maio 25, 2006

Capítulo 209 – Eliot, o guardião

Capítulo 209 Eliot, o guardião

Calmamente, o grupo removeu todas as proteções colocadas dentro do quarto e abriu a porta. Olharam no corredor. Tudo parecia tranqüilo e intocado. Sob ordens de Glorin, Nailo analisou o piso do corredor em busca de pegadas. Segundo ele, ninguém havia passado por ali durante a noite.

Rumaram em direção ao fundo do castelo, caminhando cautelosamente, observando cada detalhe do corredor. Constataram que as portas abertas por eles continuavam tal qual haviam sido deixadas no dia anterior. Sinal de que ninguém tinha passado por ali. Pararam logo após a capela e o salão de festas, diante de duas portas opostas. Duas portas simples e comuns, sem entalhes nem dimensões grandiosas. Glorin olhou meticulosamente cada uma das entradas, pensando nos perigos que elas esconderiam.

_ Capitão! Posso dar uma sugestão? – pediu Nailo

_ Diga garoto! – respondeu o anão.

_ Acho melhor nós irmos primeiro pela porta da direita! A da esquerda já dá pra deduzir o tamanho e o formato, a da direita não! – respondeu o ranger, usando a continuação do corredor á esquerda como justificativa.

_ Eu acho melhor nós irmos pela esquerda! E dessa vez é melhor nós não abrirmos duas portas de uma vez, capitão! – retrucou Legolas.

_ É só você e o Squall não bancarem os imbecis de novo e se meterem a abrir outra porta que não teremos problemas! – ralhou Glorin.

_ Capitão! A porta da esquerda está destrancada! - disse Legolas ao tentar abri-la.

_ A da direita também não está trancada! – completou Nailo.

_ Elfos...! – suspirou Glorin, visivelmente descontente.

_ Vamos deixar que os deuses decidam por nós! – exclamou Anix, tentando resolver sem conflitos qual caminho tomar.

_ Deuses nada! Quem vai decidir isso é meu machado! – bradou o anão, colocando a arma de madeira no chão. Glorin deu um tapa no cabo do machado, fazendo-o girar no chão rapidamente. A arma foi rodopiando cada vez mais devagar até parar completamente com o cabo voltado para a porta da esquerda.

_ Vamos pela esquerda então! E que ninguém ouse abrir a outra porta! – ordenou o anão.

O grupo se posicionou diante da porta, armas em punho, pronto para rechaçar qualquer ameaça. Legolas e Lucano forneciam luz ao grupo com o arco mágico e a lanterna coberta. Nailo abriu a porta sorrateiramente. As armas foram apontadas para dentro da sala, esperando um novo ataque de surpresa. Nada. Tudo estava calmo. Legolas e Lucano iluminaram o interior do aposento e todos adentraram no local.

O salão media quinze metros de largura e mais de vinte de comprimento. Por serem elfos, os heróis percebiam, ainda que com dificuldade, os detalhes mais distantes do local. Duas grandes mesas circulares, rodeadas por oito cadeiras cada, dividiam o espaço central da câmara em duas partes iguais. Antigas estantes de madeira abrigavam centenas de livros, ocupando as paredes à direita e ao fundo. Avia também um grande baú no espaço vazio entre as estantes da direita e a parede do fundo. Estavam em uma biblioteca. Com tantos tomos, talvez encontrassem ali alguma pista que pudesse revelar o que acontecera naquele castelo, centenas de anos atrás.

Tudo parecia normal. Uma nuvem de poeira fina se assentava aos poucos, após ser levantada pelo abrir da porta. Um cheiro de mofo e pó característico inundava as narinas dos aventureiros, causando-lhes certo desconforto. Teias de aranhas tomavam contas dos cantos das paredes e dos móveis. Tudo normal, exceto pelo som. Um estranho ruído chegava a seus ouvidos. Um rangido longo, seguido de uma pancada seca e baixa que se repetiam constantemente e de forma ritmada, tiravam o sossego dos jovens.

Inicialmente, pensaram na tampa do baú. Mas ela estava imóvel. Depois, concluíram que o estranho som vinha do fundo da sala, de perto da segunda mesa, onde um grande tomo jazia aberto, abandonado.

Imediatamente após detectar a origem do som, Nailo caminhou rapidamente até a mesa, enquanto seus companheiros dirigiam suas luzes para o local e focavam sua visão no móvel. Quando o ranger se aproximou da mesa, não só ele, mas todos os outros finalmente entenderam o que causava o estranho barulho. Uma das cadeiras se inclinava, afastando-se da mesa, e logo em seguida retornava á posição original, batendo com força seus pés no chão.

