fevereiro 23, 2006

Capítulo 168 - Defensor divino

Capítulo 168 Defensor divino

Ainda algemados, os prisioneiros se acomodaram numa carroça jaula, um pouco maior que aquela na qual haviam sido trazidos para Vallahim. Conduzidos através do portão do forte, os jovens atravessaram parte da cidade até parar diante de um majestoso palácio. Era um imenso prédio, construído de mármore branco e curiosamente simétrico. Na entrada havia dois enormes pilares um de cada lado da entrada, cuidadosamente alinhados e esculpidos com entalhes decorativos idênticos. Uma escada larga, de degraus muito grandes vinha do interior do prédio até a rua, bifurcando-se diante da entrada para formar duas escadas menores e totalmente iguais. Diante das escadas, duas estátuas de bronze com quase três metros de altura, representavam a figura de um homem imponente usando uma armadura de batalha e portando uma espada e um escudo de formato exótico. As estátuas tinham sido construídas como se uma fosse a imagem da outra refletida num espelho, para garantir a simetria das formas, o que revelava a natureza daquele lugar. Era um templo de Khalmyr, o deus da justiça e da ordem. Era naquele templo majestoso que eles seriam julgados.

Acorrentados uns nos outros, os jovens entraram no local sagrado em fila única. Cruzaram um gigantesco salão, de teto abobadado com fileiras de bancos de madeira à esquerda e à direita. Grandes vitrais ilustravam cenas da luta de Khalmyr contra outro deus, Zzssaas, o corruptor, e permitiam a entrada do sol que iluminava todo o lugar. Um grande altar de celebrações ficava ao fundo, num patamar mais elevado e separado dos bancos por um largo corredor que se estendia para a esquerda e para a direta, terminando em duas portas idênticas.

O grupo seguiu pela direita, atravessando a porta dupla de madeira que dava para um outro salão anexo. De forma semelhante ao salão anterior, vários bancos se enfileiravam pelo local, separados por um corredor central. Ao fundo existia um balcão de madeira alto, e outro um pouco menor à esquerda deste. Entre o balcão e os bancos havia um espaço de cerca de três metros, isolado dos assentos por uma grade baixa de madeira. À frente das grades, havia duas grandes mesas, rodeadas de cadeiras. À esquerda do balcão também existia uma outra área cercada. Com assentos de madeira alinhados um atrás do outro, que se tornavam mais altos à medida que se aproximavam da parede esquerda, formava algo como uma arquibancada, complementando o tribunal.

Havia várias pessoas no local. Alguns homens sentados nos bancos no meio do tribunal, um anão de barba branca trançada, cabelos longos e alvos e com o topo da cabeça calvo. Um homem de aspecto severo sentava-se solitário na mesa da esquerda, e nos bancos dos jurados haviam dois homens vestidos com armaduras brilhantes. Havia também outros homens em pé, soldados do exército, e todos os outros que não faziam parte do exército traziam consigo o símbolo de Khalmyr na forma de medalhões com a figura de uma balança com seus pratos equilibrados em uma espada.

O grupo sentou-se à mesa da direita, e o juiz, um sacerdote de Khalmyr, deu início à sessão.

_ Ao sétimo dia sob Weez, do ano de 1397, procedemos à abertura do processo de julgamento dos réus Legolas Greenleaf, Nailo Beliondil, Anix Remo, Squall Remo, Sairf Ridlav, Sam Rael e Lucano Lireian! – falou o juiz num tom quase gritado que preenchia o salão.

_ Os réus são acusados dos crimes de desacato à autoridade, formação de quadrilha, tentativa de homicídio, perturbação da paz pública, danos ao patrimônio público, resistência à prisão e finalmente, no caso específico do réu Legolas Greenleaf, homicídio qualificado, agravado por resultar na morte de um oficial do real exército de Tollon! – continuou o juiz.

_ Frente a todas essas acusações, o que os réus alegam? – perguntou o juiz, voltando o olhar para os prisioneiros.

Todos ficaram surpresos com a quantidade de acusações que pesavam sobre eles. Sabiam que grande parte de tudo aquilo era exagero, mas sabiam também que haviam abusado de seus poderes e cometido atos estúpidos, do mesmo tipo daqueles que no passado causaram as mortes de Sam e Loand. Apesar da situação difícil em que se encontravam, Legolas tomou a frente do grupo para fazer a defesa de seus amigos.

_Olha senhor juiz, eu sei que eu matei o cara no passado, e sou procurado por isso, mas meus amigos não tiveram nada com isso, e se a gente atacou os soldados agora, foi porque eles nos ameaçaram e.... – Legolas falava com insegurança e temor.

_ Silêncio no tribunal! – gritou o juiz, interrompendo o discurso de Legolas. – Eu acho que vocês não entenderam, por isso vou perguntar novamente! O que os réus alegam?

_ Bem, como eu estava dizendo, os soldados apontaram os arcos pra nós, nos ameaçando e... – continuou o arqueiro, sendo novamente interrompido.

_Silêncio! - gritou o anão, batendo com seu martelo de madeira sobre o balcão. - Meu jovem, venha cá! – disse acenando para Legolas.

O arqueiro se levantou para se aproximar da tribuna, mas como estava acorrentado aos seus companheiros, não podia se movimentar.

