agosto 31, 2006

Capítulo 225 – Uma carroça à beira da estrada

Capítulo 225 Uma carroça à beira da estrada

Enquanto isso, a quilômetros dali, no castelo, Squall e Glorin aguardavam pelo retorno dos companheiros. Os dois esperavam sentados sob a sombra das árvores, do lado de fora da fortaleza. Glorin observava a lâmina da espada elétrica de Dekyon, e Squall com sua curiosidade aguçada, atormentava o capitão perguntando sobre seu passado, sobre o que ele carregava em sua bolsa, sobre seus segredos. Glorin se esquivava e evitava falar sobre si mesmo. O anão repreendia o feiticeiro, recriminando sua curiosidade. Squall rebatia dizendo que, depois das estranhas declarações de Velta a respeito do anão, Squall não podia confiar totalmente nele enquanto fizesse todos aqueles segredos. Glorin sempre encontrava alguma justificativa para não falar de si mesmo, e quando não encontrava, escapava dizendo que seus assuntos pessoais não eram da conta de ninguém. Vez ou outra, o anão arranjava uma oportunidade para colocar em dúvida a masculinidade do elfo e a utilidade de sua raça. Assim eles passavam o tempo conversando e, apesar de todos os segredos do anão, os dois iam se conhecendo melhor. Então, a conversa foi subitamente interrompida.

_ Ouviu isso, Squall? – disse o anão, levantando-se de sobressalto com a espada em posição de ataque.

_ O que capitão? – perguntou o elfo, a princípio calmo.

_ Parece uma ovelha! Vamos ver! – Glorin correu em disparada, circundando a muralha de pedra.

_ Ovelha! Ah, não! Espera capitão! – murmurou o elfo, desta vez com a voz trêmula.

Os dois correram até os fundos do castelo. Glorin ia mais à frente e Squall bem a trás, assustado. Atrás do castelo havia uma grande clareira gramada, onde uma dezena de ovelhas pastava tranqüilamente. Glorin parou e começou a observá-las. Squall chegou logo em seguida e seu medo aumentou ao ver aqueles animais.

_ Veja, garoto! São os suprimentos do maldito que está criando esses mortos-vivos! Poderíamos acabar com todas elas e deixá-lo sem comida! – falou o anão em tom de brincadeira, tentando acalmar o companheiro.

_ Capitão! Acho que o senhor ainda não entendeu! Isso não é comida não! – respondeu o feiticeiro com hesitação. Glorin não entendia porque o elfo tremia tanto. Mas compreendeu quando uma das ovelhas notou a presença dos aventureiros e começou a caminhar na direção deles. O animal deu alguns passos na direção dos dois e, enquanto caminhava, um de seus olhos despencou da sua face e caiu no chão. O animal continuou andando, como se nada tivesse ocorrido. Era mais um morto-vivo.

_ Mas que droga! Essas ovelhas estão todas mortas! Vamos destruí-las, garoto! – gritou o anão, espantado ao ver a condição dos animais, e correu na direção das ovelhas brandindo sua espada eletrificada.

_ Ai não! De novo não! – suspirou o feiticeiro, soltando sua mochila improvisada no chão e sacando sua espada da bainha.

Glorin correu até o centro da clareira, e num golpe só degolou uma das ovelhas. O animal tombou no chão sem a cabeça, suas patas ainda se mexiam como se tentassem continuar caminhando. Os outros bichos começaram a se deslocar e a cercar o anão.

Squall correu e golpeou o animal que estava mais próximo dele, jogando-o no chão, também sem a cabeça. Outras duas ovelhas flanquearam o feiticeiro e o atacaram. A primeira cravou seus dentes na coxa do elfo e, ao tentar uma nova mordida, parte do maxilar da criatura se desprendeu e ficou presa à perna do conjurador. A segunda ovelha ciscou o chão com sua pata dianteira e investiu contra Squall, dando uma forte cabeçada nele. Squall perdeu o equilíbrio e por pouco não caiu no chão, mas continuou firme e lutando, apesar de estar muito assustado.

