Capítulo 258 – Divergências
Com os ogros mortos, Nailo correu até Relâmpago, e deu-lhe uma poção mágica. O animal recebeu o líquido mágico e o engoliu a contra gosto. Segundos depois, já voltava a caminhar e a se mover normalmente, e, aparentemente, já não sentia mais dor alguma. Abaixado, enquanto cuidava de seu amigo, Nailo notou algo estranho a metros dali. Havia um vulto, oculto atrás da folhagem da mata, sobre uma árvore, que observava o grupo. Era um orc.
Sem dizer nada aos companheiros, Nailo ordenou que todos se calassem, e que permanecessem parados em seus lugares. Mas, como não bastava apenas dar ordens, mas sim explicar o que acontecia, o ranger se viu forçado a contar sobre a presença do orc. Ainda assim, ordenou que todos esperassem, sem lhes revelar o seu plano ou alertá-los da real gravidade da situação. Avançou alguns metros, e viu que o orc parecia conversar com alguém, devia haver mais deles espalhados pelo lugar. Então, moitas se mexeram à frente do grupo, e um bando de cinco orcs surgiu de trás delas, todos armados com arcos e espadas embainhadas.
_ Sem armas! Não lutar! Conversar! – disse um dos monstros, estendendo a mão para o grupo como se pedisse para pararem. Falava em valkar com um sotaque carregado que demonstrava dificuldade no domínio da língua dos humanos. Sua voz era rouca e gutural, como se falasse com a garganta cheia de sujeira.
_ Todos calmos! Ninguém ataque! – ordenou o sargento aos soldados – O que vocês querem? – perguntou depois aos orcs.
_ Vocês invadir território nosso! O que querer nós? – disse o orc.
_ Não queremos nada com vocês! Estamos procurando um gigante! Deixem-nos passar e não lhes faremos mal! Mas, se nos impedirem, nós lutaremos! – respondeu o ranger.
_ Você amigo gigante? – perguntou o chefe orc.
_ Talvez! – respondeu Nailo, sem hesitar. Os orcs sacaram suas espadas e arcos, e prostraram-se em formação de combate.
_ Nós inimigo gigante! Você amigo! Você inimigo nós! – gritou o líder dos monstros, enquanto desembainhava sua arma.
_ Calma, sem armas! Nós também não somos amigos do gigante! Nós viemos procurar ele por que ele está atacando uma vila! E se ele não parar de atacar a vila nós o mataremos! Olhe lá atrás, já matamos três gigantes! Não somos amigos de gigantes! E somos poderosos, como você pode ver! Acho melhor não lutarmos! – Nailo falava e gesticulava, tentando acalmar os orcs e seus próprios soldados, que já se aproximavam dele sacando suas armas para o combate.
_ Para trás! Guardem suas armas! Fiquem todos atrás de mim, isso é uma ordem! – gritou Nailo para seus soldados, tentando evitar uma batalha desnecessária.
O clima era tenso, e qualquer gesto mal pensado provocaria um derramamento de sangue. Ora, Nailo sabia por sua experiência que aqueles cinco orcs não seriam páreo para ele e seus soldados. Ele já tinha enfrentado aquele tipo de criatura diversas vezes, e sabia como elas lutavam, e que suas habilidades não se comparavam à sua. Mas, mesmo assim, Nailo temia. Temia pelos seus soldados, muito mais fracos que ele e inexperientes. Temia pela presença de Atilat no grupo, pois sabia que, sendo uma mulher, a jovem seria o alvo principal dos monstros. E temia porque sabia que orcs não costumavam negociar, e que eles não se arriscariam daquela forma se não tivessem um trunfo, algo como uma horda de soldados orcs escondida no meio da floresta pronta para atacar. Assim, o ranger tentava evitar a luta a todo custo, para não arriscar as vidas de seus soldados, e também para não ter que matar criaturas que possivelmente poderiam fornecer informações sobre o ettin que eles caçavam.
Mas, de ambos os lados os combatentes hesitavam em baixar as armas, temendo serem atacados à traição pelo grupo rival. Alheia a toda aquela pressão e agressividade masculina, Atilat pensou em uma solução para resolver o conflito sem maiores problemas. Com sua adaga, a elfa arrancou a cabeça de um dos ogros abatidos e arrastou-a até a linha de frente de seu grupo. Temendo uma reação agressiva por parte dos orcs, Nailo tentou impedi-la, mas Atilat ignorou as ordens do sargento e seguiu em frente, só parando quando estava na metade da distância que separava os soldados dos orcs.
