outubro 03, 2006

Capítulo 240 – Morte nas chamas

Capítulo 240 Morte nas chamas

Assim, na manhã de um kalag, dia 24 de pace, eles entraram na vila de Rutorn. Os moradores os receberam com festa, agradecendo pelo bem que haviam feito. A vila já havia retomado sua rotina normal, e a Morta do Bosque não havia retornado mais, comprovando as suspeitas de Mepisto, de que Zenóbia e a Morta eram a mesma pessoa.

O grupo seguiu direto para a taverna do Ogro Roxo, escoltado pelos aldeões sorridentes. Anix desceu da carroça que conduzia e pediu ajuda a alguns moradores para descarregar os mantimentos e o rum que eles haviam trazido para Tomas. Mepisto foi dispensado pelo sargento e correu para sua casa, para rever seu ratinho de estimação. Para sua felicidade, encontrou-o são e salvo, dentro de sua pequena gaiola.

Já dentro da taverna, Tomas agradecia emocionadamente pela ajuda recebida. Enquanto Anix conversava com Tomas, e os demais se encarregavam de descarregar os mantimentos, Jack levou a jovem Silmara para fora da taverna.

_ Aqui está ela Lars! – disse o soldado.

_ Muito bem, Jack! Deixe-me examiná-la! O que aconteceu com você minha jovem? – respondeu o capitão, levando as mãos ao rosto da donzela.

_ Uma bruxa arrancou meus olhos, gentil senhor! – respondeu ela.

_ Bem, tire essa jóia de seu olho, para que eu possa ajudá-la! – disse o clérigo, delicadamente.

Silmara retirou, cuidadosamente, a pedra que ocupava o lugar de seu olho direito e a entregou para Jack. O pirata pegou a jóia com sua mão direita e a guardou em um bolso. Lars colocou sua mão direita sobre os olhos vazios de Silmara e orou a seu deus:

_ Ó gloriosa fênix! Opere vosso milagre através deste vosso servo!

Lars se afastou de Silmara. Ansioso, Jack pediu a ela que abrisse os olhos e ela o fez. E suas cavidades permaneciam vazias.

_ Bom, ao menos nós tentamos! – suspirou o pirata, entristecido.

_ Calma meu bom Jack! Não há mal que não possa ser desfeito, e não há pessoa que não mereça uma segunda chance! Tenha um pouco de paciência! E fé,meu caro, tenha fé! – Lars pousou sua mão gentilmente sobre o ombro de Jack, tentando confortá-lo. Os dois ficaram observando a moça, ansiosos, até que o milagre começou.

Primeiro uma pequena esfera azulada surgiu lá dentro. Ao redor dela, começou a se formar uma massa de carne, repleta de vasos sangüíneos pulsantes, que iam aos poucos se fixando no interior das cavidades oculares da jovem. Aquilo foi aumentando de tamanho e cobrindo toda a área antes vazia, até que dois belos olhos azuis se formaram, e Silmara enfim pode enxergar novamente.

_ Estou vendo Jack! Estou vendo! É um milagre! Pelos deuses! Obrigada, gentil senhor! Obrigada! – Silmara abraçou Lars, lágrimas escorriam de seus novos e belos olhos.

_ Não me agradeça, minha jovem! Agradeça ao grande Thyatis, por ter lhe concedido esta graça! E claro, agradeça ao Jack, que teve a idéia de me procurar e pedir ajuda! – respondeu o sacerdote.

Silmara agradeceu ao deus da ressurreição e deu um longo e açucarado beijo no soldado. Após o beijo, Jack entrou na taverna, logo após Lars, anunciando a novidade a plenos pulmões. Silmara ficou do lado de fora, apreciando a beleza da manhã com seus novos olhos. Na taverna, todos comemoraram a notícia, emocionados.

_ Bem, capitão Lars! Acho que nós cumprimos nossa missão aqui! Podemos ir embora já, mas eu sugiro almoçarmos aqui na taverna do senhor Tomas! O que o senhor me diz? – disse Anix.

_ Está certo, chame os homens! Almoçaremos aqui e partiremos à tarde! – respondeu o clérigo.

Enquanto eles se preparavam para almoçar, Jack voltou a infernizar a vida de Anix, imitando a voz de Seelan. O mago se descabelava de ódio, ao mesmo tempo em que o pirata se deleitava com a irritação do sargento.

_ Aniiiix!!! Aniiiix!!! – gritava Jack, insistentemente.

_ Ah! Droga! Já não agüento mais isso! Capitão Lars, dê um jeito nesse cara, por favor! – implorou Anix.

_ Ora, Anix! Use seu poder! Você está acima dele na hierarquia! – respondeu Lars, sorrindo.

_ Mas não adianta, ele não me obedece! Eu já não sei mais o que fazer! – disse o mago.

_ Está bem! Deixe comigo! Soldado Jack! Pare com isso imediatamente! E como punição, pode pagar quinze! – Lars quase não continha o riso. Sentia-se como um pai apartando a briga de suas crianças.

_ Sim senhor! Está bem capitão! Aqui estão, quinze tibares! – Jack interrompeu seu gracejo imediatamente, e entregou quinze moedas ao capitão.

_ Há! Há! Há! Não é disso que eu estou falando soldado Jack! Pague quinze flexões e pare de atormentar seu sargento! – disse Lars.

Jack, mesmo contrariado, guardou as moedas e se abaixou. Começou a fazer as flexões de braço como ordenado pelo clérigo. Enquanto pagava a punição, o pirata resmungava, contrariado com o tratamento que recebia.

_ Isso não é certo! Eu era um capitão, e tinha meu próprio navio! Agora tenho que ficar aqui beijando o chão por causa de um maricas! – reclamava Jack.

_ Maricas? Eu não sou maricas! Peça desculpas agora soldado! – enfureceu-se Anix, ao ser ofendido.

_ Não, calma sargento! Não estava falando de você, mas sim do seu namorado, o Seelan! – continuou Jack, ainda rindo do mago.

Anix não suportou mais e desferiu um pontapé em Jack. O pirata levantou-se cheio de cólera e com a boca sangrando, sacou rapidamente a besta que trazia na cintura e disparou-a em Anix. A situação começava a sair de controle, Anix tinha um virote fincado no rosto e preparava-se para fulminar Jack e toda a taverna com sua magia mais poderosa. Jack sacou seu florete e começou a provocar o mago, ameaçando-o com a arma. Dragnus preparava seu machado, pronto para partir ao meio um dos dois que brigavam, Lee Wood armava seus punhos, pronto para defender seu superior, e Dragnus se afastava da confusão, ignorando tudo e todos.

_ Capitão, tire todos da taverna! Eu vou matar ele! – gritava Anix.

_ Pode vir! Vem, sua bicha! Eu vou varar suas tripas, seu mariquinha! – provocava Jack.

_ Calma, rapazes! Não há necessidade disso, fiquem calminhos! – Lars entrou no meio da confusão, colocando-se entre os dois e murmurou uma prece. Uma aura de paz inundou o lugar, e todos ficaram mais calmos. Jack abaixou sua arma e interrompeu os insultos. Lars ordenou aos soldados que o capturassem e o amarrassem. Dragnus e Lee tiraram as armas e a mochila do pirata, e amarraram seus braços para trás com uma corda grossa. Levaram-no para a carroça e o colocaram deitado no assoalho do veículo. Como Jack não parava de reclamar e xingar a todos, Dragnus o amordaçou. Mesmo assim, o pirata esperneava e tentava falar amordaçado.

_ Mas você não tem jeito mesmo, não é senhor Jack? Bom, já que é assim, durma então! – Lars entrou na carroça, os outros já tinham voltado para a taverna. Tentou conversar com o pirata e acalmá-lo. Vendo que era impossível tranqüilizá-lo, Lars sussurrou uma palavra mágica em voz baixa e estalou os dedos. O anel em sua mão brilhou palidamente, e Jack caiu em um profundo sono. Lars retirou de sua bolsa alguns frascos contendo variados tipos de pó. Misturou o conteúdo de alguns deles em sua mão e começou a traçar um símbolo no chão, enquanto murmurava uma prece a seu deus. Quanto terminou o trabalho, arrastou o corpo adormecido do pirata para cima do símbolo, ocultando-o. Depois, ele deixou a carroça e foi para a taverna. No meio do caminho, encontrou Silmara, aflita.

_ Gentil senhor! O que será de Jack! O que vão fazer com ele? Não lhe façam mal, por favor, eu imploro! – choramingava a moça.

_ Ora, não se preocupe minha jovem! Somos soldados, não um bando de kobolds selvagens! Não vai acontecer nada a ele! Jack apenas ficará alguns dias detido na prisão do forte! O que ele fez foi grave! Podia ter matado o Anix! Ele deve pagar pelo erro que cometeu! Mas não se preocupe! Não há mal que não seja desfeito, e não há pessoa que não mereça uma segunda chance! Depois do castigo ele poderá voltar aqui para visitá-la muitas vezes! Eu percebi que vocês nutrem um sentimento mútuo, e gostei muito disso! Portanto, fique despreocupada, ele voltará para vê-la em breve! – disse Lars, com sua voz altiva e confiante, acalmando a donzela. O clérigo a deixou lá fora, observando seu amado pirata, e foi para dentro da taverna.

