Capítulo 16 – Aroma suspeito
Kallas guiou seus amigos através das ruas da capital. Seu vínculo empático com a coruja Auran lhe permitia encontrá-la facilmente e com isso saber a localização dos goblins. Chegaram a uma rua estreita e escura, como praticamente todas as outras no bairro onde estavam. A carroça que perseguiam estava parada em frente a uma taverna, em cuja placa podia se ler “Taverna Bom Aroma”. Mas, apesar do nome, todos sabiam que algo não cheirava bem naquele lugar, e não eram os odores pútridos do esgoto que corria a céu aberto.
O líder dos goblins conversava com um homem, um humano magro, de cabelos curtos, que trajava roupas simples, porém de qualidade. Os outros dois goblins desceram da carroça, carregando um saco grande de pano, no qual havia algo maleável, talvez pólvora, e entraram na taverna.
No beco onde estavam escondidos, os aventureiros traçaram um plano. Serena e Nirvana rasgaram suas roupas, deixando-as com decotes grandes e insinuantes. Maquiaram-se de forma exagerada e soltaram seus cabelos para tornar o disfarce ainda mais perfeito. As duas se passaria por simples prostitutas, para poder se aproximar do goblin e do homem com o qual conversava e poder ouvir o que falavam. Kallas iria até a taverna, fingindo ser um freguês comum, e tentaria descobrir o que os goblins estavam entregando. E Lohranus permaneceria no beco, escondido para não chamar a atenção, cuidando dos cavalos e equipamentos e preparado para ajudar os companheiros em caso de problemas.
Kallas ficou observando Serena e Nirvana. As duas saíram do beco e foram até o outro lado da rua furtivamente, depois começaram a caminhar na direção da taverna, conversando alto, rindo e andando desleixadamente, de modo provocante. Kallas esperou até que as duas passassem pela carroça, provocando os homens e oferecendo seus corpos e saiu do beco, seguindo o mesmo caminho feito pelas duas mulheres. Passou em frente à carroça e entrou na Bom Aroma, estranhando o comportamento de um grupo que cantarolava animadamente ao lado da entrada, um curioso grupo composto de humanos, um elfo e um meio-orc que se abraçavam como se fossem grandes amigos. Kallas achou aquilo estranho, já que elfos e os filhos bastardos de orcs não costumavam se dar bem, mas decidiu ignorar e seguir com o plano.
Sentou-se numa mesa meio escondida e ficou a observar o comportamento das pessoas que estavam ali. A taverna era escura e suja, e uma fina nuvem de fumaça poluía o ar, tornando-o carregado. Havia um razoável número de fregueses, todos solitários em suas mesas tomando suas bebidas. Alguns estavam encostados nas paredes, ou debruçados sobre as mesas completamente imóveis. Seus olhares eram estáticos e vazios e vez ou outra algum deles esboçava um sorriso sem qualquer razão aparente.
Então Kallas viu o taverneiro passando, e indo em direção a um cliente que acabava de chegar. Viu os dois goblins saindo de trás do balcão junto com ele, e indo para fora da taverna. Kallas voltou seus olhos para fora, e viu os goblins partirem com sua carroça, sabe-se lá para onde. Pouco depois viu Lohranus passando diante da taverna, seguindo na mesma direção dos goblins, e ordenou a Auran para segui-lo. Voltou sua atenção novamente para o taverneiro. O homem, um gordo calvo, de olhar assustadiço e bigode bem aparado, olhava ao redor, desconfiado, antes de encher a caneca do cliente com um vinho tinto. Kallas baixou a cabeça disfarçadamente para não chamar a atenção, e a cobriu com o capuz de seu manto. O taverneiro deu uma outra olhada ao redor e, ao ver que não era observado, colocou sobre a mesa uma pequena bolsa de pano, que pousou silenciosamente sobre a madeira. O taverneiro se retirou e retornou para trás de seu balcão, com a cabeça baixa, sem olhar ao redor. O cliente, por sua vez, escondeu o saquinho com a mão, e então foi sua vez de olhar ao redor com ar de desconfiança. Depois, despejou o conteúdo do saco dentro de sua caneca, uma espécie de pó ou folhagem triturada, e tomou. Deu uma demorada golada na caneca, deixando um fio de vinho escorrer pela lateral da boca. Depois deu um largo sorriso de satisfação e relaxou na cadeira. Alguns instantes depois, seus olhos também fitavam o nada, distantes. Então, o taverneiro notou a presença de Kallas, e foi até ele.
_ O que deseja? – perguntou o homem gordo, secamente.
_ Uma caneca de vinho! – respondeu o meio-demônio, com a mesma polidez.
_ E vai querer completo? – tornou a perguntar o homem.
_ Como assim, completo? – estranhou Kallas. O taverneiro arregalou os olhos, espantado.
_ Ora, completo, bem a caneca de vinho, completa! – explicou o homem, tropeçando nas palavras.
_ Sim, claro que quero completo! – falou o mago. O taverneiro colocou uma caneca sobre a mesa e a encheu com o vinho que trazia em uma jarra. Depois, olhou em volta, tirou um saquinho de pano e colocou-o ao lado da caneca.
_ São dez peças! – disse ele.
_ Dez peças? – surpreendeu-se Kallas, quase num grito.
_ Sim! – o taverneiro parecia desconfiado.
_ Tome! Aqui estão! – Kallas apanhou em sua bolsa dez tibares de ouro e entregou-os ao taverneiro. O homem olhou para as moedas, como se as contasse, e as guardou no bolso. Depois, retornou para trás do balcão, onde parecia sentir-se protegido.
Kallas puxou o saquinho para trás de sua caneca e olhou seu conteúdo. Eram folhas de algum tipo desconhecido de erva, picadas em pedaços pequenos. Um forte aroma saiu do pequeno saco e invadiu as narinas do mago. Kallas fechou o saco e, fingiu colocar seu conteúdo dentro da caneca. Depois, tendo certeza que não era vigiado, guardou o pequeno pacote em seu bolso e tomou seu vinho.
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