setembro 21, 2006

Capítulo 238 – Zenóbia, a bruxa

Capítulo 238 Zenóbia, a bruxa

A caverna era um buraco úmido e sujo. A cada passo dado, os heróis desciam mais e mais nas profundezas da terra. As raízes das árvores ficavam acima de suas cabeças, emaranhadas umas nas outras e na terra molhada. Vermes e insetos desfilavam tranqüilamente pelo solo e pelo teto de terra. A caverna foi se tornando cada Vaz mais espaçosa, até terminar em uma grande gruta circular, de uns vinte metros de raio.

A tocha de Mepisto tornou quase tudo claro no local. Eles puderam ver que havia móveis toscos, feitos por mãos pouco habilidosas, dentro da caverna. Além de um armário e uma cama, havia também uma mesa, onde o cadáver de algum aventureiro sem sorte jazia. O teto abobadado alcançava facilmente os cinco metros de altura, todo naturalmente decorado por raízes e musgo. No fundo, havia um lugar que a tocha não conseguia clarear. Era uma área em forma de semicírculo de seis metros de raio, encostada na parede no fundo da câmara. Não era possível enxergar nada em detalhes dentro daquela zona escura. Era uma escuridão mágica que turvava a visão, até do mais aguçado olho anão. Pois foi no meio daquelas trevas sobrenaturais, que os heróis viram novamente a Morta do Bosque.

Era possível enxergar apenas o seu vulto, tremulando as mãos e sussurrando alguma coisa em meio à escuridão. Lee começou a ficar meio sonolento, e a caminhar como que hipnotizado na direção da menina. Mas, o monge percebeu que estava sendo dominado magicamente pela garota e despertou a tempo. Inconformada, a garota gritou algumas palavras mágicas, e de sua mão saiu uma esfera de luz muito brilhante que atingiu o peito de Lee, ferindo-o.

Assustado, Jack tomou outro gole do seu rum, esfregou os olhos para não ter dúvidas quanto ao que estava diante dele e disparou sua besta, sem esperanças de atingir o fantasma. Contudo, o projétil cravou-se no peito da Morta do Bosque, e ela gritou, como se sentisse dor. E seu grito, não se parecia com o de uma menina, parecia mais com a voz de uma velha.

Percebendo que a Morta podia ser ferida, Anix não perdeu tempo e arremessou uma bola de enxofre na área de escuridão. A esfera explodiu em chamas, ferindo novamente a Morta do Bosque. O grupo de jovens soldados tomou coragem e avançou, ainda que cautelosamente, pela caverna. Necro tentava usar sua mão espectral para atingir o espírito, mas, para sua surpresa, o fantasma da Morta desapareceu como já havia feito antes.

Todos ficaram espantados e permaneceram em alerta, esperando para atacar no momento em que a morta ressurgisse. Jack e Mepisto carregaram rapidamente suas bestas, enquanto Dragnus e Lee Wood tentavam detectar sinais da presença do fantasma. Necro aproveitou para proteger seu corpo com uma armadura de chamas mágicas, e Anix usou seu poder para tentar localiza a inimiga. E conseguiu. Anix sentiu a presença da garota, próximo da mesa onde jazia o corpo de um homem. Ela estava camuflada por uma magia que o mago costumava usar, e reconheceu imediatamente, invisibilidade.

Protegida por sua camuflagem, a menina se deslocou, afastando-se do ponto vigiado pelos heróis e do local onde a magia de Anix alcançava. Ela mexeu no seu vestido branco, colocando a mão em um bolso, e retirou um pequeno vidro de lá. A Morta do Bosque, que já não se tinha certeza se realmente estava morta, engoliu o líquido que estava no frasco, e dobrou de tamanho instantaneamente.

Anix lançou uma nova bola de fogo, no último lugar onde detectara a presença da Morta. Mas, pra sua infelicidade, ela já não estava mais lá. Mao Necro saiu correndo, decidido. Com sua espada na mão, o elfo avançou na direção da escuridão mágica, disposto a servir de isca para a Morta. No entanto, antes que pudesse penetrar na zona de trevas, Necro se chocou contra algo muito grande. Era a Morta.

O peito de Mao necro se abriu, como se rasgado por punhais afiados. Então, ao invés da menina morta, diante dele surgiu uma criatura gigantesca, de longos e embaraçados cabelos verdes, que mais lembravam gavinhas. Sua pele era de um tom cinza esverdeado, e era toda enrugada e flácida. Vestia trapos de roupas sujas e rasgadas, seu rosto era todo enrugado e cheio de verrugas. Seu nariz era torto para um dos lados, e era tão grande quanto uma adaga. Seus olhos, seus olhos não estavam lá. Aquele estranho ser não possuía olhos, apenas as cavidades oculares vazias, da mesma forma que a pobre Silmara. Mas, no lugar do olho direito, havia uma jóia azulada encaixada com precisão na cavidade. Suas mãos carcomidas e enrugadas terminavam em longas e afiadas garras. Jack estava certo, era uma bruxa verde.

