abril 12, 2006

Capítulo 194 – A velha sombria

Capítulo 194 A velha sombria

Legolas e Lucano relataram a Glorin sobre o rapto do menino. As ordens do capitão foram: reunir toda a população da vila na maior e mais resistente casa e reforçar as portas e janelas do local para impedir a entrada dos mortos-vivos. Os dois saíram pelas ruas, chamando todas as pessoas com a ajuda de Norgar, e levaram todos para a casa de Torkel Sundagger, um homem de idade avançada, considerado como um líder local por sua sabedoria e bondade. Torkel vivia numa casa tão grande quanto a estalagem Urso Branco. Era o morador mais antigo da vila, presente ali quase desde a sua fundação. Tinha uma grande e resistente casa, e uma boa quantia em dinheiro também, fruto dos longos anos de trabalho na lavoura, que utilizava agora para se manter na aposentadoria. Torkel recebeu Legolas e os moradores de braços abertos, mostrando-se muito prestativo e gentil.

Enquanto isso, Anix batia na porta de uma pequena casa no fim da vila, já quase dentro da plantação. Era uma casa pequena de formato circular, feita de madeira rústica e mal acabada, telhado de madeira e palha. Após bater, Anix esperou alguns segundos até alguém responder de lá de dentro.

_ Quem ééééééééééé??? – perguntou uma voz aguda e estridente.

_ Sou eu! – respondeu Anix com firmeza

­_ Eu? Não pode ser eu! Eu estou aqui! Como eu posso estar ai fora se eu estou aqui dentro? – continuou a voz.

_ Eu sou Anix senhora! Sou do exército de Tollon! Gostaria de conversar com a senhora! – Anix desfez o mal entendido.

_ Ah sim, Anix, do exército de Tollon! Sabia que não era eu ai fora! Já vou abrir, um momentinho! – respondeu a mulher.

A porta se abriu, revelando uma mulher de idade bastante avançada. Tinha a mesma altura de um anão, embora fosse uma humana. Era corcunda e vestia um vestido de chita esfarrapado. Tinha um grande nariz, meio torto para a esquerda, e seu rosto trazia, além das rugas, várias verrugas purulentas. A mulher se apoiava numa bengala torta de madeira para andar. Não tinha o olho esquerdo e mantinha suas pálpebras sempre fechadas sobre a cavidade ocular vazia. Ela olhou para o mago com o olho que lhe restava e, com um gesto, o convidou a entrar.

Anix deu um passo em direção à porta, e foi surpreendido por uma dezena de gatos magros e sujos que passaram correndo por entre suas pernas. Heart, seu falcão, alçou vôo, fugindo do alcance dos felinos. Refeito do susto, o elfo entrou na choupana e a mulher fechou a porta logo em seguida. Sentaram-se um de frente para o outro. Anix sobre a cama rústica da mulher. Ela, em uma velha cadeira de balanço com uma das pernas já por quebrar. O ambiente era sombrio e assustador. Pendurados pelo teto havia morcegos empalhados, ossos, colares de contas e dentes de animais, ervas estranhas. O cheiro de mofo imperava, soberano.

_ E então, Anix! Sobre o que veio conversar? – Velta sorriu para Anix, exibindo seus dentes podres e amarelados, enquanto acariciava um gato deitado sobre seu colo, a quem ela carinhosamente tratava por Satanás.

_ A senhora viu os mortos-vivos ontem à noite? Pode me dizer alguma coisa sobre eles? – perguntou Anix.

_ Sim, eu os vi! Mas não sei muita coisa sobre eles! A não ser que eles não são mortos-vivos comuns! – respondeu a mulher pausadamente.

_ E eles podem estar sendo controlados por alguém? – continuou o mago.

_ Sim, alguém deve estar controlando-os! Mas eu não sei quem seria! Talvez um vampiro, talvez um lobisomem! – prosseguiu Velta.

­_ Eu vi uma criatura ontem à noite, uivando sobre um telhado! Ele tinha olhos vermelhos e parecia um cão quase tão grande quanto um cavalo! Eu tenho um desenho aqui feito por mim! Não está muito bem feito, mas deve dar uma noção do que eu estou falando! Por favor diga-me se a senhora conhece este animal! – pediu o mago educadamente, desenrolando um pergaminho que trazia consigo.

