novembro 05, 2008

Capítulo 325 – O Mundo Perdido


O pequeno bote de madeira atracou na praia. Era uma larga faixa de areia amarelo escura, que se estendia por todo o litoral da ilha além do alcance dos olhos atentos dos que aportavam. Atrás do grupo, o navio do capitão Engaris se distanciava, já desaparecendo atrás do horizonte. E à frente havia a selva de Galrasia. Uma floresta de proporções gigantescas e mistérios por descobrir.

Galrasia era uma ilha, uma gigantesca ilha perdida no meio do Mar Negro. Diversos eram os marinheiros que sabiam chegar até ela e maior ainda era a quantidade de aventureiros dispostos a irem até aquela ilha. Ainda assim, Galrasia era um mundo perdido. Perdida no tempo, pela existência de criaturas que há muito não existiam mais em outras partes do mundo. Perdida para a civilização, já que era um local inóspito, extremamente selvagem e perigoso. Perdida em si mesma, pois Galrasia continha mistérios ancestrais, muitos deles cujas respostas estariam para sempre perdidas.

Anix sabia, pelos seus estudos, que Galrasia possuía diversas ruínas de alguma civilização extinta há eras. Essas ruínas atraíam aventureiros em busca de riqueza e glória, mas, muito mais do que tesouros, elas guardavam perigos titânicos. Sabia também que, além dos aventureiros, piratas procuravam as riquezas da ilha, além de buscarem refúgio das autoridades do reinado naquela imensidão verde e isolada.

Legolas, por sua vez, comentou que ouvira dizer que a ilha era habitada por povos selvagens, bárbaros extremamente hostis, conhecidos por povos-trovão. Eram criaturas estranhas, que tinham semelhanças com dragões e outros monstros. Por esse motivo, os heróis decidiram que era melhor evitar o contato com esses povos.

Por fim, Nailo alertou-os dos perigos que a própria natureza escondia naquilo que muitos chamavam de Inferno Verde.

_ Tudo nessa ilha é maior. Maior e mais perigoso. Com certeza encontraremos animais muito maiores que os que estamos acostumados a ver. Serão criaturas bestiais, verdadeiros monstros atrozes. Devemos tomar cuidado, muito cuidado. Mesmo as plantas poderão ser perigosas aqui. Ervas venenosas, e mesmo animais, terão toxinas muito mais poderosas que qualquer outra já vista por nós. Vamos descansar aqui antes de entrarmos na mata. Quando estivermos totalmente restabelecidos, seguiremos adiante.

_ Bem, não sei quanto a vocês, mas eu estou com pressa – disse Legolas.

_ Vamos fazer o seguinte então. Vamos descansar por uns dez minutos e depois partiremos – disse Anix.

Todos concordaram com o mago. Tiraram seus equipamentos do barco e empilharam tudo na areia enquanto faziam uma refeição rápida. Os elfos conversavam entre si, decidindo qual direção tomariam a seguir.

_ Só há uma direção. É para frente que devemos ir – disse Legolas. – Vamos vasculhar essa selva inteira até encontrarmos aquele maldito do Zulil.

_ Mas isso aqui é enorme. Podemos passar a vida inteira aqui sem encontrá-lo. Precisamos escolher um caminho lógico, para não perdermos tempo – disse Anix.

_ Então escolham. Eu vou me lavar enquanto vocês pensam. Mas decidam logo, pois não podemos ficar aqui por muito tempo. Essa praia é uma área alagadiça e quando a maré subir tudo aqui ficará submerso. Olhem as raízes daquelas árvores e saberão que estou com a razão – Legolas apontou para as árvores além da praia, todas de raízes retorcidas e elevando-se acima do solo lamacento. Após isso, Legolas foi para o mar. Os demais voltaram a confabular.

Sem tem o que fazer e sentindo-se ainda não desejado no grupo, Orion decidiu ocupar seu tempo e sua mente enquanto os elfos faziam planos.

_ Anix. Poderia me emprestar algum livro seu sobre magia? Quero aprender um pouco e entender como vocês conseguem usar esses poderes, apenas por curiosidade – pediu o humano.

_ Você quer aprender magia? Isso é estranho! Não é você um guerreiro? Pois deveria ocupar-se então em treinar com sua espada e em aumentar sua força, não em estudar magia. O que você quer com isso? – perguntou Nailo.