Uma cadeira mágica, deve ter pensado Nailo ao golpear o objeto com sua espada curta, usando toda a força que possuía. A lâmina abriu um corte no objeto que continuava a se mover da mesma forma. Assustado, Nailo decidiu que era o momento de recuar e ficar perto de seus amigos. Mas, já era tarde.

A cadeira interrompeu seu movimento bruscamente. Um estranho calafrio tomou conta do corpo do ranger enquanto ele tentava correr. Seu corpo foi levantado do solo como que por mágica, e Nailo foi arremessado com violência contra as estantes perto da entrada. Sentado na cadeira, estava um homem, vestido como um soldado, portando uma espada bastarda. Seu corpo era translúcido, todos podiam enxergar claramente através dele. Seus olhos brilhavam como duas faíscas, enquanto movia as mãos na direção da estante como se estivesse controlando o corpo de Nailo com mágica. Não tinha pés, e seu rosto estava carcomido com pedaços de pele faltando e ossos e músculos à mostra. O pavor tomou conta de todos nesse momento.

_ Bárbaros invasores!!! Saiam daqui!!! – gritou o fantasma, levantando-se da cadeira e flutuando ameaçadoramente em direção aos heróis.

_ Flecha Infalível de Legolas! – gritou o arqueiro, disparando contra a criatura horripilante que os desafiava. Foram dois disparos certeiros. O primeiro explodiu em gelo ao atravessar o fantasma. O segundo passou por dentro dele sem efeito, indo chocar-se contra os livros ao fundo. O fantasma se contorceu e amaldiçoou Legolas, encarando-o de forma maliciosa e estranha.

Sem hesitar, Squall lançou um poderoso feitiço sobre o inimigo. Uma explosão de chamas em forma de esfera se espalhou numa grande área ao redor do fantasma. Os móveis estremeceram, as páginas do livro sobre a mesa foram viradas e algumas começaram a pegar fogo. O fantasma, contudo, nada sofreu.

_ Quem é você? – gritou Nailo, ainda atordoado com o tombo.

_ Eu sou Sir Eliot, o guardião! E vou expulsá-los daqui seus invasores! Preparem-se para morrer, bárbaros malditos!!! – gritou o ser fantasmagórico, voando em direção aos heróis.

O espírito avançou rapidamente até Legolas, agarrando-o. Legolas se debateu, tentando inutilmente se livrar do inimigo. Subitamente, o fantasma desapareceu, da mesma forma que surgiu sobre a cadeira momentos antes. Apesar do susto, Legolas estava bem, como comprovaram seus amigos.

Com o fantasma desaparecido, os heróis tinham tempo para se prepararem para a luta. Anix protegeu seu corpo com um campo de força mágico e invisível, enquanto Glorin procurava pelo inimigo dentro no fundo da biblioteca. Nailo preparava uma bomba de óleo para lançar no inimigo assim que ele surgisse, foi quando Lucano agiu de forma estranha e inesperada.

_ Em nome de Glórien, eu te esconjuro! Afasta-te criatura das trevas! Abandona este corpo que não te pertence! – gritava o clérigo, avançando na direção de seu amigo Legolas, empunhando o símbolo de sua deusa com fé.

_ Maldito!!! Bárbaro maldito! Vou matá-lo, invasor!!! – gritou Legolas, saltando para trás e chocando-se com Glorin. Legolas sacou uma flecha e disparou-a de encontro ao peito de Lucano, ferindo-o com gravidade.

_ Legolas foi possuído! Ataquem-no! – gritou Glorin, espantado com a atitude do arqueiro. O anão, num ato reflexo, desferiu uma violenta machadada nas costas de Legolas, fazendo o sangue do arqueiro jorrar pelo chão. – Droga! Temos que fazê-lo desmaiar, é o único jeito de tirar o fantasma dele! – concluiu o capitão.

Temendo ferir seu amigo, Squall tentou apenas enfeitiçar sua mente para impedi-lo de atacar os próprios companheiros. Entretanto, era a mente do fantasma que dominava agora, resistindo facilmente ao poder mental do feiticeiro.

O inimigo continuou usando o corpo de Legolas para atacar os heróis, deixando Lucano à beira da morte com várias flechas certeiras. Sem poder fazer nada para reagir, o clérigo foi forçado a se refugiar no corredor para se curar com sua mágica e evitar a morte certa.

