Como a maioria dos
elfos do mundo de Arton, Griel Edhelel nasceu e cresceu no antigo reino élfico
de Lenórienn. A monumental cidade-estado era uma verdadeira joia incrustada na
floresta. Suas torres erguiam-se, imponentes, na paisagem de Lamnor, o antigo continente
sul. Era o orgulho da raça élfica. Mas, foi esse orgulho que levou esta
majestosa raça à sua derrocada.
Os elfos chegaram eras atrás a Lamnor, vindos de navio de algum
outro continente esquecido. Ocuparam uma vasta porção do continente sul,
construindo ali seu reino. O local era habitado por diversas outras raças e
monstros, dentre estes últimos estavam os hobgoblins. Estas criaturas não
ficaram nada felizes com a “invasão” élfica e uma guerra teve início. Durante séculos
os hobgoblins tentarão em vão destruir o reino élfico no conflito que ficou
conhecido como Infinita Guerra. Os elfos eram superiores aos seus rivais, tanto
tecnologicamente quanto taticamente. Possuíam guerreiros melhores, armas
melhores, magias. E assim, incursão após incursão os goblinóides eram
derrotados.
Enquanto os hobgoblins tentavam destruir os elfos, outras raças
os desejavam como aliados. Humanos que habitavam o continente sul formaram uma
aliança e foram negociar com seus vizinhos. Mas os elfos se julgavam superiores
demais, consideravam-se a perfeição, e desta forma jamais se aliariam a seres
inferiores. Os humanos foram humilhados e retornaram para seus reinos
indignados. Assinaram, então, um tratado que foi decisivo na derrota dos elfos,
o tratado de Não Interferência em Assuntos Élficos. Nenhum reino interferiria
nos assuntos dos filhos de Glórienn, fosse para bem fosse para mal, em qualquer
circunstância que fosse.
Então, uma antiga profecia bugbear se cumpriu, e o general Twor
Ironfist nasceu. Reuniu as tribos de sua raça e as treinou, transformando-as em
um exército organizado. Fez aliança com as outras espécies de goblinóides e
outros monstros, criando a assim chamada Aliança Negra, composta de goblins,
hobgoblins, orcs, bugbears, kobolds, gnols, trolls, ogros e muitas outras
criaturas malignas. Como prova de boa-fé para firmar tratado com os hobgoblins,
Twor levou seus exércitos, treinou os aliados e conseguiu o que parecia impossível.
Derrotou os elfos. Seus exércitos marcharam sobre a cidade, profanando, destruindo
e violando tudo o que encontravam em seu caminho. Nos momentos finais da
batalha decisiva, diversos mensageiros foram enviados para pedir auxílio aos
reinos humanos – os elfos engoliam seu orgulho. Mas já era tarde, pois os
mensageiros que conseguiam retornar vivos traziam más notícias. Os humanos se
recusaram a ajudar os elfos, seguindo seu tratado. “Se são superiores, que se virem sozinhos” – respondiam alguns
regentes aos mensageiros. E entre estes mensageiros, estava Griel.
Junto com seu pai, Thrundil, servia ao exército de Lenórienn.
Atuava como batedor e era exímio rastreador. Era capaz de detectar os rastros
mais sutis, graças ao fato de ser daltônico, e segui-los sem que fosse notado
por suas presas. Por isso foi escolhido para ser um dos mensageiros que buscariam
auxílio. Griel cruzou as fronteiras do reino furtivamente, passando através das
linhas inimigas em segurança. Viajou rapidamente até o reino vizinho de
Neridian. E sequer conseguiu falar com o regente. Foi enxotado da porta, como
um animal infecto. A arrogância com que seus compatriotas tinham tratado os
humanos agora era devolvida. Griel retornou com sua resposta o mais rápido que
pode. Havia dias que tinha deixado sua pátria e ansiava por juntar-se ao
terceiro batalhão, para combater os inimigos junto com seu pai. Ressentia-se da
ordem que tivera que cumprir. Deixara seu posto desnecessariamente, já que os
elfos não precisavam de ajuda para derrotar novamente aquelas criaturas
inferiores. E, principalmente, jamais precisariam da ajuda de uma raça inferior
como a dos homens. Eles eram elfos, eram filhos de Glórienn, eram a perfeição.
