maio 26, 2010

Capítulo 365 – Horda




Anix e Lucano tentavam a todo custo tirar Orion de seu estado de catatonia. O guerreiro não respondia a qualquer estímulo, permanecendo absorto em seus próprios pensamentos. Vez ou outra o humano gritava desesperado, como se algo terrivelmente assustador o atacasse e tentava, de todas as formas, fugir correndo. Vez ou outra ele também alterava sua condição para um estado de fúria, no qual Orion tentava atacar quem quer que estivesse perto de si. E eram raros os momentos em que Orion voltava à lucidez, e estes não duravam muito, lançando a mente do rapaz novamente à loucura completa. Legolas e Nailo vigiavam as escadas, enquanto os demais descansavam, aguardando o momento de assumirem seus turnos de vigília. O grupo repousava no mesmo laboratório onde Nailo quase fora morto pelo monstro que tentara afogá-lo no barril. Nailo fumava seu cachimbo, pensativo, enquanto Legolas construía flechas de gelo para abastecer sua aljava já quase vazia. À exceção da situação de Orion, a noite corria tranqüila, até que os olhos de Legolas viram o perigo se aproximando.
_ Nailo! Avise os outros e venha aqui depressa – disse o arqueiro alarmado. Era visível a preocupação em seu rosto e em sua voz. – Vamos ser atacados.
O Guardião avisou aos companheiros e correu para a escada que lavava para baixo, vigiada pelo companheiro. Seus olhos viram uma horda de criaturas pútridas caminhando vagarosamente escada acima. Eram zumbis.
_ Chegou a hora! – disse Nailo com temor, sacando sua arma. Os zumbis foram se amontoando no piso inferior, tomando conta de todos os espaços enquanto se aproximavam perigosamente dos dois elfos. Liderando o batalhão de mortos-vivos, duas nuvens de vapor flutuaram ao lado de Legolas e Nailo. As fumaças se adensaram e transformaram-se em vampiros sedentos de sangue.
Legolas usou seus poderes para congelar o fosso da escada, para impedir que os zumbis chegassem até eles. Os vampiros o atacaram, ferindo seu corpo com suas garras pontiagudas. Um enorme cão cinzento de olhos escarlates surgiu de um portal de trevas, invocado pelos vampiros, e derrubou o elfo no chão enquanto suas mandíbulas rasgavam a perna do arqueiro. Legolas revidou com uma saraivada de flechas de gelo. Nailo ergueu sua espada, a bastarda que retirara de uma das armaduras que o atacaram no castelo de Zulil, e desceu a lâmina com vigor sobre o peito de um dos vampiros. O fio da espada penetrou superficialmente no peito da criatura, abrindo um corte pequeno que começou a se fechar velozmente. Anix apareceu na entrada da sala, disparando mísseis mágicos nos vampiros para ajudar os companheiros. Os demais já se aproximavam para combater, inclusive Orion que seguira Anix por instinto, sem entender o que acontecia.
Os zumbis chegaram ao gelo criado por Legolas e começaram a forçá-lo. Várias trincas surgiram na placa congelada, alertando os heróis.
_ Não temos muito tempo. O gelo não vai agüentar. Temos que sair daqui – gritou Legolas, disparando mais uma flecha no cão que o mordia. O animal tombou no solo pesadamente e desapareceu num turbilhão de sombras.
Nailo afastou-se dos vampiros, enquanto Legolas e Anix ganhavam algum tempo. Pegou em seu bolso um frasco de óleo mágico e o despejou na lâmina da espada. A arma começou a brilhar intensamente, ofuscando a todos. Nailo ergueu a espada e correu em direção aos vampiros. A luz, quase tão forte quanto o sol, fez os vampiros se esvaírem em fumaça e evadirem. Nailo os perseguiu pelo corredor até que as duas nuvens de vapor se desintegrassem por completo. O ranger não teve tempo para comemorar a vitória sobre os vampiros, pois o gelo que segurava a horda de zumbis não resistiu à pressão e quebrou.
Uma dezena de zumbis saltou para dentro da sala numa fração de segundo. Legolas os abateu com flechas, enquanto Anix queimava outros, que terminavam a subida da escada, com sua magia. Orion corria de um lado para outro no corredor, completamente fora de si, quando Nailo finalmente retornou à escada.
_ Recuem! – rugiu Nailo. – Eu vou segurá-los o máximo que conseguir.
_ Você não fará isto sozinho – disse Legolas. – Eu vou ajudá-lo. Anix, dê um jeito no Orion e prepare-se. Quando nós cairmos, será sua vez de lutar.
Uma centena de zumbis se atirou sobre os dois elfos. Mãos putrefatas e dentes apodrecidos agarravam os dois, rasgavam seus corpos já cansados de tantas batalhas. Legolas e Nailo revidavam com suas armas. O ranger retalhava, agora com suas espadas gêmeas, numa dança bela e mortal. O arqueiro perfurava os monstros com suas setas congelantes, criando estátuas tétricas que eram rapidamente pisoteadas pelos próprios companheiros mortos-vivos.