Anix aconselhava Tomas a não deixar sua neta se envolver com pessoas como Jack. O velho taverneiro, por sua vez, concordava com o mago e se comprometia a conversar com a jovem. Tomas serviu aos soldados uma saborosa refeição, e todos comeram, felizes e tranqüilos. Já no início da tarde, o grupo partiu de Rutorn, recebendo uma despedida calorosa e emocionada dos moradores. Silmara acenava com um lenço branco que usava para enxugar suas lágrimas. Seus olhos azuis se destacavam na multidão, e suas lágrimas pareciam expressar uma enorme tristeza, como se aquela fosse a última vez que ela os via. Ou, como se aquela fosse a última vez que ela via seu amado Jack.

A noite caiu, e os soldados resolveram parar para acampar. Pararam a carroça ao lado da estrada, numa pequena clareira, apearam e começaram a preparar uma fogueira e seus sacos de dormir.

_ Capitão Lars! Não seria melhor acordarmos o Jack e dar comida a ele? – perguntou Anix.

_ Claro que sim, Anix! Soldado, vá até a carroça e acorde o Jack, e dê-lhe um pouco de ração! – respondeu Lars, ordenando a Lee a missão.

Lee Wood mal se virou para se dirigir até a carroça, quando todos ouviram um som de pancada forte. Olhara para a carroça e viram Jack saltando de lá de dentro e correndo em direção à mata fechada com o corpo arqueado e as mãos amarradas nas costas.

_ Ele está fugindo! Peguem-no! – ordenou Lars.

Os soldados saíram pela mata escura, perseguindo o soldado fugitivo. Dragnus levava seu machado, pronto para arrancar a cabeça do pirata. Como ele era o único capaz de enxergar naquela escuridão, ia bem à frente dos outros. Necro vinha mais atrás, tentando atingir Jack com suas magias. Mas, mesmo sem ver para onde ia, e trombando várias vezes nas árvores à frente, o pirata era extremamente furtivo e conseguia escapar dos ataques do mago. Lee Wood vinha logo em seguida, acendendo uma tocha para poder iluminar o caminho dos soldados. Por fim veio o capitão Lars. Caminhando calmamente, Lars evocou o poder de seu deus e atingiu Jack com uma magia. O pirata conseguiu resistir ao efeito do feitiço, que deveria deixá-lo cego, e seguiu em sua fuga desesperada pela mata. Sem outra opção, Lars decidiu apelar.

_ Que as chamas de Thyatis se espalhem pela noite e formem uma barreira! – o clérigo orou ao seu deus, e uma enorme parede de fogo se formou no meio da mata, muitos metros à frente, clareando a noite com suas chamas ardentes. Tinha quase cem metros de comprimento e cerca de dez de altura. Jack estava a uns dez metros dela, mas mesmo assim podia sentir o calor intenso que emanava da muralha de fogo. – Jack! É melhor se entregar! Você não tem saída! Está cercado, entregue-se agora! E nem pense em tentar atravessar a muralha, pois você não conseguirá! Se tentar, morrerá! É melhor se entregar e continuar vivo! – completou o clérigo.

Mas, Jack não estava disposto a se render. Sabia que seria levado ao forte e que seria punido lá. Sua única chance era conseguir fugir dali, escapar dos soldados e retornar para seu adorado oceano. O pirata passou as mãos por baixo das pernas, levando-as à frente do corpo e retirou a mordaça da boca. O ruído produzido atraiu a atenção de Dragnus. O meio-orc se aproximou lentamente, tentando encontrar o pirata. Jack prendeu a respiração e se encolheu atrás de uma árvore, esperando não ser visto.

_ Ele sumiu, capitão! – gritou o meio-orc.

Jack suspirou aliviado e começou a circundar a árvore para se afastar dali. Mas, ele não sabia que Dragnus mentia, apenas para atingi-lo de surpresa com seu machado. Jack se abaixou, e tentou desamarrar seus braços. Foi sua sorte, no exato momento em que ele abaixou, o machado de Dragnus atingiu a árvore com violência, bem no local onde estaria o seu pescoço.

Dragnus ficou confuso, ao notar que seu machado havia errado o alvo. Jack, furtivamente, se esgueirou ao redor da árvore, escapando do ângulo de visão do bárbaro. Dragnus deu alguns passos à frente e começou a procurar pelo fugitivo. Quando virou para trás, viu Jack agachado ao lado da árvore. Mas, já era tarde demais. Habilmente, o pirata se levantou num salto e bateu os dois pés no peito de Dragnus, pegando impulso. O bárbaro ainda tentou atingi-lo com seu machado, mas Jack foi mais rápido e saltou para trás, dando uma cambalhota no ar e escapando do ataque. De ponta cabeça, Jack abriu as pernas e tentou agarrar a árvore com elas. Mas, ao invés disso, o pirata se chocou violentamente com o pinheiro e caiu no chão, aos pés de Dragnus.

O bárbaro sorriu com maldade para o pirata caído e ergueu seu machado, gritando furiosamente e o atacou. O machado abriu o peito de Jack, espalhando o sangue do pirata por todos os lados. Mao Necro, que estava próximo, usou uma mão mágica criada por ele para tocar em Jack e descarregar uma poderosa magia nele. Jack ficou ofegante, tanto pelo grave ferimento, quanto pelo poder do feitiço de Necro.

_ Jack! Está cercado! Entregue-se! Não tem pra onde fugir! – gritou Lars, chegando mais perto da batalha. Ignorando toda aquela confusão, Anix voltou para dentro da carroça, de onde observava a perseguição.

_ Vocês não vão me prender de novo, Lars! O capitão Jack não será capturado desta vez! – e dizendo isso, Jack se levantou e saiu correndo, na direção das chamas.

Lars tentou convencê-lo a se entregar, mas não conseguiu. Dragnus tentou derrubar o pirata com seu machado, mas não conseguiu. Jack correu e saltou na muralha de fogo, tentando atravessá-la. Mas não conseguiu. O corpo do corsário desapareceu no meio das chamas, sendo consumido por elas. Uma fração de segundo depois, e as chamas se extinguiram magicamente.

_ Nãããão!!! Não me abandone meu senhor!!! Jack...por que? Por que? – Lars se atirou de joelhos no chão, chorando. Estava em desespero. Aquele homem outrora tão sábio e confiante, agora parecia uma criança assustada. A metros dali, a tocha de Lee Wood iluminou algo, onde antes estava a parede de chamas, o corpo carbonizado de Jack. Seus dias como pirata tinham chegado ao fim, Jack estava morto.

setembro 26, 2006

Capítulo 239 – Retorno

Capítulo 239 Retorno

Enquanto os soldados amarravam Mepisto, Anix foi vasculhar o covil da bruxa. Sobre uma mesa havia o corpo de um homem morto, provavelmente um aventureiro que havia sido vítima da emboscada de Zenóbia antes dos heróis. Junto ao seu corpo, além de suas armas e armaduras, havia uma bolsa de couro, uma caixa de madeira trancada com um cadeado enferrujado, e alguns pergaminhos que pertenciam à feiticeira. Depois Anix foi até o corpo da bruxa e, com a ajuda de Jack, decapitou-a, guardando a sua cabeça enrolada num pedaço de pano. Enquanto ajudava seu comandante, Jack notou que havia dois anéis brilhantes na mão de Zenóbia. Furtivamente, o pirata recolheu os anéis e os escondeu. Depois, derramou com pesar um pouco de rum sobre o cadáver decapitado e ateou fogo na velha bruxa.

Os heróis retornaram para Rutorn em segundos, com a ajuda da magia de teletransporte de Anix. Lá reuniram todos os moradores na taverna para contar sobre a presença da bruxa e dizer-lhes que ao menos um dos problemas da vila, um que eles sequer desconfiavam que existia, estava solucionado. Ainda faltava a Morta do Bosque.

Mas, Mepisto sugeriu que talvez a própria bruxa estivesse se disfarçando de Morta para enganar os aldeões. Zenóbia não se parecia nem um pouco com a descrição dada pelos aldeões, mas então, Silmara entrou na taverna, no momento em que Anix mostrava a todos a cabeça arrancada da bruxa. A jovem deu um grito.

_ É ela! Essa é a Morta que arrancou meus olhos! Eu me lembro bem dela, desses cabelos verdes! Foi ela! Ela é a Morta! – disse a jovem, apontando para a cabeça na mão de Anix.

_ Como você pode saber? Você não é cega, Silmara? – perguntou um dos moradores.

_ Sim, mas graças a esse gentil senhor, eu voltei a enxergar com isto aqui! – respondeu ela, apontando para Jack e depois para o próprio rosto.

