
A caravana está sendo formada, juntem-se a nós e vamos invadir Pirassununga pra nos divertirmos juntos!
Finalmente os aventureiros e seus novos companheiros alcançaram o segundo nível além do topo da torre. O corpo do gorila ainda jazia aos pés da escada, tal qual na noite anterior, quando havia sido brutalmente assassinado pelo implacável inimigo Gulthias. Avançaram pelo corredor que se abria à esquerda e á direita, terminando em duas portas opostas, uma em cada extremidade da passagem.
_ Minha intuição diz para seguirmos pela esquerda – sugeriu Legolas. Os companheiros seguiram sua sugestão prontamente. Nailo avaliou os riscos que a porta poderia lhes oferecer, acompanhado de perto pelo misterioso Carion. Após terem certeza de que não havia armadilhas para ameaçá-los, os dois cederam espaço para Orion. O humano arrombou a porta com um golpe preciso, saindo do caminho de Squall que veio logo atrás cuspindo chamas através entrada que se abrira. O clarão iluminou uma pequena ante câmara, donde se podia alcançar outras três ocultas atrás de novas portas pétreas.
_ Esquerda novamente! – indicou o arqueiro.
O ritual se repetiu. Nailo e Carion procurando armadilhas, Orion abrindo a porta e Squall cuspindo fogo para eliminar qualquer ameaça antes que esta pudesse pensar em lhes fazer mal. Desta vez as labaredas do Vermelho iluminaram uma saleta quadrada, cujo chão era todo tomado por entulho e sujeira.
_ Abram espaço! Vasculharei esta câmara em busca de tesouros – Disse Mexkialroy com imponência.
O dragão azul vasculhou o chão enquanto um cone de chamas invadia a sala oposta onde mais escombros jaziam pelo solo. O dragão retornou ao corredor onde estavam os demais.
_ Encontrou alguma coisa? – perguntou Squall.
_ Não, nada – respondeu Mex, mentindo. O dragão foi investigar a outra sala aberta pelo grupo.
_ Bem, há mais uma porta em cada uma destas salas, e mais uma aqui no corredor. Qual delas abriremos primeiro? – indagou Nailo.
_ Sempre à esquerda – sugeriu Legolas.
O grupo adentrou a primeira saleta e o ritual de abertura da porta se repetiu outra vez. Desta vez encontraram um altar ao fundo de uma câmara de meditação que ficava na borda da torre. O cômodo tinha forma triangular e a parede que fazia divisa com o exterior exibia uma concavidade suave. Blocos de pedra usados como assentos se enfileiravam ao redor da câmara. Kátia e Lucano deduziram a função que aquele local tivera e a explicaram aos companheiros.
Em seguida, os jovens abriram a porta restante no corredor. Uma sala comprida e estreita se revelou. A parede oposta à entrada também ficava na borda da construção e além de um punhado de entulho e poeira, um pequeno baú decorava o chão no fundo da sala.
_ Tesouro! – murmurou o dragão azul, já de volta de sua exploração carregando uma caneca de prata com a figura de um dragão alado em sua base. Seus olhos brilharam faiscantes.
Orion atravessou o portal e foi em direção ao suposto tesouro. Mas, como era de se esperar, tudo não passava de mais uma armadilha. O chão se abriu sob os pés do guerreiro, tragando-o para a escuridão. O alçapão se fechou logo em seguida, separando o humano de seus amigos.
_ Orion! – gritou Legolas. O arqueiro tomou a vassoura mágica das mãos de Anix e pisou sobre o alçapão, sendo também sugado pelo fosso oculto. Legolas deslizou por um fosso escuro e íngreme. Sentiu seu corpo sendo cortado por navalhas que não conseguia ver. Então uma nova portinhola se abriu diante dele, jogando-o para fora da torre. O elfo despencou por uma das inúmeras bocas que adornavam a espiral maldita, agarrou-se à vassoura e pronunciou a palavra de comando, acionando o poder do objeto. A queda cessou e o aventureiro desceu lentamente rumo ao chão, dezenas de metros abaixo, de onde Orion acabava de se erguer, todo ferido devido à queda que sofrera.
_ Está bem? – perguntou o elfo.
_ Sim, acho que estou. Um pouco zonzo e escoriado, mas bem. – respondeu o humano.
_ Vamos! – Legolas agarrou o braço de Orion e o ajudou a subir na vassoura. Juntos voaram até o topo da torre e entraram novamente na enorme cripta vertical. Em poucos minutos, estavam outra vez reunidos com os amigos explicando-lhes o que acontecera.
Squall, que em sua forma dracônica era grande demais para despencar pelo fosso, invadiu a saleta e recolheu o baú que quase causara a morte de Orion. Para frustração de todos e cólera do humano, a pequena arca estava vazia.