Dragnus enfureceu-se, ao ver aquele ser horrendo, e o atacou com seu machado. Mas, a arma passou ao lado da bruxa, que avançava contra o peito do meio-orc com as garras arqueadas. A bruxa feriu o peito de Dragnus, mas não com um ferimento comum. Seu sorriso malicioso revelou que ela havia feito algo contra Dragnus. Todos perceberam ao ver que o enorme machado escapava das mãos do bárbaro. A enorme força do bárbaro havia sido drenada pela feiticeira.

A bruxa correu de volta para a área escura, escapando com facilidade do machado de Dragnus, e dos virotes de Jack e Mepisto. Anix lançou outra bola de fogo, desta vez, diretamente sobre a bruxa. Mas, algo de estranho aconteceu, e a magia não funcionou.

_ Hahahahaha!!! Eu vou matar todos vocês! Eu vou matá-los! – gritava e ria a bruxa, sua voz era aguda e estridente. Anix notou algo de estranho naquela voz, por algum motivo, ela lhe parecia familiar.

Lee Wood correu, penetrando na zona de trevas num salto espetacular. O monge saltou com os dois pés na direção do peito da gigantesca bruxa. Mas, a criatura se defendeu do golpe com seus poderosos braços, e ainda foi capaz de se esquivar novamente da mão mágica de Mao Necro que tentava agarrá-la. A bruxa contra atacou, desferindo violentos golpes em Lee. O tamuraniano ficou severamente ferido, com seu peito e seu abdome todo perfurado e rasgado. Ao mesmo tempo, surgiu das trevas um gato magro e sujo, todo negro, que saltou na direção de Dragnus, rasgando-lhe a perna com suas garras afiadas.

_ Verme imprestável! Até mesmo o pequeno Lúcifer pode dar conta de você! Hahahahaha! – ria a bruxa, zombando do meio-orc.

Jack disparou novamente sua besta, distraindo a bruxa. Mepisto aproveitou a chance, soltou sua besta no chão e correu até onde estava a bruxa, abrindo um corte largo em sua carne enrugada com sua cimitarra. A feiticeira ergueu sua mão, pronta para contra atacar Mepisto, mas vários projéteis luminosos explodiram em seu rosto, impedindo-a de atacar. Era Anix.

Graças aos seus amigos, Lee conseguiu recuar e tomar uma poção de cura, salvando-se por pouco da morte certa. Enquanto isso, Dragnus travava uma batalha desigual contra Lúcifer, o gato familiar da feiticeira. Por ser pequeno, o animal conseguia escapar com facilidade do machado do meio-orc. A cada ataque que Dragnus errava, o felino contra-atacava de forma feroz, com suas garras e presas, rasgando toda a perna do bárbaro. A bruxa se divertia, ao ver a dificuldade do orc em se defender de seu animalzinho. Enquanto ria, ela rasgava a carne de Mepisto, impiedosamente.

O caçador revidou, desta vez com duas cimitarras simultaneamente, mas a bruxa parecia impenetrável às suas espadas. Jack recarregava sua besta, entre um gole e outro de rum, e Anix novamente lançou seus mísseis mágicos, para ajudar Mepisto. A bruxa foi novamente afetada pelos dardos do mago, e o amaldiçoou pelo feito.

_ Pode se preparar, sua bruxa horrorosa! Nós vamos acabar com você! – bradou Anix, com o peito estufado e cheio de orgulho.

_ Me desculpe!!! Mas eu não vou permitir isso, eu é que vou matar todos vocês! Hahahaha!!! – retrucou a velha agourenta, fitando Anix com a jóia azul que lhe servia de olho. Anix estremeceu. Aquela maneira de olhar, aquela entonação na voz quando ela disse “me desculpe”. Anix tinha certeza que a conhecia, tinha certeza que ela era quem ele estava pensando.

_ Velta? É você? – perguntou o mago, quase não acreditando no que acontecia. Sua voz agora era trêmula e insegura.

_ Não, seu imbecil! Eu sou Zenóbia! Não sou aquela inútil da minha irmã! – respondeu aos gritos a feiticeira.

Anix não estava totalmente errado. Sabia que já tinha visto alguém assim antes. Mas, ele jamais poderia esperar que a bruxa diante de seus olhos fosse irmã da sinistra vidente de Carvalho Quebrado, Velta. Sim, Zenóbia, a bruxa verde que aterrorizava o vilarejo de Rutorn, era irmã de Velta.

_ Por que você está fazendo essas coisas? Pare com tudo isso! Eu sou amigo de sua irmã! Sou amigo de Velta! – disse o mago, tentando conter a fúria da velha bruxa.