Silmara estava usando uma gema azul no lugar do olho direito. Era a mesma jóia que Zenóbia usava como olho, e que havia sido pega pelo pirata. Enquanto todos prestavam atenção em Anix dentro da taverna, Jack presenteou Silmara com a pedra, dando a ela a chance de poder enxergar novamente. De posse de seu novo olho mágico, a garota reconheceu o rosto de Zenóbia como a criatura que havia lhe arrancado os olhos. Agora não restavam mais dúvidas. Se era verdade que a Morta do Bosque arrancava os olhos dos animais e já que Zenóbia havia feito o mesmo com Silmara, então provavelmente ela e a Morta deveriam ser a mesma pessoa. E com a morte da bruxa pelas mãos dos soldados, a vila de Rutorn poderia finalmente ficar em paz.

Como oficial responsável pelo caso, Anix tratou de explicar aos moradores da vila toda aquela intrincada trama. Tranqüilizou-os, dizendo que agora não correriam mais perigo. E assim, o pequeno povoado pode enfim retomar a sua vida normal. Os heróis se alojaram na casa de Tomas, a Taverna do Ogro Roxo e descansaram seus corpos para retornarem ao forte do dia seguinte.

Na manhã seguinte, o grupo se levantou por volta das 10:00 horas. Tomas e Silmara serviram-lhes um delicioso café da manhã, com frutas, pães e vinho. Enquanto seus amigos comiam, Jack levou a moça novamente para fora da taverna, onde ficaram conversando por longos minutos. Jack parecia um adolescente, estava inseguro e ansioso. Já Silmara era o mais perfeito retrato da alegria. Ter novamente a capacidade de enxergar, ainda que através da misteriosa gema de Zenóbia, era uma verdadeira bênção. Enquanto conversava com ela, o pirata aproveitou um momento de distração de Silmara e lhe roubou um beijo. Jack contraiu os músculos do rosto, esperando pelo costumeiro tapa, como sempre acontecia. Mas, foi surpreendido quando a moça retribuiu o gesto do pirata com um novo e apaixonado beijo.

Os heróis despediram-se dos novos amigos e receberam sua gratidão. Jack e Silmara trocaram juras de amor, e o grupo de soldados finalmente deixou o vilarejo de Rutorn para trás. A missão havia sido cumprida. A vila estava novamente segura, e os jovens recrutas agora contavam com novas e importantes experiências em seus currículos. Junto com eles, ia Mepisto, acusado de tentativa de roubo, e de resistir à prisão. O caçador estava revoltado com sua condição e a todo o momento ofendia os oficiais com palavras e gestos de baixo calão. Quando já estavam longe da vila, cavalgando entre as vastas florestas de Tollon, Jack novamente imitou a voz de Seelan, tirando o sossego de seu sargento.

_ Ah, droga! Parece que aquele afeminado tá me perseguindo! Maldito! – praguejou Anix. Os outros sorriram, disfarçadamente.

Três dias se passaram desde a partida de Rutorn. Já no final da manhã do dia 17 de pace, um kalag, o pelotão finalmente alcançou os portões do forte Rodick. As sentinelas brincaram com o sargento Anix, fingindo que não o reconheciam. Após a brincadeira, abriram os pesados portões e deram passagem para os soldados. Anix dispensou seus soldados, que correram para a taverna do forte, e se dirigiu até o alojamento dos oficiais, onde iria relatar todos os eventos ocorridos em Rutorn. Junto com ele estava Mepisto, ainda amarrado e reclamando. Enquanto caminhava na direção do prédio, Anix viu seu irmão, Squall, saindo de lá de dentro, um tanto irritado.

_ Mas que ele é, é! Isso eu tenho certeza! – resmungou o feiticeiro, saindo da casa sem ao menos notar a presença de seu irmão. Squall tinha ido conversar com Glorin, sobre o misterioso Segê.

_ Capitão! Quem é o Segê? Ele é um dragão, não é? Pode falar, eu já sei! – perguntou o feiticeiro.

­_ Ora moleque! Não me amole! Não vê que estou ocupado com meu amigo aqui?­ – respondeu o anão, abraçando um barril de cerveja.

_ Não me enrola não, capitão! Eu sei muito bem que o Segê é um dragão! Senão, por que ele teria ficado tão nervoso quando descobriu que eu tenho sangue de dragão! Eu sei muito bem que os dragões não gostam de outros dragões! Vamos capitão, responda!

_ Ah! Não me encha, garoto! Você está delirando! De onde tirou uma asneira dessa! Acho que você andou tomando cerveja demais!

_ Não tente mudar de assunto não, capitão! Se o senhor não quiser falar, tudo bem, mas eu já sei de toda a verdade! Além do mais, eu acho que o arco do Legolas era dele! A Escamas da Noite disse que tinha tirado aquele arco de um dragão branco, e o senhor ficou todo espantado quando viu o arco do Legolas pela primeira vez! Não tem como me enganar, capitão! É melhor confessar logo!

_ Rere! Pois é garoto! Você descobriu meu segredo! Agora terei que te matar por isso! - o anão acionou sua espada elétrica e avançou pra cima do elfo. Squall fechou os olhos, assustado. Pensou que era seu fim. O anão deu um sorriso sarcástico, desativou a magia de sua espada e continuou. - Ora, não me amole! E fique longe da cerveja! Você está mais bêbado do que eu pensei! Nunca ouvi tanta besteira vinda da boca de um único elfo!

­_ Não vai contar né? Tudo bem! Mas eu ainda vou fazer o senhor falar a verdade! – Squall saiu, deixando o anão sozinho. Quando estava do lado de fora da casa, deu meia-volta e retornou para dentro. – Chega de enrolação, capitão! Conta logo tudo pra mim! Fala quem é o Segê, e conta como vocês se conheceram!

Squall foi atingido em cheio na cabeça pela caneca de cerveja de Glorin. O feiticeiro se zangou e ameaçou destruir a caneca, mas foi impedido pelo anão.

_ Devolva minha caneca logo, garoto! E pare de me atormentar! – pediu o anão.

_ Toma sua caneca! Mas conta a verdade pra mim! Cada segredo que o senhor me contar, eu lhe pago um barril de cerveja!

_ Feito, moleque! O Seelan não é veado coisa nenhuma! Ele faz aquilo pra enganar os novatos todas as vezes! Agora vai buscar o barril que esse aqui tá acabando!

_ Não era isso que eu queria saber! Aliás eu já sabia disso! Eu quero saber sobre o Segê!!! O senhor tem que me contar! Não se esqueça que eu o ajudei no castelo! Lembre-se que fui eu quem descobriu como a sua espada e o seu escudo funcionam!

_ Tá certo, você tem razão! Já que é assim, vou lhe dar um conselho! Pare por ai! Não cave muito mais fundo, ou você não poderá sair do buraco que cavou! Para seu próprio bem, esqueça esse assunto! Lembre-se o que eu lhe disse sobre o Segê! Ele é muito poderoso! E não gosta que fiquem bisbilhotando na vida dele! Agora, esqueça isso e vá caçar alguma coisa útil pra fazer! – concluiu o anão. Sua expressão era séria e sua voz grave e sombria.

Squall se deu por vencido e saiu do alojamento do capitão ainda resmungando. Sem nem se dar conta da presença de seu irmão que acabava de chegar, Squall foi para seu quarto, enxugar a cerveja de seu corpo. Anix entrou logo em seguida, junto com Mepisto.

_ Olá capitão! Já estamos de volta! – anunciou o mago, orgulhoso.

_ Ai não! Outro elfo! Espera ai que agora estou ocupado! – resmungou Glorin, enchendo novamente a caneca com cerveja. Tomou todo o líquido dum gole só e continuou. – Pronto! Terminei! Pode falar agora!

Anix entregou ao anão um relatório escrito por ele, contando sobre a briga de Mao Necro e Dragnus. O anão leu todo o pergaminho, e depois pediu a Anix que lhe explicasse com detalhes o que tinha acontecido. O mago contou calmamente tudo que havia ocorrido em Rutorn, inclusive sobre a luta com a bruxa Zenóbia. O anão observava, calado, e coçava a barba, pensativo. Seus olhos estavam semicerrados, como se estivesse com sono. Ou, muito embriagado.

_ Está certo! Depois iremos falar com esses brigões e dar a devida punição a eles! Agora, diga-me! Quem é esse ai com você? – disse o anão.

_ Esse é Mepisto! Ele nos ajudou a lutar contra a bruxa! Ele mora em Rutorn! Eu o trouxe comigo assim porque ele é suspeito de tentar roubar minhas coisas! – explicou o elfo.

_ Eu não roubei nada! Sou inocente! Eu apenas queria te dar uma poção mágica! Você estava caído, quase morrendo, e vocês falaram que aquelas tais poções podiam curar! Então, eu só queria te ajudar com uma delas! Só por isso mexi nas suas coisas! – gritou Mepisto, irritado com a acusação.

_ Vamos com calma garotos! Então quer dizer que o poderoso sargento Anix foi a nocaute! Há! Há! Há! Há! Mas que vexame! Você era o mais forte do pelotão e, ao invés de proteger os mais fracos, teve que ser protegido por eles! Há! Há! Há! Elfos...!!! – Glorin zombou de Anix, rindo de seu infortúnio, sem no entanto lembrar que ele próprio já havia passado por situação semelhante.