Glorin não teve a mesma sorte do feiticeiro. Estava cercado por seis ovelhas, que avançavam sedentas de sangue, enquanto partes de seus corpos apodrecidos despencavam no chão. A primeira veio pela direita, tentando derrubar o anão no chão. Glorin girou o corpo para o lado ao mesmo tempo em que desceu a lâmina da espada sobre o pescoço do animal decapitando-o. A segunda chegou pela esquerda pouco antes da primeira cair morta. Glorin deu um salto curto para trás e desferiu um forte golpe na cabeça da criatura. A Lâmina atravessou o crânio do animal e cortou-lhe o pescoço. A ovelha caiu já sem se mexer mais. O terceiro ataque veio pro trás do anão. Glorin girou o corpo rapidamente e apontou a espada para a cabeça do inimigo, cravando sua lâmina elétrica profundamente no crânio da ovelha. O corpo da criatura pendeu para o lado, já em vida, forçando a espada para baixo. Glorin apoiou o pé na cabeça do animal e puxou a espada, mas não a tempo de se defender do quarto ataque. Vindo pelo lado oposto, uma das ovelhas deu uma forte cabeçada no anão, que tropeçou num dos corpos no chão e caiu. As outras ovelhas aproveitaram a vantagem e conseguiram atacar o anão. Uma delas pisou na mão que portava a espada, impedindo que Glorin pudesse atacar novamente, e mordeu o seu ombro com violência. A outra ovelha cravou seus dentes no pescoço do anão, que esguichou uma grande quantidade de sangue, arrancando gritos de dor do anão. A ovelha que o derrubara, estava agora sobre o peito de Glorin, em cima do escudo que ele usava para se defender. Glorin estava totalmente desprotegido.

Squall, vendo a situação séria em que se encontrava seu capitão, resolveu ajudá-lo, mesmo estando também cercado de inimigos. Concentrou seu poder mágico e disparou seus raios de energia nos monstros que atacavam o capitão. Dois deles caíram mortos. O primeiro, que pisoteava a mão de Glorin, tombou, com parte de seu pescoço destruído pela explosão mágica. O segundo, que estava na esquerda do anão, teve o pescoço atravessado pelo dardo energético, era possível enxergar através do corpo do animal que caiu e não mais e mexeu. Restava apenas uma delas, a que estava sobre Glorin. O míssil mágico explodiu em sua face, destruindo parte do focinho do animal e espalhando pedaços de carne podre sobre o anão. A ovelha caiu sentada no chão com a força do impacto, deixando Glorin livre para atacar. Para ajudar ainda mais, Cloud saltou do ombro de seu mestre num vôo rasante e arrancou um dos olhos da ovelha com suas garras.

O anão pegou sua espada, enquanto o animal tentava mordê-lo na região entre as pernas, girou no chão junto com a arma e passou a lâmina faiscante no pescoço do animal. Glorin rolou mais alguns centímetros no chão antes de finalmente se levantar. A cabeça da ovelha acompanhava o movimento do anão, girando no ar, até cair no chão, onde suas mandíbulas continuavam a se mexer, como se tentassem continuar atacando. Com um pontapé violento, Glorin estraçalhou o que sobrava da cabeça cortada e silenciou pra sempre o animal. Restavam apenas duas ovelhas.

Um dos inimigos atacou Squall, tentando acertá-lo com uma cabeçada. Squall foi mais rápido e o atingiu com a espada primeiro. A lâmina cortou o pescoço da criatura em diagonal e a ovelha foi ao chão, inerte. A outra também tentou acertar o feiticeiro, mas novamente ele conseguiu se esquivar. O contra golpe veio de forma violenta. Com as duas mãos, Squall desceu a espada sobre o crânio da ovelha, partindo-o em dois. O morto-vivo deu ainda alguns passos desgovernados, com as duas metades da cabeça presas ao pescoço e caiu, morto-morto.