Retornaram para a segunda sala do corredor, onde abriram a porta restante. Além dela mais escombros em uma câmara estreita e após estes, uma nova porta. Tal qual antes, Orion a abriu e Squall a invadiu despejando seu fogo dracônico com ferocidade. Desta vez, no entanto, as chamas queimaram alguma coisa: um tesouro. Pouco restou da gigantesca tapeçaria que ocupava a parede curvilínea oposta à entrada da câmara, a maior do andar até aquele momento. Quase não era possível mais distinguir a multidão de humanóides representada na fina relíquia. Entretanto, a figura de um dragão vermelho incrivelmente enorme sobrevoando o firmamento permanecia ironicamente intocada pelas chamas. Sem mais nada a ocupar o cômodo além de entulho chamuscado, o grupo retornou para o corredor que dava acesso à escada de subida, onde uma última porta lhes reservava um perigoso desafio.
Todo o ritual de abertura foi repetido, todas as precauções foram tomadas para evitar armadilhas e para não serem surpreendidos por inimigos. E, mesmo correndo o risco de destruir outra relíquia preciosa, Squall inundou outra vez o ambiente com suas chamas assim que Orion lhe abriu caminho. Um corredor sombrio se abria de uma ponta a outra da torre, exatamente sobre seu eixo central. Alcovas de três metros de largura ocupavam as duas paredes e nelas, sarcófagos de pedra ou metal, adornados com figuras humanóides diversas, jaziam em pé, intensificando a aura sinistra que permeava o ambiente. À direita, já quase na borda da torre, uma única porta conduzia para além da cripta, e à esquerda, na extremidade do corredor, um sarcófago metálico se distinguia dos demais ostentando a exótica figura de um humanóide com cabeça de chacal entalhado em alto relevo sobre sua tampa. Temerosos, os heróis adentraram a cripta, prevendo o iminente ataque do inimigos que aguardavam a chegada de intrusos havia séculos.
Azgher surgiu por trás do horizonte, inevitável, despojando Tenebra de seus domínios e impondo sua supremacia. Anix desceu para a taverna, onde encontrou seus novos companheiros reunidos e já prontos para partir. Luskan estava animado, sorridente e falador como na noite anterior, já Kátia mantinha-se calada e carrancuda, ainda irritada por ter sido derrotada. Carion mantinha um ar sombrio ao redor de si. Pouco falava e mantinha seu rosto o tempo todo oculto por um capuz. Seu corpo e, consequentemente, seus pertences também permaneciam escondidos sob o pesado manto que ele vestia. Já Rafael, o arcano do grupo, ocupava-se com pequenos truques mágicos.
_ Vamos partir? – perguntou Anix, saudando os contratados.
_ Claro! Já estamos todos prontos – respondeu Luskan com um sorriso.
O mago desenrolou um papiro envelhecido e começou a lê-lo. Faíscas surgiram em meio a outras luzes mágicas que envolveram os cinco aventureiros. A paisagem se modificou e numa fração de segundos todos estavam no alto de uma torre cercada por um abismo profundo e por uma gigantesca floresta.
Anix conduziu o grupo torre abaixo, em busca de seus amigos. Encontrou-os despertos, fazendo o desjejum no corredor central do primeiro andar explorado.
_ Dragão! – gritou Luskan exaltado. – Assumam posição de batalha! Depressa! – o guerreiro sacou sua própria espada e a apontou para Mexkialroy.
_ Esperem! Esses são meus companheiros, seus tolos! – redargüiu Anix, detendo-os.
_ Como assim companheiros? Que tipo de pessoas são vocês afinal? – indagou Luskan, ainda espantado. De fato estavam diante de um grupo muito estranho para os padrões normais. Mex, um dragão azul conhecidamente maligno, tinha Squall ao lado, cuja aparência que mesclava feições dracônicas e élficas não causava menos assombro. Legolas mantinha-se afastado dos demais em um canto. Chão, paredes e o próprio ar ao se redor congelavam formando uma paisagem de inverno em meio àquele inferno tropical. Orion era uma muralha de aço e afagava o pescoço de Galanodel, uma coruja maior que um cavalo de guerra. Nailo repetia o gesto, mas suas carícias eram direcionadas para um lobo de aspecto bestial que parecia capaz de devorar a todos ali sem, no entanto, saciar sua fome. Lucano, o de aparência menos incomum, travava um diálogo entusiasmado com uma espada prateada e Anix, o primeiro membro daquele grupo que tinham conhecido, trazia em sua face uma maldição na forma de um olho maligno que tentava todo o tempo dominá-lo.
_ Que tipo de pessoas nós somos? E quem deseja saber? – perguntou Nailo.
_ Esses são Luskan, Kátia, Carion e Rafael! Eu os trouxe aqui para nos ajudar – respondeu Anix.
_ Está louco? – gritou Legolas. – Você os trouxe aqui para morrerem. Acha que eles vão sobreviver por aqui, Anix? Isso foi uma grande irresponsabilidade.
_ Bem, eles ficarão sob minha guarda. Tentarei protegê-los o máximo que puder. Se alguma coisa acontecer a eles, a responsabilidade será toda minha – respondeu Anix.