_ É, eu quase morri! Mas foi pra ajudar os recrutas! Eles estavam muito fracos, e eu tive que tomar a linha de frente pra que eles não morressem! Se fosse algum deles no meu lugar, a essa altura já estaria morto! – respondeu Anix, zangado.

_ Bom! Deixa isso pra lá! Agora me conte exatamente o que aconteceu! – ordenou o anão.

Anix contou tudo o que havia acontecido, que Mepisto havia ajudado o grupo, que fora acusado de tentativa de roubo pelos soldados e que resistira à prisão. A todo instante, Mepisto o interrompia, desmentindo-o e ofendendo-o. Glorin o repreendeu, dizendo que ele teria a chance de se defender. Mas, como Mepisto ignorou o capitão, Glorin sacou sua espada, e a cada interrupção de Mepisto, ele golpeava a cabeça do caçador com a lateral da lâmina como punição. Mepisto passou então a ofender Glorin, que não se intimidou e continuou batendo a cada xingamento, até que Mepisto caiu desmaiado.

_ Moleque insolente! Humanos...!!! Vamos, Anix! Vamos trancar esse cara numa cela até ele esfriar a cabeça...e acordar! Ai a gente resolve o que fazer com ele! – disse Glorin.

Os dois saíram e foram até a prisão do forte, onde deixaram Mepisto, trancado numa cela. Enquanto os dois se afastavam, Anix convidou o capitão para um drinque na taverna, e prometeu que tentaria tomar cerveja junto com o anão. Feliz, o guerreiro comemorou por poder tomar mais uma cerveja de graça. De repente, a conversa amigável dos dois foi interrompida por gritos.

_ Aniiiix!!! Aniiiix!!! Você voltou, amiguinho! Que bom, eu já estava com saudades! – era Seelan. O elfo veio correndo, acenando com a mão freneticamente, e saltou no pescoço de Anix, abraçando-o.

_ Para com isso Seelan! Me solta! Socorro, capitão Glorin! Me ajude! – gritou Anix, tentando se livrar de Seelan.

_ Não vou me meter nisso não! Isso é coisa de elfos! Vou deixar vocês dois a sós! Encontro você na taverna, Anix! Se vira, garoto! – Glorin saiu dando passos tortos e fartas risadas.

Jack, que estava próximo dali, viu tudo e se aproximou, divertindo-se com a situação humilhante de seu sargento.

_ Ae, sargento! Mandou bem! Ah! Desculpe pelas brincadeiras! – disse o pirata, rindo do seu superior.

_ Droga, do que você tá falando Jack? Que brincadeiras?

_ Dessa aqui! Aniiiix!!! Aniiiix!!! – o soldado imitou Seelan, desta vez sem se esconder do sargento.

_ Nossa! Ele tá me imitando direitinho! E até que ele é bem bonitinho! Vem aqui amiguinho! – e com um movimento rápido, Seelan agarrou Jack também.

Jack esperneou e bateu, até que Seelan finalmente o soltou. O pirata saiu correndo, afastando-se dos dois rapidamente. Seelan continuava agarrado a Anix.

_ Olhe Anix! Até que ele tem um belo bumbum! Não acha? – disse Seelan.

_ Af...!!! Me larga Sélan! Por acaso você gosta de homens, é? – reclamou Anix.

_ Claro que não, amiguinho! Não gosto de homens nem de anões! Eu gosto mesmo é de elfos! E meu nome é Seelan! Seelan!

_ Ai, droga, mas é uma bicha mesmo! Olha aqui Seelan! Se você gosta de elfos, eu não tenho nada com isso, eu não gosto! Eu gosto é da Enola! Eu a amo e nós vamos nos casar um dia! – gritou Anix, empurrando Seelan para longe dele.

_ Ah! Não tem problema! Eu não sou ciumento! – sorriu Seelan.

Anix se afastou dele, indo na direção da taverna. Seelan acenada com delicadeza, prometendo se encontrar com ele mais tarde, no laboratório. Anix foi até a taverna para beber um pouco e se acalmar. Todos os seus amigos já estavam lá, inclusive Glorin, que esperava ansioso por aquele que lhe pagaria mais uma cerveja. Todos menos Legolas, que ainda não tinha voltado de sua missão com seu pelotão. Anix tomou cerveja junto com seu capitão, mas reclamou do gosto da bebida. Glorin, mais uma vez, zombou da masculinidade dos elfos e riu.

O dia passou, e quando a tarde caiu, Glorin reuniu os outros oficiais, o grupo de Anix e Mepisto para interrogá-los. Lars Sween lançou sobre todos eles uma magia que os impediria de mentir, e assim, todos foram obrigados a contar a verdade sobre o que tinha acontecido em Rutorn.

Ficou decidido que Mepisto era inocente da acusação de roubo. Entretanto, ele ficaria por três dias preso no forte, por ter desacato à autoridade. As ofensas proferidas contra Anix e Glorin, por fim, não passaram em branco. Quanto aos demais, foram condenados a passar uma semana realizando trabalhos pesados no forte. Contra os soldados pesou a acusação de indisciplina, tanto pela briga de Necro e Dragnus, quanto pelo fato de eles não terem curado Anix, quando este estava caído, para ficar cantando e dançando, enquanto Mepisto tentava curar o elfo por sua conta, causando toda a confusão. Anix recebeu a punição por ter confessado abusar de sua autoridade como sargento. Embora ele tivesse agido corretamente na maioria das ocasiões, o elfo sentia-se culpado também, e aceitou a punição sem questionar.

No final do terceiro dia, o major Jonathan Wilkes dispensou os soldados e seu sargento da punição, para que na manhã seguinte eles conduzissem Mepisto de volta a Rutorn. Ao receber a notícia, Anix pediu permissão ao major para levar algumas provisões para o vilarejo, já que muitos animais da vila haviam sido mortos, e quase toda a comida da taverna havia sido consumida nas reuniões convocadas por Anix. Jack procurou por o capitão Lars, e foi pedir a ele sua ajuda. Jack pediu a Lars que os acompanhasse e usasse seu poder divino para curar os olhos da jovem Silmara. Lars ouviu atentamente a história contada pelo pirata, deu um grande sorriso e respondeu com sua mais famosa frase:

_ Não há mal que não possa ser desfeito, e não há pessoa que não mereça uma segunda chance! Eu irei com vocês, e verei como posso ajudar essa moça, soldado Jack!

Assim, na manhã do dia 21 de pace, um jetag, eles partiram novamente de forte Rodick, rumo ao vilarejo de Rutorn.

setembro 21, 2006

Capítulo 238 – Zenóbia, a bruxa

Capítulo 238 Zenóbia, a bruxa

A caverna era um buraco úmido e sujo. A cada passo dado, os heróis desciam mais e mais nas profundezas da terra. As raízes das árvores ficavam acima de suas cabeças, emaranhadas umas nas outras e na terra molhada. Vermes e insetos desfilavam tranqüilamente pelo solo e pelo teto de terra. A caverna foi se tornando cada Vaz mais espaçosa, até terminar em uma grande gruta circular, de uns vinte metros de raio.

A tocha de Mepisto tornou quase tudo claro no local. Eles puderam ver que havia móveis toscos, feitos por mãos pouco habilidosas, dentro da caverna. Além de um armário e uma cama, havia também uma mesa, onde o cadáver de algum aventureiro sem sorte jazia. O teto abobadado alcançava facilmente os cinco metros de altura, todo naturalmente decorado por raízes e musgo. No fundo, havia um lugar que a tocha não conseguia clarear. Era uma área em forma de semicírculo de seis metros de raio, encostada na parede no fundo da câmara. Não era possível enxergar nada em detalhes dentro daquela zona escura. Era uma escuridão mágica que turvava a visão, até do mais aguçado olho anão. Pois foi no meio daquelas trevas sobrenaturais, que os heróis viram novamente a Morta do Bosque.

Era possível enxergar apenas o seu vulto, tremulando as mãos e sussurrando alguma coisa em meio à escuridão. Lee começou a ficar meio sonolento, e a caminhar como que hipnotizado na direção da menina. Mas, o monge percebeu que estava sendo dominado magicamente pela garota e despertou a tempo. Inconformada, a garota gritou algumas palavras mágicas, e de sua mão saiu uma esfera de luz muito brilhante que atingiu o peito de Lee, ferindo-o.

Assustado, Jack tomou outro gole do seu rum, esfregou os olhos para não ter dúvidas quanto ao que estava diante dele e disparou sua besta, sem esperanças de atingir o fantasma. Contudo, o projétil cravou-se no peito da Morta do Bosque, e ela gritou, como se sentisse dor. E seu grito, não se parecia com o de uma menina, parecia mais com a voz de uma velha.