O fantasma ainda comemorava vantagem obtida, quando Nailo saltou sobre ele. Os dois pés do ranger se chocaram com violência no peito de Legolas, jogando-o no chão. Nailo dobrou rapidamente as pernas, conseguindo cair em pé no chão. Anix tentou usar seus poderes para levitar Legolas, mas falhou. Entretanto, caído, Legolas era um alvo fácil para Glorin. O anão virou seu machado de lado, atacando de forma a não ferir Legolas, e foi desferindo sucessivos golpes na cabeça do arqueiro até deixá-lo desacordado no chão.

O fantasma desincorporou de sua vítima e era possível vê-lo dividindo o mesmo espaço que o arqueiro. Mesmo assim, aquele espírito atormentado ainda era uma ameaça de grande perigo para o grupo. A criatura soltou um grito carregado de ódio. Seus olhos brilharam intensamente e Glorin e Nailo foram arremessados contra as paredes. Squall, que usava sua varinha mágica para ficar invisível, foi obrigado a se abaixar para não ser atingido por seu capitão. O fantasma sorriu sadicamente e flutuou para fora da sala, atravessando a parede e desaparecendo da visão dos heróis.

Nailo pegou suas espadas do chão e começou a procurar pelo inimigo. Anix pensou que era o momento de se proteger, e usou sua mágica para ficar invisível, deixando seus companheiros à mercê do espírito maligno. Glorin andava de um lado para outro, atento a qualquer sinal da aparição. Sem poder ver Anix, o anão se chocou acidentalmente com ele, ficando irritado. Lucano retornou para dentro da biblioteca após curar seus ferimentos e foi ajudar Legolas que jazia no chão inconsciente.

Sem que Lucano soubesse, Squall também tentava ajudar Legolas. O feiticeiro estava parado, agachado ao lado do amigo desmaiado, procurando em suas coisas pela poção mágica que ganhara de Glorin. Enquanto todos se ocupavam com problemas menores, o fantasma passou ligeiro no corredor, indo em direção ao fundo do castelo. O anão passou correndo ao lado do corpo do arqueiro, indo em direção ao corredor com Nailo. Tropeçou em Squall e levou um tombo, ficando ainda mais irritado. Quando Glorin e Nailo chegaram ao corredor, não encontraram mais o espírito. Nailo voltou rápido para a biblioteca, prevendo que o inimigo voltaria para lá através das paredes, e pôs-se a esperá-lo.

Assim como o capitão, Lucano também tropeçou no feiticeiro invisível sem, entretanto, cair. Usou uma magia de cura e trouxe Legolas de volta a si. Assustado com a presença invisível de Squall, Legolas o socou no rosto, pensando que era o fantasma. Squall desfez o mal entendido e entregou ao amigo o frasco com a poção mágica.

Legolas se levantou, ainda meio atordoado, e perguntou o que havia acontecido ao fantasma. Sua pergunta foi rapidamente respondida. Todos viram o espírito sair de dentro da estante, ao lado de Nailo, e tentar possuí-lo. A criatura penetrou no corpo do ranger, da mesma forma que fizera com Legolas, e desapareceu. Nailo começou a se contorcer de forma estranha. Ele estava resistindo. A vontade de Nailo foi mais forte do que a do inimigo, e ele felizmente conseguiu expulsá-lo de dentro de si. O fantasma ficou diante de Nailo, ainda confuso, e o ranger não desperdiçou a oportunidade. Suas espadas se cruzaram velozmente, atravessando a essência da criatura com fúria. Infelizmente, nenhum dos ataques foi capaz de afetar o adversário. As espadas passaram por dentro do fantasma sem feri-lo. O espírito sorriu maliciosamente para Nailo e ameaçou agarrá-lo, mas foi impedido por Glorin. O anão apontou seu punho direito na direção da criatura, disparando seu mortal raio polar contra ele. Gelo e neve atravessaram o fantasma, fazendo-o amaldiçoar Glorin.

De forma semelhante, Lucano lançou um raio luminoso ofuscante contra o inimigo. Entretanto, assim como acontecera com Nailo, o ataque do clérigo transpassou o adversário sem feri-lo.

Legolas teve mais sorte com seu arco, ferindo o inimigo por duas vezes com suas flechas. Todos viram o inimigo amaldiçoar o arqueiro e se enfraquecer após o ataque. Parecia que a vitória estava próxima. Pensando dessa forma, Squall decidiu abrir mão de sua camuflagem e atacar. O feiticeiro se concentrou enquanto proferia palavras mágicas, e de sua mão saiu um jato de chamas, iluminando a biblioteca. Infelizmente, o fogo atingiu as costas de Nailo, que estava entre Squall e o fantasma.