_ Dane-se você e aquela traidora da minha irmã! Quero ver os dois mortos! – rugiu a mulher.

_ Mas a Velta já está morta! Ela morreu! Um inimigo meu a matou! – continuou Anix.

_ Melhor assim, então! Aquela traidora teve o que merecia! Hahahaha! Agora é a vez de vocês!!! – a bruxa começou a rir, enlouquecidamente e desapareceu novamente. Estava invisível.

Mao Necro e Lee Wood usaram suas poções mágicas de cura. Dragnus finalmente conseguiu atingir o gato, obrigando-o a se esconder nas sombras para não ser morto. Jack disparou sua besta na escuridão, e Mepisto arremessou suas duas espadas junto com ele. Mas, nenhum dos dois conseguiu atingir a bruxa invisível.

Todos se prepararam novamente, tentando prever em qual lugar a feiticeira iria ressurgir. Anix estava concentrado em uma magia de ataque, enquanto Jack e Mepisto recarregavam suas bestas. Lee sacou seu nunchaku, e Necro seu arco, ambos preparados para atacar assim que detectassem a presença da bruxa. Dragnus segurou o machado com a mão esquerda, e com a direita sacou uma maça estrela que trazia na cintura, deixando-a preparada para ser arremessada na inimiga. Mas, a inimiga não se mostrava e tampouco deixava rastros no solo, ou fazia barulho.

Sem outra opção, Anix decidiu usar sua mágica para encontrar a localização da bruxa. Quando o mago começou a pronunciar as palavras, e a fazer os gestos necessários para a conjuração da magia, foi atingido pelas garras de Zenóbia. A bruxa estava agora diante do mago, muito longe do local onde havia desaparecido. Anix cambaleou, com o peito rasgado e espirrando sangue. Atordoado pela dor, o mago perdeu a magia que tentava fazer, descarregando no ar toda a energia reunida para a conjuração.

Imediatamente, os heróis atacaram, Lee com seu nunchaku, Dragnus com sua maça estrela, Necro com seu arco, Jack com seu florete e Mepisto com sua besta. Mas, a bruxa era mais hábil do que se poderia esperar de uma velha caquética como ela. Com o mesmo movimento ela curvou seu corpo para o lado, escapando da flecha disparada por Mao Necro e da maça arremessada por Dragnus. Com um simples pulo, ela escapou das armas de Jack e Lee, que buscavam suas pernas enrugadas. Depois de tudo isso, rebater o virote disparado por Mepisto foi como uma brincadeira de criança para ela. A bruxa sorriu e voltou a golpear Anix com suas garras, uma, duas, três vezes. O mago tossiu, e viu seu sangue saindo pela sua boca. Sua visão foi ficando turva e suas forças foram se esvaindo. Anix estava quase perdendo os sentidos.

Mesmo tão fraco, o sargento não se acovardou e usou as últimas forças que lhe restavam para disparar uma última magia na inimiga. Sua mão segurou com força a pena de Zenóbia, e uma violenta descarga elétrica percorreu o corpo da feiticeira. Anix caiu para trás, perdendo os sentidos pouco a pouco, enquanto assistia, sorrindo a bruxa sendo eletrocutada.

Lee Wood deu um salto e atacou com seu nunchaku a cabeça de Zenóbia. E novamente a bruxa se defendeu. Necro disparou outra flecha na inimiga, mas novamente ela se defendeu. Dragnus tentou correr até ela para atacá-la com seu machado, mas não tinha mais forças. O bárbaro já tinha gastado todas as suas forças numa explosão de fúria, e agora estava exausto. Jack tentou atingi-la com seu florete, e ele escapou outra vez mais.O monge abaixou e a atacou, desta vez por baixo. Ela novamente saltou o nunchaku de Lee, escapando do ataque. Necro aproveitou a chance e comandou mentalmente a mão espectral que estava flutuando no alto da caverna. O membro fantasmagórico desceu certeiro sobre a cabeça de Zenóbia, descarregando uma magia sobre ela.

Mesmo assim, ela parecia invencível. Desviou facilmente de um novo ataque do enfraquecido Dragnus e desapareceu, outra vez protegida por sua invisibilidade. Entretanto, dessa vez, Dragnus foi capaz de perceber o som dos passos da bruxa. O meio-orc sabia que ela estava agora ao lado de Mao Necro, e tratou de avisar aos seus companheiros.