Percebendo que a Morta podia ser ferida, Anix não perdeu tempo e arremessou uma bola de enxofre na área de escuridão. A esfera explodiu em chamas, ferindo novamente a Morta do Bosque. O grupo de jovens soldados tomou coragem e avançou, ainda que cautelosamente, pela caverna. Necro tentava usar sua mão espectral para atingir o espírito, mas, para sua surpresa, o fantasma da Morta desapareceu como já havia feito antes.

Todos ficaram espantados e permaneceram em alerta, esperando para atacar no momento em que a morta ressurgisse. Jack e Mepisto carregaram rapidamente suas bestas, enquanto Dragnus e Lee Wood tentavam detectar sinais da presença do fantasma. Necro aproveitou para proteger seu corpo com uma armadura de chamas mágicas, e Anix usou seu poder para tentar localiza a inimiga. E conseguiu. Anix sentiu a presença da garota, próximo da mesa onde jazia o corpo de um homem. Ela estava camuflada por uma magia que o mago costumava usar, e reconheceu imediatamente, invisibilidade.

Protegida por sua camuflagem, a menina se deslocou, afastando-se do ponto vigiado pelos heróis e do local onde a magia de Anix alcançava. Ela mexeu no seu vestido branco, colocando a mão em um bolso, e retirou um pequeno vidro de lá. A Morta do Bosque, que já não se tinha certeza se realmente estava morta, engoliu o líquido que estava no frasco, e dobrou de tamanho instantaneamente.

Anix lançou uma nova bola de fogo, no último lugar onde detectara a presença da Morta. Mas, pra sua infelicidade, ela já não estava mais lá. Mao Necro saiu correndo, decidido. Com sua espada na mão, o elfo avançou na direção da escuridão mágica, disposto a servir de isca para a Morta. No entanto, antes que pudesse penetrar na zona de trevas, Necro se chocou contra algo muito grande. Era a Morta.

O peito de Mao necro se abriu, como se rasgado por punhais afiados. Então, ao invés da menina morta, diante dele surgiu uma criatura gigantesca, de longos e embaraçados cabelos verdes, que mais lembravam gavinhas. Sua pele era de um tom cinza esverdeado, e era toda enrugada e flácida. Vestia trapos de roupas sujas e rasgadas, seu rosto era todo enrugado e cheio de verrugas. Seu nariz era torto para um dos lados, e era tão grande quanto uma adaga. Seus olhos, seus olhos não estavam lá. Aquele estranho ser não possuía olhos, apenas as cavidades oculares vazias, da mesma forma que a pobre Silmara. Mas, no lugar do olho direito, havia uma jóia azulada encaixada com precisão na cavidade. Suas mãos carcomidas e enrugadas terminavam em longas e afiadas garras. Jack estava certo, era uma bruxa verde.

Dragnus enfureceu-se, ao ver aquele ser horrendo, e o atacou com seu machado. Mas, a arma passou ao lado da bruxa, que avançava contra o peito do meio-orc com as garras arqueadas. A bruxa feriu o peito de Dragnus, mas não com um ferimento comum. Seu sorriso malicioso revelou que ela havia feito algo contra Dragnus. Todos perceberam ao ver que o enorme machado escapava das mãos do bárbaro. A enorme força do bárbaro havia sido drenada pela feiticeira.

A bruxa correu de volta para a área escura, escapando com facilidade do machado de Dragnus, e dos virotes de Jack e Mepisto. Anix lançou outra bola de fogo, desta vez, diretamente sobre a bruxa. Mas, algo de estranho aconteceu, e a magia não funcionou.

_ Hahahahaha!!! Eu vou matar todos vocês! Eu vou matá-los! – gritava e ria a bruxa, sua voz era aguda e estridente. Anix notou algo de estranho naquela voz, por algum motivo, ela lhe parecia familiar.

Lee Wood correu, penetrando na zona de trevas num salto espetacular. O monge saltou com os dois pés na direção do peito da gigantesca bruxa. Mas, a criatura se defendeu do golpe com seus poderosos braços, e ainda foi capaz de se esquivar novamente da mão mágica de Mao Necro que tentava agarrá-la. A bruxa contra atacou, desferindo violentos golpes em Lee. O tamuraniano ficou severamente ferido, com seu peito e seu abdome todo perfurado e rasgado. Ao mesmo tempo, surgiu das trevas um gato magro e sujo, todo negro, que saltou na direção de Dragnus, rasgando-lhe a perna com suas garras afiadas.

_ Verme imprestável! Até mesmo o pequeno Lúcifer pode dar conta de você! Hahahahaha! – ria a bruxa, zombando do meio-orc.

Jack disparou novamente sua besta, distraindo a bruxa. Mepisto aproveitou a chance, soltou sua besta no chão e correu até onde estava a bruxa, abrindo um corte largo em sua carne enrugada com sua cimitarra. A feiticeira ergueu sua mão, pronta para contra atacar Mepisto, mas vários projéteis luminosos explodiram em seu rosto, impedindo-a de atacar. Era Anix.

Graças aos seus amigos, Lee conseguiu recuar e tomar uma poção de cura, salvando-se por pouco da morte certa. Enquanto isso, Dragnus travava uma batalha desigual contra Lúcifer, o gato familiar da feiticeira. Por ser pequeno, o animal conseguia escapar com facilidade do machado do meio-orc. A cada ataque que Dragnus errava, o felino contra-atacava de forma feroz, com suas garras e presas, rasgando toda a perna do bárbaro. A bruxa se divertia, ao ver a dificuldade do orc em se defender de seu animalzinho. Enquanto ria, ela rasgava a carne de Mepisto, impiedosamente.

O caçador revidou, desta vez com duas cimitarras simultaneamente, mas a bruxa parecia impenetrável às suas espadas. Jack recarregava sua besta, entre um gole e outro de rum, e Anix novamente lançou seus mísseis mágicos, para ajudar Mepisto. A bruxa foi novamente afetada pelos dardos do mago, e o amaldiçoou pelo feito.

_ Pode se preparar, sua bruxa horrorosa! Nós vamos acabar com você! – bradou Anix, com o peito estufado e cheio de orgulho.

_ Me desculpe!!! Mas eu não vou permitir isso, eu é que vou matar todos vocês! Hahahaha!!! – retrucou a velha agourenta, fitando Anix com a jóia azul que lhe servia de olho. Anix estremeceu. Aquela maneira de olhar, aquela entonação na voz quando ela disse “me desculpe”. Anix tinha certeza que a conhecia, tinha certeza que ela era quem ele estava pensando.

_ Velta? É você? – perguntou o mago, quase não acreditando no que acontecia. Sua voz agora era trêmula e insegura.

_ Não, seu imbecil! Eu sou Zenóbia! Não sou aquela inútil da minha irmã! – respondeu aos gritos a feiticeira.

Anix não estava totalmente errado. Sabia que já tinha visto alguém assim antes. Mas, ele jamais poderia esperar que a bruxa diante de seus olhos fosse irmã da sinistra vidente de Carvalho Quebrado, Velta. Sim, Zenóbia, a bruxa verde que aterrorizava o vilarejo de Rutorn, era irmã de Velta.

_ Por que você está fazendo essas coisas? Pare com tudo isso! Eu sou amigo de sua irmã! Sou amigo de Velta! – disse o mago, tentando conter a fúria da velha bruxa.

_ Dane-se você e aquela traidora da minha irmã! Quero ver os dois mortos! – rugiu a mulher.

_ Mas a Velta já está morta! Ela morreu! Um inimigo meu a matou! – continuou Anix.

_ Melhor assim, então! Aquela traidora teve o que merecia! Hahahaha! Agora é a vez de vocês!!! – a bruxa começou a rir, enlouquecidamente e desapareceu novamente. Estava invisível.

Mao Necro e Lee Wood usaram suas poções mágicas de cura. Dragnus finalmente conseguiu atingir o gato, obrigando-o a se esconder nas sombras para não ser morto. Jack disparou sua besta na escuridão, e Mepisto arremessou suas duas espadas junto com ele. Mas, nenhum dos dois conseguiu atingir a bruxa invisível.

Todos se prepararam novamente, tentando prever em qual lugar a feiticeira iria ressurgir. Anix estava concentrado em uma magia de ataque, enquanto Jack e Mepisto recarregavam suas bestas. Lee sacou seu nunchaku, e Necro seu arco, ambos preparados para atacar assim que detectassem a presença da bruxa. Dragnus segurou o machado com a mão esquerda, e com a direita sacou uma maça estrela que trazia na cintura, deixando-a preparada para ser arremessada na inimiga. Mas, a inimiga não se mostrava e tampouco deixava rastros no solo, ou fazia barulho.

Sem outra opção, Anix decidiu usar sua mágica para encontrar a localização da bruxa. Quando o mago começou a pronunciar as palavras, e a fazer os gestos necessários para a conjuração da magia, foi atingido pelas garras de Zenóbia. A bruxa estava agora diante do mago, muito longe do local onde havia desaparecido. Anix cambaleou, com o peito rasgado e espirrando sangue. Atordoado pela dor, o mago perdeu a magia que tentava fazer, descarregando no ar toda a energia reunida para a conjuração.