Nailo se torceu, gemendo, enquanto seu cabelo ardia em chamas. O espírito, vendo a dor do oponente, sorriu como se zombasse dele. Seus olhos brilharam mais intensamente e Nailo voou na direção de Squall. O fantasma recuou, penetrando na estante e desaparecendo entre os livros.

Nailo seu chocou nas estantes novamente. Rapidamente, se levantou e correu até perto de onde o espírito desapareceu. Glorin e Lucano correram até o corredor, e viram o inimigo penetrando na parede da biblioteca novamente.

Legolas começou a espreitar entre os livros, com uma flecha apontada na direção deles, pronta para disparar assim que visse o inimigo. Squall, agora visível, decidiu ver o que tinha dentro do baú e o abriu. Para sua surpresa e decepção, a arca estava completamente vazia.

Todos continuaram procurando pelo espírito, enquanto aproveitavam para investigar o ambiente ao redor. Nailo e Squall usavam detecção de magias para tentar localizar um inimigo. Nada. Lucano tentava localizá-lo usando uma versão da magia própria para encontrar mortos-vivos. Nada. Parecia que o fantasma não estava mais naquele mundo. E não estava.

Escondido no plano etéreo, o inimigo observava cada passo dos heróis, esperando a oportunidade certa para atacar. Sem suspeitar de nada, Squall se aproximou do inimigo, atraído por uma aura mágica que emanava de um livro. Era o que sir Eliot esperava. Astutamente, o fantasma guerreiro se manifestou no plano material e tomou posse do corpo de Squall, antes que os heróis pudessem fazer qualquer coisa.

Todos perceberam o plano do inimigo e reagiram rapidamente. Glorin correu, virando seu machado de lado, e desferiu um forte golpe na cabeça do possuído. Em seguida, a lâmina da espada de Lucano passou a poucos centímetros do pescoço de Squall. Legolas aproveitou a chance criada pelo clérigo e disparou suas flechas a queima-roupa, fazendo Squall cair no chão inconsciente. O corpo caiu, ferido, mas o espírito continuava em pé, exposto.

Ao ver a figura de sir Eliot exposta sem a proteção fornecida pelo corpo de Squall, Anix não hesitou e disparou uma rajada de dardos mágicos, encerrando o combate. O fantasma, cambaleante, recuou de encontro à estante, desaparecendo em pleno ar. Em seu lugar, restava apenas uma gosma translúcida e gelatinosa.

Todos respiraram aliviados, ao verem o inimigo se desfazendo e sumindo. Glorin deu a Anix algumas poções mágicas, e o mago prontamente cuidou de trazer seu irmão de volta a si. Squall se levantou, ainda zonzo. Quando soube que tinham conseguido a vitória, foi direto em direção ao livro mágico que detectara. Era um livro fino, de aproximadamente 100 páginas, com capa de madeira embrulhada em couro com a imagem de uma manopla estampado na frente em alto relevo. Suas páginas internas eram todas amareladas e ásperas, e tinham as extremidades rasgadas e deterioradas por água. Por dentro, as páginas exibiam marcas adicionais de deterioração devido a algum tipo de umidade. A tinta dos escritos estava borrada, e todas as páginas eram cheias de ondulações. As inscrições do livro apareciam sob a forma de runas arcanas, de modo que levariam algum tempo para decifrá-las. E uma aura de magias de transmutação emanava do livro. Na sua capa, apenas uma inscrição, o nome do misterioso tomo, o Código de Arnlaug.

Squall olhava curioso para o livro mágico, e notou que ao seu lado estava Nailo, segurando um outro livro em suas mãos, um livro do qual emanava uma tenebrosa aura necromântica. Um livro de capa de couro vermelho sem nenhuma inscrição ou desenho, de aproximadamente 100 páginas. Suas páginas internas, também tingidas de vermelho, tornavam dificílimo de se ler e compreender as runas inscritas em tinta preta sobre ele. Runas arcanas. Ambos os aventureiros tinham em suas mãos grimórios, livros de magia, usados por magos para anotar seus feitiços e rituais.

Legolas também trazia livros em suas mãos, um sobre reis e seus brasões, o outro sobre as religiões e deuses de Arton. Além disso, havia naquela vasta biblioteca muitos outros livros antigos, que talvez pudessem revelar alguma pista para auxiliar os heróis em sua jornada.

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