_ Esperem ai, senhores! – intrometeu-se Luskan, irritado. – Estão nos subestimando demais. Somos mercenários profissionais, estamos acostumados a lidar com situações de risco. Não precisamos de proteção alguma.
_ Olha aqui, Luskan – começou Nailo. – Vocês estão chegando agora e não tem idéia do tipo de perigos que existem aqui. Vocês é que subestimam a torre.
_ Além do mais, vocês não tem nada a ver com nossa luta. Essa batalha é um assunto pessoal nosso, vocês não têm por que estar aqui. É melhor irem embora enquanto ainda podem – completou Legolas.
_ Ora, parem com essa conversa. Sabemos dos riscos, sabemos que aqui há vampiros e outros mortos-vivos aos montes. Avaliamos os desafios e tomamos nossa decisão. Firmamos um acordo com Anix e por isso estamos aqui. Agora essa torre também é assunto nosso – retorquiu Luskan.
_ E que acordo foi esse? – perguntou Nailo.
_ Nosso pagamento será de mil tibares de ouro, para cada um de nós. Metade desse valor será pago agora e a outra metade quando o serviço estiver completo. Além disso dividiremos os espólios encontrados na torre meio a meio. Metade para vocês e metade para nós. Certo, Anix?
_ Errado! – respondeu o mago, para espanto de todos.
_ Como assim? Você deu sua palavra!
_ Não dei não. Eu apenas disse: “Veremos”! Não prometi nada, disse apenas que veríamos o que fazer depois.
_ Entendo, agora percebo tudo. Foi um engodo muito bem arquitetado. Parabéns, Anix! Enganou-nos direitinho! – escarneceu Luskan.
_ Pois esse é mais um motivo para vocês irem embora – sugeriu Legolas.
_ Pois é agora que nós ficaremos. Nós vencemos a Forja da Fúria entre outros desafios, e não vamos nos acovardar diante de um bando de vampiros. Vamos ficar e lutar ao lado de vocês e exigimos nossa recompensa justa por nossos serviços.
_ Forja da Fúria? – espantou-se Nailo.
_ Já disse para vocês pararem com essa história – alertou Anix. – Vocês estão diante dos verdadeiros desbravadores daquele lugar maldito. Essa mentira não funciona para nos impressionar.
_ Ei, Luskan! – voltou a falar Nailo. – Vou lhe dizer umas coisas. Primeiro, se vocês estão ganhando a vida, conseguindo contratos usando nossos feitos, vocês é que nos devem dinheiro. Segundo, vocês não têm obrigação nenhuma de permanecer aqui e pelo seu bem, peço que partam agora. Há muitos perigos aqui, além daquilo que vocês imaginam. Não quero subestimá-los, mas vocês me parecem aventureiros em início de carreira. Bem, nós já passamos desta fase, reunimos grande poder, como podem ver, temos até um dragão, digo, dois, em nosso grupo. E mesmo assim, com toda nossa experiência e todo o poder que conseguimos, o próprio Anix perdeu a vida duas vezes neste lugar. Não fosse pela bênção de Lena, ele não estaria mais aqui entre nós neste momento. Só estamos aqui porque temos motivos muito maiores que simplesmente dinheiro. Vocês não precisam ficar aqui, podem ir viver aventuras em outro lugar, com menos perigos e com gente mais honesta – Nailo olhou com desaprovação para Anix e fez uma pausa antes de continuar. – Por isso peço que reconsiderem e voltem para o lugar de onde vieram.
_ Olha, Nailo! Agradeço sua preocupação. Percebo que você é sincero e honrado e vejo que não fala com arrogância, que não nos subestima. Agradecemos sua preocupação e honestidade, mas nós ficaremos e os ajudaremos. Provaremos àqueles que duvidaram de nossas capacidades o valor que temos. E além de tudo, não exigiremos nada em troca da ajuda. Se depois que sairmos daqui vocês julgarem que nossa ajuda merece alguma recompensa, então seremos pagos. Caso contrário, trabalharemos apenas pela glória e por nossa honra, coisa que infelizmente alguns dos seus amigos parecem não conhecer.
_ Está bem, então. Fiquem se assim quiserem. Me comprometo a tentar protegê-los se disso precisarem, mas saibam que estão por sua conta e risco. Temos inimigos poderosos a combater e devemos agir em grupo, cada um confiando que o outro fará a coisa certa. Não podemos nos preocupar com um salvar o outro de encrencas, ou todos morrerão. Todos têm que ser responsáveis aqui. E, se vocês se provarem valorosos, eu pagarei o dobro do valor que Anix deveria pagar a vocês.
_ Ótimo! Que seja assim! Prometo que não causaremos problemas, já que esta parece ser uma forte preocupação para vocês. Mais que isso, seremos de grade valia em sua missão. Acho que agora finalmente temos um acordo!
_ Certo! Temos um acordo. Agora vamos em frente, temos muito o que fazer.
E com um aperto de mão amigável, os dois grupos selaram o pacto e seguiram em sua jornada.