_ Obrigado, garoto! Você salvou minha vida! Fico te devendo uma! – disse o anão, rasgando um pedaço de pano e amarrando ao pescoço ensangüentado.

_ Não precisa agradecer, capitão! Só fiz o que era certo! – respondeu o feiticeiro.

Glorin soltou seu escudo e sua espada no chão e cuidou de seu ferimento. Squall arrancou da perna a mandíbula da ovelha que estava fincada em sua carne e recolheu suas coisas do chão.

_ Capitão! Posso dar uma olhada nessa espada? Quero ver se descubro como desativar esses raios ao redor dela!

_ Tudo bem, faça isso, garoto! Assim essas faíscas não denunciarão nossa presença aos inimigos quando voltarmos para o castelo!

Squall passou a observar atentamente a espada. Sua lâmina, cada detalhe de seu cabo e de sua guarda, nada passaria despercebido pelos seus olhos de elfo. Descobriu o que buscava sob a guarda da espada. Era um amontoado de runas cunhadas em baixo relevo com grande esmero. E ele sabia a qual idioma aqueles símbolos pertenciam. Era anão. Além disso, havia uma grande runa, maior que as outras que se destacava. Era uma letra “D”, escrita com o alfabeto comum, toda estilizada e cheia de detalhes rebuscados. Squall já tinha visto aquele símbolo, mas não se lembrava onde.

O feiticeiro devolveu a espada para o anão, contando-lhe sobre a sua descoberta. Glorin virou a espada para baixo e começou a ler as inscrições. Nesse momento, Squall finalmente lembrou onde tinha visto aquele símbolo.

_ Durgedin!!! Essa espada foi feita por ele! Agora me lembro! É o mesmo símbolo que estava na forja dele! – gritou Squall, eufórico.

_ Ahá! Eu sabia! Uma espada tão boa assim só podia ter sido feita por anões! – gargalhou o anão – Bem, vamos testar então! Rere!!! – gritou o anão. A palavra usada, que traduzida para o valkar significava raio, fez com que as faíscas desaparecessem e a lâmina se tornasse comum como qualquer outra. Glorin sorriu e reativou a espada com a mesma palavra para testar. Depois, desativou-a novamente.

_ Grande espada! Gostei disso! Até que vocês elfos não são tão inúteis assim! – riu o anão.

_ Claro que não, capitão! Os elfos... – Squall começava a se gabar, mas foi bruscamente interrompido pelo capitão.

_ Rere! – a espada voltou a faiscar. – Olhe aquilo lá Squall! – o anão parecia assustado. Estava apontando para o norte, para a direção oposta ao castelo.

Na borda da clareira, no local apontado por Glorin, havia uma estrada que rumava para o norte. Era uma estrada larga com espaço suficiente para a passagem de uma carroça ou mais. Algumas árvores, cortadas a machado recentemente, revelavam que se tratava de uma trilha aberta há pouco tempo. Era a estrada usada pelo dono do castelo para chegar até ali. Mas, o que mais espantada, era o que estava ao lado da estrada, na borda da mata. Uma pilha enorme de corpos amontoados, não só de pessoas, mas também de animais e monstros. Havia muitos corpos de orcs, todos com marcas de ferimentos de flechas, espadas e machados. Todos os outros corpos pertenciam a animais e pessoas, humanos, elfos e anões. Nenhum desses outros corpos apresentava marcas de ferimentos. Pareciam ter sido mortos por magia ou algo do gênero. E, entre todos eles, havia o imenso corpo de um troll das florestas.