A horda foi ganhando terreno lentamente. Nailo e Legolas recuaram para o corredor, exaustos, deixando dezenas de corpos destruídos em seu encalço. Legolas lembrou-se de quando conheceram o ranger Mavastus, nas florestas de Tollon, quando ele sozinho derrotara um horda igualmente numerosa de goblins. Surpreendeu-se ao ver que a quantidade de corpos abatidos por ele se igualava à do amigo. Porém, estes inimigos eram imunes à dor e ao medo, e não paravam de chegar. O corredor já estava tomado de cadáveres caminhantes quando Legolas e Nailo, vencidos pelo cansaço, cederam lugar para Anix e Squall.
Dragão e elfo combateram com ferocidade, queimando os inimigos com seus sopros mágicos. Os inimigos continuaram avançando, ganhando terreno, sobrepujando o poder de fogo dos dois irmãos. Anix e Squall foram obrigados a também abandonar o combate, Squall com suas forças exauridas e Anix sem magias para usar e com todo o poder do cajado mágico esgotado. Lucano e Mexkialroy lutaram lado a lado com Luskan e os demais, até que suas forças também se esgotassem e Nailo e Legolas voltassem à linha de frente.
Cerca de uma hora se passou até que o último morto-vivo finalmente parou de se mexer. O corredor era um mar de cadáveres e os heróis, exaustos e cobertos de poeira e suor, mal se agüentavam em pé. Foi quando ouviram o som de passos vindo da escada lentamente. Como um filme em câmera lenta os heróis assistiram à chegada e mais um inimigo Aoket, a múmia que os jurara de morte, pisou confiante sobre os cadáveres no corredor, caminhando vagarosamente em direção ao grupo, saboreando cada momento da sua iminente vitória.
_ Maldito! – cuspiu Legolas. Disparou uma flecha, mas esta foi agarrada por Aoket e esmagada facilmente.
_ Temos que recuar! – disse Luskan, constatando o óbvio. O grupo começou a rastejar para trás, enquanto seu algoz avançava com um sorriso sádico no rosto coberto de ataduras.
_ Sam! Precisamos da sua ajuda! – gritou Anix. O colar de Orion brilhou uma vez mais. De dentro da jóia o bardo viu a gravidade da situação e agiu.
_ Fujam, amigos! Eu vou detê-lo! – Sam usou sua mágica para criar uma parede de tijolos entre seus amigos e a múmia. Uma ilusão que apenas serviria para ganhar alguns segundos e permitir que alguns escapassem com vida da fúria da múmia.
O grupo fugiu o mais rápido que pode para o cemitério onde havia ocorrido o reencontro com os genasis. Aoket continuou avançando em seu ritmo lento até a parede ilusória. Desferiu um soco contra a barreira, confiante em poder estraçalhá-la. Surpreendeu-se ao ver sua mão atravessá-la sem dificuldade e finalmente pode ver através da ilusão. A múmia entrou no cemitério onde os heróis permaneciam encurralados, exaustos e sem poderes.
_ Chegou sua hora! – gritou a múmia. O monstro correu até Anix numa velocidade surpreendente. O punho envolto em faixas golpeou o peito do mago, Anix empalideceu e sentiu que desmaiaria a qualquer instante.
Então, Orion que até aquele momento não passava de um fardo, teve um breve surto de sanidade. O guerreiro saltou por cima dos companheiros e se atirou sobre Aoket. A múmia esquivou facilmente, deixando o corpo do humano estatelar-se no chão de terra. Este foi seu primeiro erro. Orion agarrou-se às pernas de Aoket, impedindo-o de avançar até seus amigos. O guerreiro sacrificaria a própria vida se necessário, para permitir que seus amigos exaustos pudessem escapar. Mas não houve fuga.
Nailo e Squall avançaram contra o inimigo. Squall saltou sobre ele, pousando em suas costas e agarrando seu corpo poeirento. Nailo juntou-se a Squall e Orion, prendendo os braços e as pernas de Aoket.
_ Isto termina aqui! – rugiu Legolas, disparando sua última flecha contra o elmo de Aoket. A peça voou para longe da cabeça de seu dono, garantindo que este não fugiria novamente. ­– Anix! Agora!
Anix pulou diante de Aoket com um sorriso de escárnio nos lábios. Ergueu a mão direita, exibindo uma pequena e inofensiva pulseira de flores que um instante antes estava no pulso de Legolas.
_ E agora você morre de vez! – Anix segurou a pulseira com as duas mãos, alargando-a o máximo possível e a colocou no pulso de Aoket, que estava firmemente seguro por Nailo e Squall.
O mago saltou para trás, Squall voou para cima, Nailo pulou de lado e Orion, já novamente imerso em loucura, apenas ficou deitado no chão. Aoket recuou um passo, seu corpo movendo-se com dificuldade. A múmia levou a mão ao pulso com as flores, mas não conseguiu completar o movimento. Seu corpo inteiro ficou paralisado, seus olhos tétricos em uma expressão de pavor. O corpo da múmia desmanchou-se numa nuvem de pó amarronzado que se precipitou no solo, misturando-se à terra que o formava. Restou apenas uma pequena trança de flores no chão que foram murchando até também desaparecerem completamente. Ironicamente o que trazia a vida para as criaturas normais, trazia a morte para os não vivos. E assim terminava finalmente a longa existência de Aoket, o honrado campeão de Ashardalon.

Nenhum comentário:

Postar um comentário