Imediatamente, os heróis atacaram, Lee com seu nunchaku, Dragnus com sua maça estrela, Necro com seu arco, Jack com seu florete e Mepisto com sua besta. Mas, a bruxa era mais hábil do que se poderia esperar de uma velha caquética como ela. Com o mesmo movimento ela curvou seu corpo para o lado, escapando da flecha disparada por Mao Necro e da maça arremessada por Dragnus. Com um simples pulo, ela escapou das armas de Jack e Lee, que buscavam suas pernas enrugadas. Depois de tudo isso, rebater o virote disparado por Mepisto foi como uma brincadeira de criança para ela. A bruxa sorriu e voltou a golpear Anix com suas garras, uma, duas, três vezes. O mago tossiu, e viu seu sangue saindo pela sua boca. Sua visão foi ficando turva e suas forças foram se esvaindo. Anix estava quase perdendo os sentidos.

Mesmo tão fraco, o sargento não se acovardou e usou as últimas forças que lhe restavam para disparar uma última magia na inimiga. Sua mão segurou com força a pena de Zenóbia, e uma violenta descarga elétrica percorreu o corpo da feiticeira. Anix caiu para trás, perdendo os sentidos pouco a pouco, enquanto assistia, sorrindo a bruxa sendo eletrocutada.

Lee Wood deu um salto e atacou com seu nunchaku a cabeça de Zenóbia. E novamente a bruxa se defendeu. Necro disparou outra flecha na inimiga, mas novamente ela se defendeu. Dragnus tentou correr até ela para atacá-la com seu machado, mas não tinha mais forças. O bárbaro já tinha gastado todas as suas forças numa explosão de fúria, e agora estava exausto. Jack tentou atingi-la com seu florete, e ele escapou outra vez mais.O monge abaixou e a atacou, desta vez por baixo. Ela novamente saltou o nunchaku de Lee, escapando do ataque. Necro aproveitou a chance e comandou mentalmente a mão espectral que estava flutuando no alto da caverna. O membro fantasmagórico desceu certeiro sobre a cabeça de Zenóbia, descarregando uma magia sobre ela.

Mesmo assim, ela parecia invencível. Desviou facilmente de um novo ataque do enfraquecido Dragnus e desapareceu, outra vez protegida por sua invisibilidade. Entretanto, dessa vez, Dragnus foi capaz de perceber o som dos passos da bruxa. O meio-orc sabia que ela estava agora ao lado de Mao Necro, e tratou de avisar aos seus companheiros.

Jack atacou às cegas, o local apontado por Dragnus, mas não conseguiu atingi-la novamente. Temendo que a bruxa fugisse, Mepisto abriu sua mochila e pegou um saco dentro dela. Estava cheio de peças de metal pontiagudas, estrepes. Seu objetivo era espalhar todos aqueles estrepes pelo chão para impedir que ela pudesse correr sem ferir os pés e revelar sua localização. Enquanto ele preparava a armadilha para impedir a fuga da inimiga, Lee Wood deu um chute voador no local apontado pelo bárbaro. Mas, Zenóbia foi mais rápida e golpeou o monge, jogando-o no chão. Porém, agora ela estava novamente visível.

Dragnus, Jack e Necro a cercaram. A bruxa esquivou-se do machado do meio-orc e atacou os heróis que a cercavam com suas garras. Suas unhas afiadas cortavam como navalhas. Mesmo assim, em meio àquela chuva de golpes cortantes, Jack conseguiu levantar sua mão esquerda e fincar a lâmina do seu florete no meio do peito de Zenóbia. A bruxa recuou para trás, urrando de dor e ódio, com a espada cravada em seu coração, até que ela finalmente caiu pesadamente no chão. Seu olho azul, feito de uma pedra preciosa, despencou, caindo nas mãos do pirata. Jack comemorou a vitória com mais um gole do seu precioso rum.

_ Pessoal! Consegui parar o sangramento! O sargento não corre mais perigo! Mas ele vai ficar desmaiado por um bom tempo, a menos que a gente dê uma poção mágica pra ele! – anunciou Mao Necro, após estancar o sangue que se esvaia de Anix com um pano.

_ Bom! Se ele não vai morrer, então não vamos dar as nossas poções pra ele não! Assim ele fica dormindo e não fica nos dando ordens chatas! Rápido marujos! Tomem todas as suas poções mágicas! Vamos levar o sargento dormindo de volta para o forte! – gritou Jack.

Os soldados tomaram suas poções mágicas e curaram seus ferimentos. Depois, começaram a cantar e dançar ao redor do corpo desmaiado de seu comandante. Enquanto eles cantavam e dançavam, Mepisto se abaixou e começou a mexer dentro da mochila de Anix. Pegava os objetos que estavam lá dentro e os olhava por longos instantes, como se tentasse avaliar o valor de cada coisa.

_ Ei! Ele está tentando roubar o nosso sargento! Peguem ele!!! – gritou Jack, ao ver o que Mepisto fazia.

Os soldados saltaram em cima de Mepisto, tentando agarrá-lo. O caçador se livrava das mãos que o atacavam, tentando se explicar e negando a acusação de Jack. Dragnus desistiu de usar as mãos e partiu para o machado, quase ferindo mortalmente o caçador. Jack fincou o seu florete na garganta de Mepisto, quase a atravessando. Mepisto, mesmo ferido, tirou um objeto de dentro da mochila de e o colocou na boca de Anix. Era uma poção mágica.

Anix despertou de sobressalto. Ainda estava muito ferido, mas o líquido mágico tivera poder suficiente para trazê-lo de volta à consciência. O mago ergueu-se do chão bruscamente, com olhar furioso e procurando pela bruxa. Suas mãos estavam tomadas de chamas mágicas, prontas para atacar assim que avistasse o alvo.

_ Calma sargento! Nós já matamos ela! – disse Jack, tentando acalmar o elfo.

_ Sério??!! Que bom! Parabéns recrutas! – disse o mago, já em seu estado normal. – Espere! Ei Mepisto! O que você está fazendo com minha mochila? – Anix ficou espantado ao ver o caçador com suas coisas.

_ Calma, eu só estava procurando uma poção mágica para te dar! – respondeu Mepisto.

_ Mentira, sargento! Ele estava tentando roubá-lo! O senhor já estava estabilizado, não precisava de poção! Ele queria roubar suas coisas, mas nós não deixamos! – gritou Jack.

_ Isso é verdade? – perguntou Anix.

_ Claro que não! Eu só queria pegar uma poção pra curar você! – respondeu Mepisto.

_ Sargento, ele começou a mexer em sua bolsa, olhando todas as coisas que tinha nela! Se ele queria a poção, deveria ter pegado ela logo, sem ficar mexendo no resto! Além disso, o olhar dele era muito suspeito! – falou Lee Wood, com a calma de sempre.

_ Bom, sendo assim, não tenho outra opção! Mepisto, eu vou ter que prendê-lo e levá-lo para prestar esclarecimentos no forte! – disse Anix.

_ Ah não! Não vai me prender não! Eu não vou deixar! Eu não fiz nada de errado! Não podem me prender! – reclamou Mepisto, afastando-se lentamente do grupo.

_ Isso significa que você vai resistir à prisão, então? Recrutas, prendam-no! – ordenou o sargento.

Os soldados avançaram contra Mepisto, que tentava se defender e escapar a todo custo. Após alguns momentos de tensão, o caçador percebeu que seria melhor não resistir e se entregar de uma vez. Os soldados capturaram-no, tomaram suas armas e o amarraram.

setembro 20, 2006

Capítulo 237 – O pântano dos mortos e o ogro da floresta

Capítulo 237 O pântano dos mortos e o ogro da floresta

Estavam com lama quase até a altura da cintura, bem no meio do pântano quando um gemido agoniante interrompeu a marcha dos heróis. Todos pararam e Mepisto iluminou com a tocha na direção de onde vinha o som. Um ser humanóide caminhava, cambaleante, na direção do grupo. Tinha o corpo murcho, a pele de tom arroxeado parecia grudada apenas sobre os ossos, como se não possuísse carne. Um par de olhos avermelhados e brilhantes se destacava na escuridão, bem como seus dentes afiados e sedentos por sangue. Exalava um cheiro insuportável, tão ou mais nauseante que o cheiro do resto do lodaçal. Um carniçal.

Anix já tinha enfrentado esse tipo de monstro, quando ainda estava no castelo de Zulil. Mas, não teve tempo sequer de avisar os seus comandados do perigo que aquela criatura representava. Outros três seres, de igual aparência, surgiram do meio da lama, erguendo-se ameaçadoramente diante de Anix, Jack e Mao Necro. Os três foram surpreendidos pelos monstros, que os agrediram com suas mandíbulas e garras. Anix recuou com o pescoço ferido, mesmo estando invisível, sua presença podia ser notada pelo movimento da água do pântano. Necro levava a mão ao peito para estancar o sangue que escorria, e Jack não se mexia. Estava paralisado.