_ Não somos amigos de gigante algum, estamos aqui para caçá-lo! Olhe por si próprio! – e dizendo estas palavras num tom grave, Atilat encarou-os com frieza e atirou a cabeça do ogro a seus pés.
Os orcs olharam com estranheza para a elfa. Levaram as mãos às espadas e por pouco não atacaram ao ver o estado em que estavam os ogros. Entretanto, o líder das criaturas ordenou que guardassem as armas, Nailo fez o mesmo de seu lado, e ordenou que Atilat retornasse, mas a elfa permaneceu imóvel entre os dois bandos.
_ Vocês poder passar! Nós não quer brigar! Vocês inimigo de gigante como nós, poder passar! Casa gigante fim da trilha! Nós embora casa! – O líder orc falou com seu sotaque carregado, depois fez um gesto com a mão e seus seguidores se retiraram junto com ele, desaparecendo no meio da floresta. O último orc, que estava em cima da árvore, juntou-se a eles em seguida, e tudo se acalmou. Irritado com a atitude de Atilat, Nailo foi repreendê-la por ter desobedecido as suas ordens.
_ Você não deveria ter feito aquilo sem minha permissão, Atilat! – disse Nailo.
_ Ora, mas por que? Não fiz nada demais, além disso, deu tudo certo, não deu? – respondeu ela com um sorriso.
_ Por que? Ora, porque eu estou no comando, eu sou o sargento aqui e todos devem seguir minhas ordens! – retrucou Nailo.
_ Bem, mas eu não sou do exército, então isso não significa nada para mim! – respondeu Atilat.
_ Isso não importa! Eu estou no comando aqui e você deve obedecer minhas ordens! Afinal, você está sob minha responsabilidade e não deve se arriscar assim! Eu prometi que ia levar todos de volta em segurança, e se acontecer algo a algum de vocês, eu serei o responsável, portanto, é bom que sigam minhas ordens! – insistiu o ranger, já irritado.
_ Mas você não precisa se preocupar com isso, eu já sou bem grandinha e sei me cuidar muito bem, não preciso de ninguém pra me proteger! E se me acontecer alguma coisa, você não terá nada a ver com isso, eu me responsabilizo pelos meus atos! – continuou a moça.
_ Não, isso é inaceitável! Ou você segue minhas ordens, ou não vai com a gente! Pode retornar para a vila, então! – reclamou o sargento.
_ Não, eu não vou voltar para a vila! Eu disse que ia ajudar e vou, do meu jeito! – retrucou a elfa.
_ Eu sou a autoridade aqui, e estou mandando você ir embora! Então obedeça!
_ Ora, autoridade coisa nenhuma! Isso não passa de papo furado, seu merdinha! Você não pode mandar em mim assim! Eu tenho livre arbítrio e vou aonde quiser, então não me venha dar ordens, seu idiota! – rebateu Atilat, também muito irritada. Os soldados apenas observavam, atônitos.
_ Pare já com isso moça! Ou você vai embora ou então...
_ Ou então o que? Vai me prender? Prenda então!
_ Isso mesmo! Akira, prenda-a imediatamente, é uma ordem soldado! – gritou Nailo. O recruta retirou um par de grilhões que trazia na mochila e atou os pulsos da donzela. Kawaguchi tentou se opor, pois considerava um abuso tratar aquela bela mulher daquela forma rude, mas se calou, pois cumpriria à risca as ordens de seu superior, mantendo sua honra intacta. Do alto, Hydor balançou a cabeça em desaprovação, mas também não disse nada. Lord, o halfling, olhava para Nailo, para Atilat e para Akira, com olhar angustiado, mas com a boca calada. A intriga começava a dominar o grupo e Nailo começava a perder o controle da situação. Nesse momento, em algum lugar de Arton, uma serpente de cinco olhos sorriu com satisfação, e, muito distante dali, mais longe do que qualquer cavalo ou pássaro podia alcançar, Glórien suspirou profundamente. Mas, antes que ela pudesse perder a calma e protestar, Allihanna consolou-a, colocando sua pata sobre o ombro da elfa e dizendo que cumpriria outra parte de sua promessa em breve.
_ Vamos voltar para a vila! – a voz de Nailo ecoou pela escuridão, como o rugido de um animal ferido. Ferido onde mais doía, no orgulho. E todos retornaram para Forte Novo.
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