_ Nada, apenas entender como isso funciona. É apenas curiosidade. Além do mais, a pessoa que vamos enfrentar é um mago, e se eu conhecer o funcionamento dos poderes dele, poderei combatê-lo melhor. Afinal, vocês sabem, conhecimento é poder – respondeu Orion.

_ Espere um pouco aqui, Orion! – pediu Anix. Chamou seus companheiros para a borda da mata, longe de Orion, e começou a conversar com eles falando o idioma dos elfos. – O que vocês acham desse Orion? Confiam nele?

_ Bem, ele tem nos ajudado até agora, mas é muito estranho tudo ao redor dele. Apareceu de repente em Ab’ Dendriel e depois em Malpetrim, sabendo tudo que nos acontecia, dizendo que o colar tinha dito a ele. Não sei o que fazer – disse Lucano.

_ Realmente é estranho – falou Nailo. – Mas ele está nos ajudando desde que nos encontrou pela primeira vez. E ele disse que a deusa dele apareceu para ele e mandou que ele nos ajudasse. Lembrem-se que nós mesmo já tivemos o privilégio de falar com três deuses e foi o próprio Oceano quem nos disse que poderíamos confiar no humano. Acho então que devemos dar uma chance a ele. Sei que não estamos mais no exército e que a única coisa que o liga a nós é sua própria vontade. Não temos obrigação nenhuma com ele, mas sinto que devemos lhe dar um voto de confiança.

Legolas já retornava da água, após se lavar e se vestir, e estava pronto para partir quando se aproximou dos companheiros. Então, uma voz soou em suas mentes, uma voz élfica, grave e imponente.

_ Atentai, ó filhos de Glórienn! – disse a voz, no idioma dos elfos.

_ Quem é? Quem disse isso? – perguntou Nailo, em sua própria língua, espantado.

_ Sou Dililiümi e estou falando diretamente em vossas mentes. Podeis falar comigo da mesma forma, pois posso ouvir vossos pensamentos. Atentai para o que tenho a dizer. Deveis confiar no humano e levá-lo convosco na perigosa jornada que se inicia. Enfrentareis grandes perigos e o humano poderá ser de grande ajuda quando o perigo surgir – disse a espada.

_ Nenhuma espada vai me dizer o que fazer! Não vou receber ordens de espada alguma! – ralhou Legolas.

_ Não se tratam de ordens, Legolas! Mas sim conselhos! – respondeu a espada.

_ Não preciso de seus conselhos! – E Legolas se afastou do grupo, procurando por um caminho entre as raízes das árvores.

_ Pois que seja – disse a espada, e o arqueiro não voltou a ouvir sua voz. – Como dizia, - continuou ela - deveis confiar no humano por ora, pois é prudente. Mas deveis ter cautela. Em quase mil anos de existência poucos foram os homens de valor que vi e em quem se podia confiar. Mas afirmo que, embora raros, eles existem. Esse humano que voz acompanha tem até agora demonstrado lealdade para com vós e pode ser que ele seja um destes raros dignos de serem chamados de amigo dos elfos. Entretanto deveis ter prudência, pois essa lealdade pode um dia findar. Ele busca o poder através do conhecimento, com ele próprio disseste, mas para qual propósito busca esse poder, isso vós não sabeis. Portanto vos aconselho, confiai em Orion, mas sejais prudentes.

_ Está certo, faremos isso, então – concordaram os elfos. – Dililiümi, conhece os caminhos nesta terra? Sabe qual direção deveríamos tomar? – perguntou Nailo.

_ Não! – respondeu a arma. – Embora tenha estado neste mundo por quase um milênio, nada sei sobre este lugar além do que vós sabeis. Um guia faz-se necessário neste momento, ou ao menos alguém versado nas histórias deste lugar ainda que superficialmente, ainda que conhecedor apenas de lendas, como um bardo.

_ É, não temos ninguém assim no grupo. Teremos que nos virar sozinhos mesmo. Obrigado! – disse Lucano.

A espada finalmente silenciou e os elfos voltaram para a praia, para onde Orion os observava e aguardava. Anix lhe falou com sinceridade e de modo amistoso, mas suas palavras eram duras mesmo assim.

_ Orion, conversamos a respeito e decidimos que não é o momento para isso. Você chegou há pouco tempo no grupo e, embora tenhamos ficado no mesmo forte por vários meses, ainda não nos sentimos totalmente seguros ao seu lado. Se desejar realmente aprender magia, conquiste primeiro nossa confiança e seu lugar no grupo com seus atos, e então eu poderei lhe ensinar. Além do mais, não podemos perder mais tempo.