_ Pode ser um Mastim de Thyatis! Um cão dos infernos, que cospe fogo! Uma criatura muito maligna! Deve tomar muito cuidado com ele, meu jovem! – disse a velha.

_ Diga-me uma coisa senhora! Não tem medo de ficar aqui sozinha? Não tem medo que eles a peguem? – perguntou Anix.

_ Nããão! Por que eu teria? Já sou uma velha, tenho mais de cem anos! O que eles podem me fazer? Me matar? Eu já estou no fim da vida mesmo! – respondeu a mulher com um sorriso.

_ Desculpe-me! – sorriu novamente a mulher, ao se ouvir um som flatulento.

_ A senhora é a curandeira daqui, certo? O que a senhora sabe fazer? – perguntou Anix.

_ Faço alguns remédios com minhas ervas, umas preces, e curo as pessoas! – respondeu Velta.

_ E por que a senhora tem esses gatos? – perguntou o elfo.

_ E por que você tem aquele pássaro? Eu gosto dos gatos, você do seu pássaro, não vejo problema nisso! – respondeu Velta com arrogância.

_ Está certo! Bom, eu acho que não seria prudente a senhora ficar aqui sozinha, isolada da vila! Os mortos podem voltar e fazer-lhe mal! – afirmou Anix.

_ Não se preocupe, eu já vivi bastante, nada do que eles podem fazer me assusta! – Velta parecia muito tranqüila, mesmo com a ameaça dos zumbis.

_ A senhora fica se gabando que já viveu bastante, mas eu sou muito mais velho que a senhora!­ – disse o mago, em tom irônico.

_ Sim, afinal você é um elfo! É mais velho, porém não é mais sábio! Além do mais, será que você viverá tanto quanto eu para os padrões élficos? – retrucou a mulher.

_ Claro que sim! – Anix estufou o peito, orgulhoso da longevidade de sua raça, e respondeu, como se desafiasse a velha.

_ Eu não teria tanta certeza disso! Vejo um futuro sombrio para você! Você atrai a desgraça! Vejo morte em seu caminho! – Velta falava lentamente, como se lamentasse pelo futuro de Anix. Firmou o olhar em sua direção e fechou o olho direito, abrindo as pálpebras esquerdas, onde não havia nada além de um buraco.

Anix olhou para o buraco no olho da mulher e sentiu algo estranho. Foi tomado por uma estranha dor, uma sensação que incomodava. Mesmo assim, não conseguia desviar o olhar, sentia-se atraído por aquilo. Anix não podia parar de olhar para aquela cavidade ocular. Era algo estranho e místico. Anix sentia-se enfeitiçado. Para ele, aquele buraco no rosto da mulher era como se fosse um céu negro, cheio de estrelas brilhantes, girando como uma galáxia. Somente quando a mulher fechou aquele olho bizarro e diabólico é que Anix conseguiu voltar a si. A mulher jogou seu gato, Satanás, em no colo de Anix. O animal olhou para o mago e saiu correndo, apavorado, como que confirmando as afirmações da mulher. Ela continuou.

_ Vejo um futuro de dor e glória para você, e para seus amigos! Mas, bem, chega de conversar! Já é hora de você voltar para seus amigos! Afinal,vocês têm uma missão a cumprir! – disse a mulher, já voltando a sorrir maliciosamente, enquanto conduzia Anix até a porta.

_ Espere ai! De que a senhora está falando? Que missão é essa? E que futuro é esse, o que a senhora viu no meu futuro? Tem a ver com minha descendência dracônica? – perguntava Anix, transtornado.

_ Em breve você descobrirá! Adeus! – Velta acenou para Anix e fechou a porta, deixando-o do lado de fora, confuso.

Anix estava realmente transtornado com as palavras daquela estranha mulher. Temia que ela tivesse razão no que dizia e temia que suas palavras tivessem alguma coisa a ver com as previsões de Enola. Anix estava assustado, mas mesmo assim não se entregou ao medo. Subiu em seu cavalo e retornou para a estalagem. Ao menos numa coisa a mulher tinha razão. Ele tinha uma missão a cumprir. Ele e seus amigos tinham que ajudar as pessoas daquela vila a se defender dos mortos-vivos.

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