Mas, seu senso de superioridade caiu por terra quando avistou as majestosas
torres de marfim sendo derrubadas e os exércitos pútridos do inimigo marchando
cidade adentro, sobre as muralhas destruídas de sua amada cidade. Quando
finalmente chegou ao perímetro urbano, já era tarde demais. Lenórienn caíra. A
raça perfeita fora derrotada.
Griel procurou por algum sobrevivente, mas nada encontrou a não
cenas de morte e de sofrimento, por onde quer que passasse. Não havia pista do
paradeiro de seu pai, que deveria ter sido morto junto com os outros soldados,
ou de sua mão, Legoriel. Encontrou apenas o arco de seu pai e sua velha
caixinha de fumo, naquilo que restara de sua casa, e os guardou. Seriam as únicas
recordações que levaria consigo de seu amado lar. Avistou um batalhão hobgoblin
não distante dali, não era mais seguro ficar ali. Mas Griel não se importava mais
com sua vida. Queria exterminar, uma por uma, aquelas aberrações. Carregou o
arco, mas antes que pudesse disparar, uma mão forte o agarrou e o puxou para trás
de uma mureta. Era seu tio, Eruenvinyanto.
_ Você não honrará Glórienn
ou seus pais morrendo aqui estupidamente, filho de Thrundil! – disse o elfo
mais velho. - Venha comigo e viva mais um
dia para ceifar a vida de mais inimigos!
Seguindo a orientação do irmão de seu pai, ele deixou sua terra
natal e juntou-se a um grupo de sobreviventes. Enquanto a Aliança Negra ocupava
o reino caído, tornando-o sua base de operações, Griel fugiu para o norte,
tornando-se um proscrito, como muitos outros de seus irmãos se tornariam nos
anos seguintes.
Os proscritos vagaram pelo continente sul por um longo tempo, até
finalmente decidirem rumar para o norte, rumo a Arton. A aliança Negra cresceu
e se expandiu, dizimando os reinos humanos e tornando-se a única força operante
abaixo do Istmo de Hangpharstyth. Sem opção, os remanescentes das nações destruídas
deixaram sua terra de origem e foram se instalar na região conhecida como O
Reinado. Muitos, entretanto, permaneceram na cidade fortaleza que fazia o papel
de fronteira entre os dois hemisférios: Khalifor. Entre os que ainda lutavam na
fronteira, estava o grupo de Griel.
Junto com o tio, Griel se refugiou em Khalifor, o último bastião
a defender o continente sul e a impedir a travessia das hordas goblinóides para
o Reinado ao norte. Apesar de ter sido construída por humanos, Khalifor parecia
impenetrável. Confiante de que os inimigos jamais sobrepujariam aquela
fortaleza, ainda mais com o reforço de vários elfos, ele passou seus dias
dedicando-se à sua vingança.
Mas a tensão na zona de fronteira foi aumentando ano após ano. O
reino de Tyrondir, onde ficava Khalifor, buscava ajuda dos reinos vizinhos, mas
ninguém, à exceção dos próprios Tyrondianos, acreditava na possibilidade de tal
levante militar goblinóide. Além disso, tinham que lidar com seus próprios e
terríveis problemas: a Tormenta avançava sobre o Reinado e já tomara uma região
habitada em Trebuck.
A moral dos soldados ganhou novo vigor quando um grupo de elfos
surgiu como que do nada e pôs para correr as tropas acampadas em cerco à
cidade. Um pequeno grupo com poderes fantásticos, que eram capazes de domar
dragões, permaneceu poucos dias na cidade-fortaleza, derrotou os acampados da
Aliança Negra e avançou em seu território causando grandes baixas às forças de
Twor.
Parecia que a guerra finalmente seria vencida. Mas, tão rápido
quanto vieram, os heróis desapareceram. Apesar disto, a moral dos homens estava
elevada e parecia que poderiam matar o general bugbear com as próprias mãos.
Griel, entretanto, estava cauteloso. Já vira um exército
superior e confiante ser derrotado por aquelas bestas fétidas, e sabia que tudo
poderia se repetir. E estava correto.
Pouco mais de um ano depois da incursão dos heróis élficos, logo
após o mundo estremecer ao som de misteriosas trombetas, as forças da Aliança
Negra invadiram a cidade por baixo, escavando um túnel numa máquina maligna
chamada de Carruagem de Ragnar e penetrando na cidade como um enxame. Assim, no
dia 25 de Cyd de 1400, Khalifor finalmente caiu.