_ Está certo. Entendo seu ponto de vista. Meus atos nessa jornada provarão meu valor. Até lá, aguardarei – respondeu o humano.

_ Bem, não temos tempo a perder, como disse o Anix. Vamos seguir em frente! – convocou Lucano.

_ Anix! Empreste-me essa vassoura! – gritou Legolas, saindo do emaranhado de raízes do mangue à frente. – Nailo, venha comigo!

Os dois montaram na vassoura mágica e decolaram, subindo muito, acima das copas das árvores. Só o que viam à frente era um verdadeiro mar verde de enormes árvores copadas e frondosas. Parecia não haver aberturas na densa vegetação que recobria Galrasia, a não ser por um único ponto, centenas de quilômetros à frente, onde um gigantesco pico se elevava solitário e imponente. Legolas sabia pelo que via que não deveria haver muitos acidentes geográficos, tais como montes, penhascos, planaltos, e outros, de modo que seria simples encontrar o desfiladeiro correto. Entretanto, encontrar qualquer coisa, mesmo um grande penhasco, naquele lugar imenso seria uma tarefa nada fácil. Nailo também atentava para outros perigos que o terreno poderia apresentar, como pântanos, onde a jornada poderia ficar ainda mais arriscada. Após alguns minutos de observação, os dois retornaram para o solo, trazendo as boas novas.

_ Encontramos um riacho não muito distante a oeste daqui. E acho que vimos um porto ou coisa parecida a leste. Este último está muito distante, a um dia daqui, creio eu, e parece estar deserto, ao menos sem pessoas como estamos acostumados a ver - disse Legolas, devolvendo a vassoura para Anix.

_ Vamos seguir pelo riacho, então. Ficaremos a um quilômetro dele, seguindo paralelo ao curso d’água. Lá poderemos ter acesso a alimentos e a água, e pode ser que encontremos algum povoado, seja hostil ou não. E, como os monstros da ilha devem procurar o rio por causa da água, manteremos uma distância segura dele – disse Nailo.

_ Mas como conseguiremos acompanhar o rio de uma distância tão grande, Nailo? – perguntou Anix. Mas, antes que a resposta pudesse ser dada, Orion se adiantou.

_ Que tal se formos até o riacho antes de decidir o que fazer? Eu levarei o nosso bote até lá e, caso o rio seja navegável, poderemos subi-lo de barco. O que acham?

_ Bem, se a ilha é infestada de criaturas gigantescas e perigosas, com certeza a água que corre através dela também será. Mas essa é uma boa idéia! Quando chegarmos ao rio decidiremos o que será melhor fazer – concluiu Nailo.

Assim o grupo seguiu pela costa lamacenta, até encontrarem areias brancas e o veio de água que corria silencioso cortando a praia e desaguando no grande mar. Uma hora havia se passado desde que haviam chegado à Galrasia e o sol alto anunciava que a manhã se aproximava do fim. O riacho era largo em sua foz, rasgando a praia e dividindo-se em cursos menores e ligeiros que tomavam uma vasta área da praia. Sua água era clara e cristalina, e podia ser bebida sem receio, como indicou Nailo. Não era profundo, alcançando com esforço os dois metros, como comprovaram os heróis.

_ Vamos subir pela água! – anunciou Nailo. – Eu irei dentro da água, empurrando o braço com todos vocês dentro. Dessa forma nossos remos não farão barulho e não chamarão a atenção dos monstros para nós. Só espero que nenhum deles esteja à espreita dentro do rio aguardando para me devorar. E desejo que encontremos alguma tribo ribeirinha e que seja uma tribo amistosa. Mas antes, vamos descansar um pouco aqui, à sombra das árvores. Essa caminhada me deixou exausto e esse calor está me matando.

_ Sim, eu também estou cansado – disse Lucano. – e esse calor que sentimos não é normal. Há algo mais nessa ilha, além do sol e do mormaço que a torna desse jeito. É como se existisse algum tipo de aura mágica nela, algum tipo de energia que emana calor, como se nos aproximássemos de uma fogueira. O estranho é que, de algum modo, isso me é familiar.

_ Bem, mais dez minutos então, pessoal! Depois prosseguiremos! – completou Anix.

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