_ Ah! Está bem! Venham todos vocês até “agui”! – disse o juiz, aborrecido com a situação e se confundindo com as palavras.

O grupo se levantou e se aproximou do anão que os olhava com descaso. Quando estavam próximos o bastante, o juiz se curvou na direção deles e continuou.

_ Vejam bem! Isto aqui é um tribunal, e num tribunal existem certos “pocedimentos”...digo procedimentos legais que devem ser seguidos. Esta é a fase de abertura do processo, não é o julgamento ainda. Só o que eu estou perguntando é se vocês “alegram”...digo, se vocês alegam culpa ou inocência. Eu não quero saber o que vocês fizeram, quem são vocês, de onde vieram ou qualquer outra coisa! Só o que eu quero ouvir de vocês agora é uma resposta simples e direta: culpados ou inocentes! E não quero ouvir mais nenhuma outra palavra além de uma destas duas. Entenderam? – explicou pacientemente o juiz, novamente trocando as palavras, tornando aquele processo um pouco menos tenso e mais engraçado.

_ Entendemos! – responderam em coro os jovens.

_ Ótimo, então voltem aos seus lugares! – ordenou o juiz. Quando estavam todos de volta às suas posições, prosseguiu. – E então, “diande”...digo, diante de todas as acusações levantadas, o que os réus declaram???

_ Inocente! - respondeu Anix com tranqüilidade.

_ Inocente! - disse Nailo contrariado com toda aquela situação

_ Culpado! - disse Legolas, baixando sua cabeça, para surpresa de todos.

_ Inocente! - respondeu Sairf bufando.

_ Inocente! - disse Lucano segurando o riso por causa do problema de oratória do juiz.

­_ Inocente! – resmungou Squall.

_ Inocente, é claro! - sorriu Sam.

_ Sendo assim, daremos início ao julgamento dos réus num prazo de dez dias a contar da data presente, às dez horas da manhã do dia 17 de Weez de 1397. Vocês tem alguém para defendê-los? – prosseguiu o magistrado.

_ Não senhor juiz, não temos! E onde estão nossos animais e nosso amigo Nevan, um que estava machucado quando os soldados nos prend... – disse Anix, sendo interrompido pelas marteladas do anão.

_ Silêncio! Eu só perguntei se vocês tinham alguém para defendê-los, não sobre seus animais e amigos. Os soldados responderão essas perguntas a vocês depois! Esse assunto não me interessa! – vociferou o juiz, irritado, espancando a tribuna com seu martelo e fazendo com que Anix quase enfartasse de susto. – Bem, como vocês não têm nenhum defensor, eu nomearei um defensor “plúblico”...digo, público para vocês! – prosseguiu.

_ Mas o defensor tem que ser um elfo! – pediu Legolas, interrompendo o anão.

_ Silêncio! – mais marteladas no balcão. – Vocês serão defendidos por um servo de Khalmyr e, não importa a qual raça ele pertença, vocês terão uma defesa e um julgamento justo conforme nos ensinou o deus da justiça! Não haverá nenhum tipo de preconceito racial aqui neste “tibunal”...digo, tribunal! Podem estar certos disso!

­_ Bem, como eu estava dizendo, já que vocês não têm nenhum defensor particular, eu nomeio como defensor para o caso de vocês... – o juiz já estava prestes a bater o martelo uma última vez e dizer o nome daquele que defenderia os heróis, mas foi interrompido quando as portas do tribunal se abriram bruscamente e dois homens invadiram o ambiente.

Os dois entraram no tribunal, sem se importar com as “marletadas”...digo, marteladas e os gritos enlouquecidos do pequeno juiz de fala engraçada. Eram dois guerreiros robustos, vestidos com armaduras de batalha douradas e que carregavam em seus peitos o brasão de Khalmyr. Um deles, um humano, trazia em seu cinto uma grande espada e caminhava à frente com segurança e imponência. O outro, também um humano, mas de pele parda e brilhante como se fosse feita do próprio bronze, carregava um enorme machado em suas costas. A luz do sol penetrava pela porta, ofuscando os presente e escondendo a identidade dos dois que chegavam. Quando estavam próximos, o líder dos dois se dirigiu ao juiz.

_ Eles têm um defensor sim! Eu os defenderei, em nome da justiça de Khalmyr! – disse com uma voz firme e grave.

_ E quem é você que invade meu tribunal assim? – indagou o juiz.

_ Sou Yczar Artorion, paladino do grande deus da justiça de da ordem, Khalmyr! – respondeu o homem, sorrindo para seus velhos amigos que balançavam suas cabeça positivamente para o juiz.

_ E eu sou Batloc! Paladino de Khalmyr! – completou o outro homem.

_ Então, pelo poder a mim concedido eu nomeio com defensor dos réus, o paladino de Khalmyr, Yczar Artorion! – e bateu mais uma vez na tribuna, encerrando a sessão e retirando-se do recinto.

O destino daqueles jovens seria decidido num prazo de dez dias. Não sabiam qual seria o resultado de todo aquele processo, se seriam condenados ou absolvidos. Mas, com a presença de Batloc e Yczar, os jovens tinham suas esperanças renovadas e podiam voltar a sonhar com a liberdade.

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