Novamente, Griel fora incumbido de convocar reforços. Percorria
os acampamentos acima de Khalifor, chamando os soldados às armas. Quando chegou
ao acampamento élfico, Griel desceu ao inferno uma segunda vez.
Chamas engoliam as barracas e devoravam os filhos de Glórienn
que ali estavam. Eram chamas estranhas e sinistras, que brilhavam num tom de
cor diferente do que seria normal e que não emanavam calor algum. Mesmo assim,
seu poder de destruição era avassalador, consumindo tudo o que tocavam. Griel
correu em socorro do seu povo, mas era tarde. Dezenas de elfos jaziam sem vida
nos campos de Tyrondir. E, para seu maior espanto, os corpos não estavam
carbonizados, como era de se esperar, tinham se transformado em pedra. Diante
de seus olhos, Griel testemunhou um de seus irmãos ser engolido pelo fogo
mágico. Seus gritos de desespero extinguiam-se lentamente junto com as chamas,
enquanto seu corpo era convertido em pedra fria e porosa.
Um novo grito, não muito longe dali, chamou sua atenção. Griel
correu entre as barracas e encontrou seu tio. E viu o inferno novamente.
Um enorme hobgoblin, emoldurado numa couraça metálica reluzente
brandia uma espada. Em seu peito a figura de uma rosa rodeada de cristais de
gelo chamava sua atenção. Seu cabelo era preso no topo da cabeça horrenda num
rabo de cavalo que descia até o meio das costas largas. Diante dele estava Eruenvinyanto,
seu tio, já desarmado. O aço traçou um arco brilhante no ar. A espada foi
embainhada rapidamente enquanto o corpo do elfo despencava. Na mão esquerda do
hobgoblin a cabeça de Eruenvinyanto balançava sem vida enquanto seu sangue, amarronzado
aos olhos de Griel, jorrava farto pelo chão.
Griel urrou encolerado e correu em direção ao seu novo inimigo
mortal. As chamas, entretanto, entraram em seu caminho, impedindo sua passagem.
Um segundo de hesitação surgiu, o hobgoblin sorriu maliciosamente para Griel e
virou-lhe as costas. O elfo disparou uma flecha que cruzou o fogo, e atingiu em
cheio as costas do inimigo. A flecha ardia em chamas, tomada pelo fogo sombrio.
Griel quase comemorou, esperando que as chamas consumissem e petrificassem o
algoz de seu mentor. Equivocou-se. A besta arrancou a flecha de suas costas num
puxão indolor. Estava indiferente. Jogou o projétil ao chão como se aquele
ferimento nada significasse para ele. Meteu a mão numa bolsa que trazia à
cintura e sacou um rolo de pergaminho. Desenrolou-o e pronunciou rapidamente um
feitiço. Antes que a segunda flecha de Griel chegasse até ele, o hobgoblin
desapareceu magicamente diante de seus olhos.
Os olhos perspicazes do elfo viram, numa fração de segundo, um
pequeno pedaço de pele com inscrições caindo da bolsa do inimigo no instante em
que ele pegara o pergaminho. Sem hesitar, Griel se lançou à frente, em direção
às chamas. Seu arco, herança de seu pai, emitiu um brilho tênue e Griel foi
envolto num redemoinho que afastou o fogo maligno, protegendo-o. Griel recolheu
o pedaço de pele e viu nele nomes de diversos lugares, vilas ou cidades, e
entre eles estava Khalifor. Alguns nomes estavam riscados, enquanto outros não.
Griel tinha uma pista a seguir.
Após sepultar seu tio no campo de batalha da forma mais digna
possível, Griel deu as costas para Khalifor e partiu. Rumava para o norte,
enquanto a fortaleza era devastada pela Aliança Negra atrás dele.
Griel buscou a cidade mais próxima, reuniu recursos e pagou um
conjurador para ajudá-lo em sua busca. Teleportado para o Reinado, Griel
percorria o reino de Tollon, em direção à sua capital, Vallahim.
O anoitecer obrigou-o a interromper sua marcha e buscar abrigo.
Griel deixou a estrada e adentrou a mata. Sentiu-se bem naquele lugar coberto
de árvores negras como a noite e por um breve instante pode relaxar. Então a
melodia suave da flauta de Mavastus preencheu seus ouvidos.