Assustado, Necro se lembrou da água benta dada por Seelan a Anix, e buscou por ela em sua mochila. Mas, a distração deu ao seu inimigo a chance que ele esperava para atacá-lo. O monstro avançou raivosamente sobre o mago, rasgando sua carne com os dentes e deixando-o também imóvel.

Anix disparou mísseis mágicos no monstro que o atacara e no outro que caminhava na sua direção. As criaturas se contorceram de dor pelos ferimentos, mas continuaram determinadas a devorar os heróis. Um deles continuou atacando Anix, que agora não contava mais com sua invisibilidade para protegê-lo, enquanto o outro carniçal avançou contra Dragnus. O bárbaro girou seu machado acima de sua cabeça, e desferiu um potente golpe que arrancou quase metade do corpo da criatura. Mesmo ferido, o monstro conseguiu projetar seu corpo na direção do meio-orc e morder-lhe as costas. Com Dragnus, agora eram três os combatentes paralisados pelos poderes sombrios dos monstros.

Os monstros continuaram atacando os três soldados que estavam imóveis, enquanto que outro deles surgia, caminhando pelas águas lamacentas em direção aos guerreiros.

Mepisto sacou sua cimitarra e com um corte veloz decepou a cabeça de um dos inimigos. O corpo do monstro tombou para trás, e começou a afundar lentamente no lodo do pântano, até desaparecer completamente. Ao seu lado, Lee Wood golpeava com suas mãos o outro inimigo que se aproximara, fazendo voar pedaços de carne podre pelo ar.

Anix tentou ajudar Dragnus, disparando uma flecha no monstro que o atacava. Mas, ao invés de acertar a criatura, o mago feriu o companheiro gravemente. Os mortos-vivos, satisfeitos com o que haviam conseguido, começaram a mergulhar no pântano, levando com eles os três heróis paralisados. Mepisto tentou impedir o que carregava Jack, atingindo-o com sua espada. Ao seu lado, os punhos de Lee terminavam de dilacerar o crânio do quinto carniçal, destruindo-o completamente.

Mergulhados na lama, os três soldados estavam desesperados. Jack e Necro reuniram forças para vencer a paralisia e se levantarem. Necro rapidamente sacou sua espada e se preparou para atacar assim que os inimigos reaparecessem. Jack, pegou uma garrafa de rum e se embebedou.

Anix disparava com seu arco, tentando encontrar o monstro que carregara Dragnus para as profundezas. Mas não havia nem sinal dele.

Os outros dois, que haviam pegado Jack e Necro, se levantaram repentinamente e tentaram atacar os heróis. Mas, desta vez, os combatentes estavam preparados, e conseguiram escapar das mandíbulas grotescas dos inimigos. Eles contra-atacaram de forma esmagadora. A espada de Mepisto retalhou o monstro ao lado de Necro, e os punhos poderosos de Lee quebraram em várias partes o corpo do outro. Os monstros caíram e começaram a afundar, imóveis, no lodo. Jack deu uma estocada no peito do inimigo à sua frente e bebeu mais um gole de seu rum. Restava só mais um monstro.

Dragnus se levantou, respirando com dificuldade após engolir a água podre e imunda do pântano. O meio-orc golpeou com seu machado o local onde o inimigo havia submergido, mas não conseguiu acertá-lo. O último carniçal ergueu-se do lodo nas costas de Dragnus. O meio-orc reagiu rápido e escapou por pouco de sua mordida.

Mepisto correu, arremessando sua espada na direção do monstro, mas ela atingiu Anix, que passava atrás para flanquear a criatura. Necro também tentou golpeá-lo com sua espada, mas a criatura dobrou o corpo para trás, escapando da lâmina. Lee Wood saltou, batendo com as duas mãos unidas, mas o monstro novamente se esquivou. Os heróis atacaram várias vezes, mas não conseguiam atingir o monstro. Jack, continuava bebendo seu rum.

Coube a Dragnus a tarefa de eliminar a criatura. O bárbaro desferiu o golpe de misericórdia com seu machado, cortando o carniçal ao meio e vingando-se dos ferimentos que havia recebido. Com todos os mortos-vivos destruídos, o grupo suspirou de alívio. E Jack tomou mais um gole de rum.

Seguiram, desta vez pela floresta. A mata era muito mais densa do que do outro lado do pântano, e os heróis tiveram a certeza de que ela nunca havia sido tocada pelos moradores de Rutorn. Os aventureiros ouviram um urro assustador logo à frente deles, e aumentaram a velocidade da marcha.

De repente, uma árvore despencou sobre o grupo. Por pouco não foram atingidos e esmagados pela tora de madeira que se precipitou no chão. Junto com a árvore, surgiu o responsável pela sua queda, um enorme ogro.

O ogro saiu do meio da mata, rodopiando uma enorme clava de madeira sobre sua cabeça. Lee deu um salto mortal caindo em pé sobre o tronco tombado, e correu rapidamente na direção do monstro. O monge desferiu um potente soco na virilha do ogro, arrancando dele um novo urro, desta vez de dor.

Jack também correu sobre a árvore caída e tentou saltar sobre o ogro para atingi-lo por trás. Mas, a criatura era alta demais para que o pirata conseguisse tal façanha. Jack pousou no solo, ao lado da criatura e perfurou-o com seu florete.

Anix foi o seguinte, correu até onde estava o monstro, com a mão faiscando como uma nuvem de tempestade e agarrou-lhe a perna esquerda. A energia contida na mão do mago descarregou-se toda de uma só vez, provocando um violento choque na criatura.

Parecia que seria uma luta fácil. Desse modo, não havia com o que se preocupar, pensou Mepisto. O jovem caçador correu, rasgando a perna direita do monstro com sua espada curva. Mas, ele não contava com a força do inimigo. O ogro deu mais um giro com sua clava no alto e a abaixou repentinamente, acertando Mepisto com um golpe circular. O corpo do caçador se contorceu, e por pouco não se partiu em pedaços, esmagado pelo poder do ogro. Mepisto começou a recuar, não tinha mais condições de lutar.

Vendo a violência do ataque, Dragnus decidiu tomar uma poção para melhorar seu estado antes de enfrentar o poderoso adversário. Enquanto isso, os outros continuavam lutando, dando chance para Mepisto e Dragnus se recuperarem.

Necro evocou um feitiço, e uma mão translúcida surgiu sobre a cabeça do ogro. O mago pretendia usar aquela mão espectral para atingir o inimigo sem precisar se arriscar a ficar perto dele. Mas, não foi preciso. Lee Wood saltou, atingindo vários golpes na cabeça do inimigo antes de voltar ao solo. Enquanto isso, Jack se aproximava furtivamente por baixo do monge. Quando Lee voltou ao chão, Jack deu uma estocada certeira no umbigo no ogro, enterrando toda a lâmina de seu florete no ventre do monstro. O ogro deu dois passos desajeitados para o lado, e caiu de costas no chão, já sem vida.

Anix ordenou a seus soldados que dessem uma poção de cura a mepisto, e o grupo continuou seguindo em frente. Andaram por mais alguns minutos, procurando às cegas por pistas da Morta do Bosque. Mas, não havia nenhum sinal, nenhum rastro da garota morta. Depois de algum tempo, eles avistaram uma caverna. Era um tipo de toca muito grande, escavada na lateral deu um morro baixo. A entrada era grande o suficiente para a passagem um ser humano, até mesmo um ogro, e aquele lugar escuro e úmido, era um refúgio perfeito para abrigar um espírito atormentado. Ou, como sugeriu Jack, uma bruxa. Sem hesitar, os heróis pegaram suas armas e adentraram no misterioso covil.

setembro 19, 2006

Capítulo 236 – O ataque da morta

Capítulo 236 O ataque da morta

A reunião finalmente começou. Anix subiu no balcão da taverna e se identificou como representante do exército. Um clima de esperança e euforia tomou conta do local. O mago pediu aos moradores que contassem com detalhes todos os contatos que cada um havia tido com o fantasma. Um a um, os aldeões foram relatando suas histórias, enquanto o sargento os ouvia atentamente. Com um pedaço de carvão e a ajuda de um garotinho, Mao Necro desenhou um mapa da vila sobre o balcão. Seguindo as instruções dos moradores, ele demarcou todos os locais onde a morta tinha aparecido. Pelo mapa, Necro supôs que a morta vinha da direção oeste, ou seja, da direção do tal pântano. E pântanos geralmente são habitados por mortos-vivos e outros monstros perigosos. Jack não participou da reunião. Ficou do lado de fora da taverna, conversando com Silmara. A jovem lhe contava sobre seu encontro com a morta, enquanto que o ex-pirata contava vantagens de suas aventuras e fazia galanteios para a jovem.

_ Eu vi a Morta do Bosque! Mas não pude vê-la muito bem, porque ela era muito rápida! Antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, ela já tinha arrancado meus olhos! Um deles explodiu dentro da minha cabeça, mas o outro ela arrancou inteirinho de mim! Mas a morta que eu vi era diferente do que os outros costumam dizer! Ela tinha cabelos verdes! Isso foi tudo que eu consegui ver! – Silmara falava calmamente, parecia conformada com sua tragédia e não se sentia nem um pouco constrangida em falar sobre aquele assunto.