Jack atacou às cegas, o local apontado por Dragnus, mas não conseguiu atingi-la novamente. Temendo que a bruxa fugisse, Mepisto abriu sua mochila e pegou um saco dentro dela. Estava cheio de peças de metal pontiagudas, estrepes. Seu objetivo era espalhar todos aqueles estrepes pelo chão para impedir que ela pudesse correr sem ferir os pés e revelar sua localização. Enquanto ele preparava a armadilha para impedir a fuga da inimiga, Lee Wood deu um chute voador no local apontado pelo bárbaro. Mas, Zenóbia foi mais rápida e golpeou o monge, jogando-o no chão. Porém, agora ela estava novamente visível.

Dragnus, Jack e Necro a cercaram. A bruxa esquivou-se do machado do meio-orc e atacou os heróis que a cercavam com suas garras. Suas unhas afiadas cortavam como navalhas. Mesmo assim, em meio àquela chuva de golpes cortantes, Jack conseguiu levantar sua mão esquerda e fincar a lâmina do seu florete no meio do peito de Zenóbia. A bruxa recuou para trás, urrando de dor e ódio, com a espada cravada em seu coração, até que ela finalmente caiu pesadamente no chão. Seu olho azul, feito de uma pedra preciosa, despencou, caindo nas mãos do pirata. Jack comemorou a vitória com mais um gole do seu precioso rum.

_ Pessoal! Consegui parar o sangramento! O sargento não corre mais perigo! Mas ele vai ficar desmaiado por um bom tempo, a menos que a gente dê uma poção mágica pra ele! – anunciou Mao Necro, após estancar o sangue que se esvaia de Anix com um pano.

_ Bom! Se ele não vai morrer, então não vamos dar as nossas poções pra ele não! Assim ele fica dormindo e não fica nos dando ordens chatas! Rápido marujos! Tomem todas as suas poções mágicas! Vamos levar o sargento dormindo de volta para o forte! – gritou Jack.

Os soldados tomaram suas poções mágicas e curaram seus ferimentos. Depois, começaram a cantar e dançar ao redor do corpo desmaiado de seu comandante. Enquanto eles cantavam e dançavam, Mepisto se abaixou e começou a mexer dentro da mochila de Anix. Pegava os objetos que estavam lá dentro e os olhava por longos instantes, como se tentasse avaliar o valor de cada coisa.

_ Ei! Ele está tentando roubar o nosso sargento! Peguem ele!!! – gritou Jack, ao ver o que Mepisto fazia.

Os soldados saltaram em cima de Mepisto, tentando agarrá-lo. O caçador se livrava das mãos que o atacavam, tentando se explicar e negando a acusação de Jack. Dragnus desistiu de usar as mãos e partiu para o machado, quase ferindo mortalmente o caçador. Jack fincou o seu florete na garganta de Mepisto, quase a atravessando. Mepisto, mesmo ferido, tirou um objeto de dentro da mochila de e o colocou na boca de Anix. Era uma poção mágica.

Anix despertou de sobressalto. Ainda estava muito ferido, mas o líquido mágico tivera poder suficiente para trazê-lo de volta à consciência. O mago ergueu-se do chão bruscamente, com olhar furioso e procurando pela bruxa. Suas mãos estavam tomadas de chamas mágicas, prontas para atacar assim que avistasse o alvo.

_ Calma sargento! Nós já matamos ela! – disse Jack, tentando acalmar o elfo.

_ Sério??!! Que bom! Parabéns recrutas! – disse o mago, já em seu estado normal. – Espere! Ei Mepisto! O que você está fazendo com minha mochila? – Anix ficou espantado ao ver o caçador com suas coisas.

_ Calma, eu só estava procurando uma poção mágica para te dar! – respondeu Mepisto.

_ Mentira, sargento! Ele estava tentando roubá-lo! O senhor já estava estabilizado, não precisava de poção! Ele queria roubar suas coisas, mas nós não deixamos! – gritou Jack.

_ Isso é verdade? – perguntou Anix.

_ Claro que não! Eu só queria pegar uma poção pra curar você! – respondeu Mepisto.

_ Sargento, ele começou a mexer em sua bolsa, olhando todas as coisas que tinha nela! Se ele queria a poção, deveria ter pegado ela logo, sem ficar mexendo no resto! Além disso, o olhar dele era muito suspeito! – falou Lee Wood, com a calma de sempre.

_ Bom, sendo assim, não tenho outra opção! Mepisto, eu vou ter que prendê-lo e levá-lo para prestar esclarecimentos no forte! – disse Anix.

_ Ah não! Não vai me prender não! Eu não vou deixar! Eu não fiz nada de errado! Não podem me prender! – reclamou Mepisto, afastando-se lentamente do grupo.

_ Isso significa que você vai resistir à prisão, então? Recrutas, prendam-no! – ordenou o sargento.

Os soldados avançaram contra Mepisto, que tentava se defender e escapar a todo custo. Após alguns momentos de tensão, o caçador percebeu que seria melhor não resistir e se entregar de uma vez. Os soldados capturaram-no, tomaram suas armas e o amarraram.

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