_ E agora estou aqui, rumo
a essa cidade de Vallahim, para tentar impedir que esse hobgoblin repita lá o
que fez em Khalifor. E para cravar uma flecha entre seus olhos amarelos – disse
Griel ao concluir sua história. Omitira os eventos em Lenórienn e a deficiência
de seus olhos.
_ Então Khalifor caiu? – perguntou
Mavastus.
_ Sim! O Eixo do Mal já
atravessou a fronteira a esta altura.
_ É... E a tal Aliança
Negra realmente existe, então – concluiu o patrulheiro. – Teremos muitos problemas se eles não forem detidos logo.
_ Sim – concordou
Griel. – Agora, se me dão licença, devo
partir. Pois tenho que chegar a Vallahim antes que a tragédia se abata por lá
também.
_ Não adianta! – era Cieri.
– Eu acabei de vir de lá. A cidade foi
atacada. O orfanato em que eu cresci foi incendiado da mesma forma que vocês
dois disseram. – completou, apontando para Theon e Griel.
_ Obviamente, meus caros, –
começou Mavastus – há um padrão
nestes ataques. Não são simples ataques de goblinóides. Algo grande está sendo
tramado. Vocês todos têm informações importantes que devem ser compartilhadas
para evitar ainda mais mortes. Então, Cieri, conte-nos o que aconteceu na
capital.
A meio-demônia narrou ao grupo o que acontecera no orfanato sem,
óbvio, mencionar Ônix.
_ Espere! – protestou Toph
ao final do relato. – Você disse que
fugiu? Mas como assim? Você viu as pessoas morrendo e não fez nada?
Simplesmente fugiu?
Cieri não quis dar mais detalhes para não denunciar seu
alter-ego, aumentando ainda mais a desconfiança de Toph. As duas iniciaram uma
discussão acalorada e trocaram ofensas. Foi Griel quem apartou a briga.
_ Olhe, garota! Pare com essas especulações inúteis. Você não pode julgá-la
assim desta forma. Eu também não pude fazer nada para salvar meu tio. Além do
mais, você não pode acusá-la de nada aqui, pois nós nem sabemos ainda qualquer
coisa sobre você. O mais importante agora é o estado da cidade, e não se ela
fugiu ou não de lá. Humana – Griel ignorava o fato de Cieri ser uma
mestiça. – Você disse que veio de lá
agora. Então a cidade deve estar bem próxima, certo?
_ Não, na verdade está bem
longe daqui – respondeu ela. - Eu
cheguei bem rápido porque vim a cavalo.
_ E onde está esse cavalo?
– perguntou Toph.
_ Está aqui perto. Kurama!
– gritou a moça. O cavalo negro entrou na clareira e Cieri alterou magicamente
a cor de suas chamas para parecerem fogo normal. Todos ficaram espantados e
começaram a indagar sobre o animal. Ela se limitou a dizer que o encontrara,
ainda filhote, na floresta e cuidara dele desde então. A desconfiança de Toph só
aumentava.
_ Bem, você disse que
tinha um pergaminho com os nomes de algumas cidades, e que Vallahim estava
nele. Posso vê-lo? – pediu Cieri.
Griel exibiu o pergaminho ao grupo e nele podia se ver os nomes
das cidades de Theon, Griel e Cieri, além de outras. Os nomes e seus reinos
eram: Sambúrdia – Capital, Kazordoon – Bielefeld, Khalifor – Tyrondir, Cavalo
Branco – Deheon, Thartann – Ahlen, Sordh – Lomatubar, Vallahim – Tollon, Rhond –
Zakharov. Os dois primeiros nomes, bem como o quarto e o sexto estavam
riscados. Sobre o segundo nome havia uma notação em vermelho: Thug. E sobre a
quarta e a quinta cidade havia outra anotação: Grosh.
Cieri leu os nomes, um por um. O grupo foi reconhecendo os
nomes.
_ Kazordoon é minha cidade
– disse Toph.
_ Cavalo Branco é a minha –
era Lisbeth.
_ Eu passei por Thartan
– falou Celerin.
_ E minha mãe foi raptada
nessa cidade de Lomatubar – completou Mhurren.
_ Como eu disse, não são
ataques isolados. Algo acontece. Contem tudo o que sabem – pediu Mavastus.
Lisbeth deu um passo à frente e começou sua história.
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