibilou o vampiro que acabara de surgir na escada ao ver o amontoado de pedras que fora o golem. O morto-vivo desapareceu na escadaria tão rápido quanto surgiu, retornando para o andar inferior.

_ Depressa! Vamos segui-lo! – gritou Orion.

_ Você, servo! Pegue aquele vampiro – ordenou Squall ao gorila.

_ Mestre? – hesitou o símio.

_ Sim, eu sou seu mestre agora. Agarre aquele monstro pra mim e será bem recompensado! – continuou o Vermelho.

_ Mestre bonzinho? Mestre não machucar nós? – insistiu o macaco.

_ Sim, mestre não vai machucar você se você ajudar mestre! – respondeu Squall. O gorila assentiu com a cabeça, satisfeito, e lançou-se escada abaixo em velocidade surpreendente. Os heróis o seguiram logo depois.

No andar inferior, chegaram a uma pequena câmara que terminava em um corredor que se abria à direta e à esquerda, no qual havia uma porta em cada extremidade. No final da escada puderam ver o vampiro abaixado, como se fizesse reverência a alguém. O gorila saltou sobre o vampiro para agarrá-lo, mas, antes que pudesse alcançar seu alvo, uma voz se fez presente na sala.

_ Estúpido, eles o seguiram! – bradou a voz misteriosa. – Destrua todos eles. E quanto a este símio traidor, eu mesmo me encarrego dele.

Um clarão tomou conta do piso inferior, seguido do grito de agonia do girallon. Quando os heróis finalmente chegaram ao fim da escada, a criatura jazia morta no chão.

_ Livre-se deles, Ou irá se ver comigo, lacaio imprestável! E não se deixe enganar pelos truques dos profanadores, não há herdeiro algum entre eles! – foram as últimas palavras da voz que tinham ouvido enquanto desciam. Olharam para debaixo da escada e viram um vulto sombrio emoldurado em mantos escuros e aveludados desaparecendo magicamente no ar. Imediatamente todos tiveram a intuição de que aquele misterioso ser era o tão falado Gulthias.

O vampiro ergueu-se do chão após a partida de seu mestre. Seus olhos brilharam como brasas incandescentes e suas presas cresceram pontiagudas em sua boca, desafiando os heróis. A resposta foi imediata. Uma chuva de flechas caiu sobre seu corpo, carregadas de frio mágico e fúria. O inimigo desfez-se em fumaça antes que a corda do arco de Legolas terminasse de vibrar após os disparos.

Orion correu, seguindo o vampiro gasoso pelo corredor. Ao fazer a curva para a direita, foi atacado de surpresa. Pequenos arbustos secos que se elevavam do solo pedregoso ergueram-se e saltaram sobre o humano. Orion estraçalhou-os com suas espadas, intrigado com a natureza daqueles estranhos seres. Além de tentar perfurar seu corpo com seus galhos afiados, os ramos secos pareciam tentar sorver o sangue do guerreiro.

A fumaça que era o vampiro subiu para o teto, longe do alcance dos aventureiros, e continuou seu movimento sinuoso escada acima. Os heróis o seguiram até seu sarcófago no andar superior onde o degolaram e queimaram, tal qual haviam feito antes com os outros vampiros. Desta feita tinham a certeza de que aquele inimigo não voltaria a importuná-los. Com aquela ameaça contida, era hora de voltarem a repousar.

_ Vamos voltar a descansar – disse Lucano. – Podem todos dormir tranquilamente, pois Dililiümi vigiará para nós agora que a magia de Nailo foi desfeita. Se alguém se aproximar de nós, ela nos acordará!

Os heróis se reuniram em uma das salas e a transformaram em acampamento. Lucano fincou a espada mágica à sua frente e, assim como seus companheiros, pôs-se a dormir. Squall, diferente dos demais, permaneceu acordado. O feiticeiro retornou à sua forma original e pôs-se a polir um espelho que trazia em sua mochila mágica, enquanto conversava com a espada, ouvindo desta suas histórias do passado em Lenórienn. Enquanto ouvia os relatos das muitas batalhas travadas pela arma, a mente de Squall se voltava para seu irmão.