Os dois heróis se aproximaram cautelosamente dos cadáveres. Squall confirmou que estavam todos realmente mortos e suspirou aliviado. Glorin examinou os corpos, e chegou a uma conclusão:

_ Parece que esses corpos são matéria-prima pras experiências do maluco que mora no castelo! Ou, ou então, esses corpos são as experiências que não deram certo! Seja o que for! Vamos cortar todas as cabeças, Squall! Assim, mesmo que esses cadáveres se levantem para nos atacar, sem suas cabeças e olhos, não poderão nos ameaçar! Vamos lá!

Os dois gastaram cerca de uma hora decapitando os corpos. Ao final do trabalho, tinham uma pilha de cabeças a seus pés.

_ Vamos jogar essas cabeças no meio do mato! Assim será mais difícil de encontrarem-nas! – disse o anão.

Os dois saíram pela estrada, arrastando dezenas de cabeças mortas pelo chão. A estrada fazia uma curva para a esquerda, e depois voltava a seguir para o norte. Logo após a curva, jogaram as cabeças no meio da mata e, quando estavam retornando, Glorin notou algo parado à beira da estrada.

Era uma carroça, um carroção de madeira, coberto por um toldo de tecido branco. A traseira era fechada por uma lona também branca, assim como a parte da frente. Estava parada, sem cavalos, na beira da estrada, sob as árvores, como se tivesse sido estacionada ali. Como se estivesse à espera de seu dono, que deveria ser o mesmo que morava no castelo. No chão havia marcas da carroça, que seguiam para o norte e para o castelo.

Os dois se aproximaram lentamente. Glorin foi pelo fundo, enquanto Squall foi pela parte dianteira da carroça. Squall tinha a estranha impressão de já ter visto uma carroça daquele jeito, mas não sabia onde nem quando. Olharam dentro da carroça. Ela exalava um cheiro de carniça indescritível. Lá dentro havia um monte de moscas que voavam frenéticas. No piso da carroça, havia poças de sangue seco e pedaços de pele e carne apodrecida. Aquele carroção era utilizado para trazer os mortos para o castelo, para que fossem transformados em mortos-vivos. Numa das poças de sangue havia uma pegada impressa. Era uma marca de um pé pequeno como o de uma criança que estava gravada sobre o sangue ressecado.

Os dois ficaram intrigados com tudo aquilo. De fato alguém tentava criar uma enorme legião de mortos-vivos e estava reunindo matéria-prima para isso com uma ou talvez mais carroças. E, ao que parece, até crianças estavam envolvidas naquele plano bizarro. Seria a pobre Tábata, já transformada em zumbi pelo sombrio mestre de Dekyon? Isso, só o tempo lhes diria. Cheios de perguntas em suas mentes, os dois heróis retornaram para a entrada da fortaleza, para esperar pelo retorno dos companheiros. Enquanto caminhavam, Squall mais uma vez interrogava seu líder.

_ Capitão, o senhor tem algum animal como eu?

_ Não! Não sou chegado a animais! Prefiro que fiquem no zoológico!

_ E um grupo? O senhor deve ter um grupo com pessoas tão forte como o senhor, certo?

_ Af....! Lá vem você de novo com suas perguntas! Sim, eu tenho um grupo sim!

_ E como eles são? Quantos são? Quais seus nomes? Que habilidades eles possuem? Tem algum feiticeiro no grupo? Algum deles é elfo?

_ Ora, Squall! Não me amole! Quando chegarmos ao Forte Rodick você irá conhecer cada um deles! Agora pare com tantas perguntas idiotas e vamos comer alguma coisa! O sol já está a pino!

_ Diga pelo menos o nome de um deles capitão! Por favor!

_ Tá bom, desde que você fique quieto depois! Kuran! Kuran Namino, o plantador de florzinha! Ele é um tipo de druida! Agora cale-se de uma vez por todas e trate de comer!

Assim, os dois se sentaram à sombra de uma bela árvore, pegaram suas rações de viagem e puseram-se a comer. E Squall finalmente se calou. Ao menos por algum tempo.

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