_ Cabelos verdes? Poderia ser uma bruxa verde ao invés da morta! Eu já enfrentei uma bruxa verde antes, quero dizer, eram vinte delas, e mais uma dúzia de ogros! Eu e meus marujos derrotamos todos eles! – Jack se levantou e começou a falar, exaltado, sobre suas aventuras. A cada instante, aumentava o número de monstros supostamente abatidos. Silmara apenas sorria calada.

_ Nossa, gentil senhor! Mas então o senhor deve ser muito forte pra ter derrotado tantos monstros assim? – perguntou a moça, quando o soldado finalmente se calou.

_ Claro que sim! Você não viu o monte de kobolds que nós matamos quando chegamos na vila? – perguntou Jack, sorrindo orgulhoso.

_ Não! É claro que eu não vi, senhor Jack! – sorriu Silmara, apontando para os próprios olhos.

_ Ah, é verdade! Sinto muito! – Jack fez uma cara de espanto. É claro que ele não tinha visto nada, pois ela era cega. Arrependido, o rapaz desculpou-se, envergonhado.

_ Não tem problema, gentil senhor! Eu sei que o senhor não quis me ofender! – a jovem deu mais um sorriso e levantou-se, retornando para dentro com a ajuda do pirata.

Lá dentro, Anix dava instruções aos moradores para que se protegessem, pois era noite de lua em treva. Os moradores deveriam voltar aos seus afazeres, voltar a lacrar suas portas e janelas, enquanto que os soldados, acompanhados do caçador Mepisto, iriam atrás da tal Morta do Bosque. Com tudo decidido, Tomas começou a servir uma saborosa refeição, legumes, arroz e carne, aos aldeões. Passavam das quinze horas, quando os moradores retornaram para suas casas.

Tomas convidou os soldados para se hospedarem em sua casa, até concluírem sua missão em Rutorn. Mepisto foi até sua casa para preparar suas armas para a caçada da noite. Jack conversava com Anix, contando sobre o que Silmara havia dito, e suas suspeitas quanto à existência de outra criatura, além da morta, que havia arrancado os olhos da menina. Enquanto isso, Mao Necro e Dragnus tinham uma forte discussão na taverna.

Os dois brigavam sem terem grandes motivos para isso. Mao Necro relatava ao sargento que não havia detectado qualquer aura mágica entre os aldeões, e sugeria que eles seguissem para o oeste. Dragnus, pelos pontos demarcados no mapa, julgava melhor que fossem para o norte. Irritado com a opinião do meio-orc, Mao Necro o ofendeu, chamando-o de inútil e de feioso. Dragnus se irritou e atacou Necro com seu machado. O mago revidou tentando eletrocutar Dragnus com magia, mas o bárbaro conseguiu escapar do ataque. Anix interveio e ordenou que os interrompessem a discussão e se desculpassem um com o outro. Ignorando as ordens do sargento, Necro usou uma magia para enfraquecer Dragnus. Irritado, Anix ameaçou matá-los se não parassem com aquilo imediatamente. Dragnus se conteve e sentou-se. Já Necro, se recusou a sentar ao lado do meio-orc e pediu para sair da taverna. Anix negou. Irritado, o necromante disse que iria se deitar até o anoitecer e foi para o quarto indicado por Tomas. Descontente, Anix começou a escrever um relatório para entregar ao seu superior assim que retornasse ao forte Rodick.

Mas, Necro, ao contrário do que havia dito, não foi se deitar. Ao invés disso, ele pulou a janela do quarto e fugiu para o bosque. Seguiu por entre as árvores, passando perto dos locais que ele havia marcado no mapa com os locais de aparecimento da Morta. Viu alguns restos de animais mortos, com os olhos arrancados. Quanto mais ele seguia para o oeste, mais a floresta se tornava esparsa, até que ele chegou a um pântano. Necro se conteve diante do lamaçal por alguns instantes, temeroso.

O charco dividia a floresta em duas. Do outro lado do brejo, o bosque era muito mais denso, e parecia intocado pelos lenhadores de Rutorn. Após hesitar por alguns instantes, o mago decidiu tentar atravessar. A água e a lama lhe iam até os joelhos. Mao Necro caminhou com dificuldade por alguns metros, quando ele ouviu sons de gemidos vindos do outro lado do pântano. Temendo enfrentar o espírito sozinho, ele decidiu voltar para a taverna, onde trocou de roupa para que seu sargento não desconfiasse de nada.

A noite finalmente caiu. As tochas na palidaça de madeira ao redor da vila fora todas acesas, e os moradores se esconderam em suas casas. Junto com as trevas, vieram os sons. Grunhidos, relinchos, grasnados, pios e gritos de todos os tipos ecoavam pela mata. Parecia que os animais levados pela Morta do Bosque retornavam com ela para aterrorizar a vila.

Rapidamente, os heróis correram pela mata, buscando a origem do som. Mepisto ia à frente, conduzindo-os pelo bosque e iluminando o caminho com uma tocha. O caçador parou de repente, e o restante do grupo logo atrás dele. Estavam na borda do pântano. A vários metros dali, flutuando sobre o lamaçal, estavam três esferas de luz, rodopiando no ar em alta velocidade e emitindo gemidos e gritos assustadores. Fantasmas!

Os soldados assumiram posição de combate. Jack disparou sua besta e viu o virote atravessando uma das luzes sem causar qualquer tipo de dano a ela. Assustado, o pirata agarrou sua garrafa de rum e deu uma golada.

Os espíritos avançaram, e cercaram os heróis. Giravam ao redor deles, e gritavam para assustá-los. Lee Wood tentava golpeá-las com suas mãos embebidas em água benta. Dragnus aspergia o líquido santo nos inimigos, mas nada disso surtia efeito. Anix ficou invisível para se proteger dos ataques. Mepisto tentou feri-los com um virote de besta, depois com uma cimitarra, mas nada disso funcionava. Mao Necro tentou ofuscar os espíritos com uma magia de luz, mas sua tentativa fracassou também. Jack, apavorado, não sabia se bebia seu rum, ou se tentava atacar com seu florete. A única coisa que ele sabia é que nada disso adiantaria contra os fantasmas. Nada afetaria aquelas luzes, era como se elas não estivessem neste mundo, como se elas não fossem reais.

_ Ilusões! Só podem ser ilusões! – gritou Mao Necro.

Os tais espíritos não atacavam e tampouco eram afetados pelos ataques do grupo, de modo que Necro deduziu que aquilo só podia ser uma ilusão. Anix usou seu poder mágico nas luzes, e sentiu que eram compostos de uma magia de luz. Necro estava certo, eram apenas globos de luz inofensivos. Os sons que emanavam deles também deveriam ser ilusórios. Anix se lembrou que seu próprio irmão Squall sabia imitar sons magicamente daquela forma. Anix entrou no pântano, estava invisível, mas o deslocamento da lama revelou sua presença aos companheiros. Logo ele foi seguido pelos outros e, após alguns instantes, as luzes desapareceram.

Desconfiados, os heróis entraram no pântano e começaram a avançar para investigar aquele local. Mas um grito de pavor, vindo da direção de Rutorn, os fez esquecer a idéia. Saíram em disparada, com lama até as canelas, em direção à vila. Ao chegarem lá, encontraram as ruas desertas e agradeceram aos deuses por não ter ninguém por perto para ser atacado pela Morta. Mas, perceberam que numa das casas, uma cortina era fechada às pressas. Correram até lá e bateram na porta, perguntando o que havia acontecido.

_ A Morta! Ela estava aqui, e levou uma cabra! Eu vi tudo! Ela fugiu para o bosque, foi na direção do pântano! – gritou uma mulher dentro da casa.

Sem perder tempo, os heróis correram de volta para o pântano. À medida que se aproximavam, os gritos dos animais retornavam, e ficavam mais alto. Um outro grito assustador, parecido com o de uma fera ou um monstro gigantesco, surgiu em outra direção, mas não foi capaz de amedrontar os heróis. Quando finalmente chegaram ao brejo, eles viram e entenderam os motivos pelos quais os moradores de Rutorn viviam apavorados. A Morta do Bosque estava lá, esperando-os.

A menina amaldiçoada estava do outro lado do pântano. Trajava um vestido branco que ia até os joelhos. Não possuía pés, parecia flutuar sobre a lama do brejo. Sua pele era pálida como a lua e tinha cabelos negros como a noite. Quatro globos de luz flutuavam ao redor dela, como se dançassem em sua homenagem. A menina esticou a mão direita na direção dos heróis que puderam ver, iluminados pelos globos, dois pares de olhos sobre ela. No chão, diante dos aventureiros, estava o corpo da cabra levada, sem seus olhos. A Morta do Bosque se virou, e os heróis puderam ver o profundo corte que havia em seu pescoço. Ela começou a se afastar lentamente e desapareceu em pleno ar, como que por mágica. Sem perder mais tempo, os valentes heróis correram em direção a ela, atravessando o úmido e perigoso pântano de Rutorn.